quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Aprendendo com as situações do modo difícil!

Quando consegui escrever estas primeiras palavras, o relógio marcava 23h51 do dia 17 de novembro de 2010, pois eu estava imóvel diante do computador desde as 22h20, assolado por um sentimento que me dominou desde a leitura, pela manhã, da notícia sobre as mortes dos Agentes M.L. e L.M., e o estado de saúde crítico do Agente C.

L.M. frequentou o curso de formação policial no primeiro semestre deste ano, mas sua fisionomia me escapa da memória. Porém, o que não esqueço é que fui um dos seus professores, sendo inevitável uma análise íntima sobre o que se poderia fazer para melhorar o treinamento policial para dificultar tragédias como a de hoje.

Então, me recordei de um texto não publicado que eu havia escrito em 2008, por ocasião do quinto aniversário da morte de outro policial, K.H.

Inicialmente, peço desculpa aos colegas se o que escrevo agora parece inoportuno diante de tamanha tristeza que toma conta de nossos corações, mas já perdemos os policiais E.M.M., L.M.F., R.S.M., J.H.F., S.A.Z., R.C.R., A.J.S., G.A.M., Os.V., L.C.D., dentre outros. Todos mortos em situações que poderiam ter sido analisadas para promover o aprimoramento da capacidade de autodefesa dos demais policiais.

Estou certo de que o artigo é tão atual agora, quanto será em 17 de novembro de 2015, aniversário de cinco anos da morte de M.L. e L.M.

APF Humberto Wendling


Aprendendo com as situações do modo difícil!

Em 25 de setembro de 2003, o bando do criminoso Cleiton Araquan assaltou uma agência bancária na cidade de Pilão Arcado/BA.

Durante o confronto com a polícia, Cleiton e Valter Araquan (seu primo e braço direito) foram mortos.

No entanto, isso custou a vida do Policial Federal K.H., então com 27 anos de idade, atingido por um tiro de fuzil enquanto operava a metralhadora do helicóptero usado na operação policial. No tiroteio também foram feridos os Policiais Federais H., T. e A.

Logo depois, se seguiu outra operação policial para localizar e prender o restante da quadrilha. Então, mais um assaltante foi morto e outros cinco foram feridos, segundo informações extra-oficiais.

Um Policial Federal morreu e três foram feridos, e isso é TUDO que sei sobre o episódio após pesquisar na Internet.

Entretanto, em 11 de abril de 1986, oito policiais do FBI vivenciaram algo semelhante. A diferença é que eu sei mais sobre o episódio ocorrido em outro país 24 anos atrás do que sobre o evento que aconteceu há sete anos na minha própria nação.

O TIROTEIO DE MIAMI, como ficou conhecido, foi um confronto entre esses oito agentes e dois criminosos (bem armados e treinados) que ocorreu em Miami, no Estado da Flórida. No confronto foram mortos os agentes Gerald Dove (30 anos) e Benjamin P. Grogan (53), bem como os dois criminosos, Willian Russel Matix (34) e Michael Lee Platt (32). Além disso, outros cinco policiais foram feridos gravemente durante o combate.

O incidente ficou negativamente marcado na história do FBI, e por isso foi bem estudado ao longo dos anos, mudando de vez a concepção do uso de armas curtas por todas as polícias americanas.

Apesar de os policiais superarem os criminosos na escala de quatro para um, os agentes foram recebidos por tiros de fuzil e espingarda, e não foram capazes de reagir efetivamente. Embora também atingidos diversas vezes durante o tiroteio, os criminosos continuaram a ferir e matar os policiais.

Há mais de seis meses os agentes investigavam uma série de roubos a bancos (Isso lhe parece familiar?). Os assaltos ocorriam somente numa sexta-feira de cada mês, e os suspeitos usavam um veículo Chevrolet Monte Carlo.

Pouco antes da sexta-feira do dia 11 de abril, uma mulher notificou a polícia sobre o desaparecimento do irmão, informando que o mesmo possuía um Chevrolet Monte Carlo. Ao encontrarem o corpo do proprietário do veículo com múltiplos ferimentos provocados por arma de fogo, os agentes vincularam o homicídio com as ações dos dois criminosos, acreditando que eles utilizariam o carro da vítima no próximo roubo.

O escritório do FBI em Miami acreditava que os criminosos possuíam um padrão de comportamento: utilizavam o mesmo tipo de carro, eram extremamente violentos e assaltavam as agências bancárias sempre às sextas-feiras. Contudo, as identidades dos suspeitos ainda eram desconhecidas.

Os dois criminosos, Willian Matix e Michael Platt, se conheceram enquanto serviam o Exército Americano. O primeiro foi cozinheiro do Corpo de Fuzileiros Navais e da Polícia do Exército da 101ª Divisão Paraquedista. Já o segundo serviu como paraquedista das forças especiais do exército e como policial militar da mesma 101ª Divisão Paraquedista. Os dois se casaram com mulheres que morreram sob circunstâncias até hoje não esclarecidas. Eles também administravam uma pequena empresa de jardinagem que era usada como fachada para a lavagem do dinheiro roubado.

No dia 11 de abril de 1986, equipes totalizando quatorze agentes do FBI conduziram buscas pelas ruas dos bairros nos quais os criminosos costumavam agir na tentativa de localizá-los NUM GOLPE DE SORTE, uma vez que se tratava de uma sexta-feira e já fazia quase um mês do último roubo.

Às 9h os agentes Grogan e Dove localizaram o Monte Carlo e comunicaram o fato ao chefe da equipe, que por sua vez, determinou que os demais agentes se juntassem à perseguição. Assim, os agentes Manauzzi, Mireles e Hanlon se juntaram à perseguição seguindo Grogan e Dove. Contudo, os suspeitos perceberam o que estava acontecendo e contornaram um quarteirão, confirmando a suspeita de que estavam sendo seguidos pela polícia. Nesse instante, o agente McNeil (chefe da equipe) cruzou com o carro dos criminosos e percebeu que Michael Platt preparava uma carabina Ruger Mini-14 calibre .223 Remington. Dove e Grogan solicitaram autorização ao agente McNeil para realizar a abordagem. Então, McNeil considerou a superioridade numérica, o reforço a caminho, e que tanto Dove e Grogan eram certificados pela SWAT, sendo que Grogan era considerado o melhor atirador do FBI em Miami.

Porém, esse reforço (no total de seis agentes) não conseguiu chegar ao local a tempo porque os policiais não conseguiram compreender o endereço transmitido, via rádio, pela equipe que estava na perseguição.

Com a autorização para a abordagem, Dove e Grogan tentaram bater a viatura no eixo traseiro do carro dos criminosos para que ele derrapasse (Manobra PIT ou Pursuit Intervention Technique). Mas a manobra falhou, e na colisão com o carro dos bandidos, Grogan perdeu seus óculos de grau. Imediatamente, Manauzzi fez a segunda tentativa e conseguiu acertar o carro dos criminosos que saiu da pista e colidiu numa árvore no estacionamento de uma empresa. Nessa batida, a arma de Manauzzi (que estava no assento) caiu no vão da porta direita. Após a batida, a viatura de Manauzzi ficou lado a lado com o Monte Carlo, e antes que ele pudesse recuperar sua arma teve que deixar a viatura rapidamente porque foi atingido pelos disparos de Michael Platt (passageiro - que ainda estava dentro do carro com sua carabina .223).

Dove e Grogan (que mal podia enxergar) pararam atrás do veículo dos criminosos e saíram da viatura. Enquanto Platt atirava no agente Manauzzi, Matix (motorista - também ainda dentro do carro, mas com o corpo parcialmente para fora) fez um disparo com uma espingarda calibre 12 contra Dove e Grogan. O agente McNeil parou sua viatura e se aproximou do carro de Manauzzi, e utilizando o bloco do motor como barricada, disparou seis vezes na direção de Matix, o atingindo duas vezes. Grogan também acertou um tiro em Matix. Ferido três vezes (na cabeça, no pescoço e no antebraço direito), Matix se debruçou sobre o volante e perdeu a consciência até quase o final do tiroteio.

Enquanto McNeil atirava em Matix, os agentes Mireles e Hanlon deixavam a viatura e iam em direção aos colegas, porém Hanlon havia perdido sua primeira arma porque o carro em que estava havia batido contra um muro de concreto do outro lado da rua. Hanlon, então, utilizou seu revólver reserva para auxiliar Dove e Grogan que ainda disparavam contra Matix e Platt. Mireles correu em direção ao agente McNeil, mas foi logo atingido no antebraço esquerdo por um projétil .223.

Assim que McNeil realizou seus disparos contra Matix, foi atingido gravemente na mão direita por um disparo efetuado por Platt. Com o revólver vazio, McNeil virou-se para sua viatura, recarregou sua arma com mais dois cartuchos quando viu uma espingarda calibre 12 no assento de trás. Mas ao tentar alcançá-la foi atingindo no pescoço por outro projétil .223. Dessa vez, McNeil tombou e ficou paralisado durante o restante do tiroteio. O agente McNeil não conseguiu carregar completamente seu revólver porque um grande volume de sangue escorreu para dentro das câmaras do tambor, tornando a recarga impossível.

Até esse momento, Michael Platt ainda estava dentro do carro, mas já havia incapacitado os agentes Manauzzi, Mireles e McNeil enquanto atirava pela janela do motorista por cima do corpo do comparsa.

Como Platt não conseguiu abrir a porta do carro, ele saiu pela janela do lado direito. Nesse instante, ele foi atingido por quatro projéteis 9 mm. Um deles atingiu as costas de Platt e foi disparado pelo agente Risner que juntamente com Orrantia atiravam a cerca de 30 m de distância a partir de uma posição barricada do outro lado da rua. Os outros três tiros (no braço direito, na coxa direita e no pé esquerdo) foram realizados por Dove. O tiro de Dove que acertou o braço direito de Platt atravessou o pulmão e parou a dois centímetros do coração.

O legista, que após o confronto examinou o corpo de Michael Platt, determinou que o projétil que atingiu o pulmão foi o ferimento fatal que conduziria a morte do criminoso, mesmo se ele recebesse os primeiros socorros. No entanto, esse ferimento não foi capaz de eliminar imediatamente a ameaça representada por Platt que continuou atirando enquanto caminhava na direção de Dove, Hanlon e Grogan que estavam protegidos pelo porta-malas da viatura. Platt foi atingido mais duas vezes por Orrantia e/ou Risner durante esse trajeto. Então, Platt virou-se para Risner e Orrantia atingindo este último com fragmentos de projéteis .223. Durante o tiroteio, Risner disparou 13 ou 14 tiros e Orrantia cerca de 12.

O agente Hanlon disparou todos os cinco tiros, mas quando tentava recarregar seu revólver, viu Platt apontar a carabina para sua cabeça. Misteriosamente, Platt mudou de ideia e atirou contra a mão direita de Hanlon que se jogou debaixo do para-choque traseiro da viatura na tentativa de se proteger, mesmo assim, ainda sendo atingindo na virilha. Quando se preparava para receber o terceiro tiro, Hanlon ouviu Grogan gritar “Ai, meu Deus!”. Platt então disparou um tiro contra o tórax de Grogan, que morreu no local, e quando se preparava para atirar novamente em Hanlon percebeu a presença de Dove no lado do motorista da viatura. E assim, disparou duas vezes contra a cabeça de Dove. Até aqui, Grogan havia disparado nove tiros e Dove 20 tiros, que antes de ser morto tentava recarregar ou sanar uma pane na sua pistola.

Depois de matar os dois agentes, Platt ainda disparou diversas vezes contra Orrantia e Risner. Mas ao abrir a porta da viatura dos policiais mortos, o criminoso foi atingido por disparos realizados por Mireles que usava uma espingarda calibre 12 com apenas um dos braços, já que seu lado esquerdo estava paralisado em função do ferimento ocorrido no início do confronto.

Em algum momento durante o tiroteio, Matix recobrou a consciência e juntou-se ao comparsa dentro da viatura de Dove e Grogan. Enquanto isso, Mireles disparava seu quinto e último tiro com a espingarda.

Dentro da viatura, Platt e Matix tentavam dar partida na ignição ao passo que Mireles se levantava apoiado na espingarda, sacava seu revólver, e caminhando com dificuldade, se aproximou dos dois criminosos. À queima-roupa, ele disparou seis vezes atingindo dois tiros em Platt (um na cabeça e outro no peito, totalizando 12 ferimentos) e três tiros em Matix (todos no rosto, somando seis ferimentos).

O tiroteio envolveu 10 pessoas: dois criminosos e oito agentes do FBI. De todos, somente um policial saiu ileso do confronto. Ao todo, os agentes realizaram aproximadamente 78 disparos e os criminosos 49 (Matix um e Platt 48).

Exames toxicológicos demonstraram que a capacidade de sobreviver aos múltiplos ferimentos causados por armas de fogo não havia sido alcança por meio do consumo de drogas ou bebidas alcoólicas.

O episódio que durou aproximadamente quatro minutos foi DETALHADAMENTE INVESTIGADO COM A ELABORAÇÃO DE UM RELATÓRIO DE 656 PÁGINAS (disponível no site do FBI). Em setembro de 1987, esse incidente foi encaminhado ao Conselho Consultivo sobre Armas do FBI que conduziu uma avaliação das pistolas utilizadas pelo órgão. Como a tarefa era abrangente e complexa, o FBI CONVIDOU ESPECIALISTAS RENOMADOS para participarem do Seminário sobre Ferimentos Balísticos, realizado na Academia do FBI.

Após o seminário, o FBI MUDOU AS ARMAS, AS MUNIÇÕES, OS CALIBRES, OS PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS E O TREINAMENTO DE TIRO NA ACADEMIA. O local do confronto recebeu uma placa em homenagem aos policiais mortos e as ruas receberam os nomes destes agentes, sendo que o evento é lembrado até hoje. Ou seja, os poucos minutos daquela manhã de sexta-feira tiveram um forte impacto no que o FBI é hoje.

Sem dúvida, a lição aprendida naquele dia tem salvo as vidas de muitos policiais; lição que transformou o treinamento e as táticas policiais (por exemplo, os policiais são orientados a atirar até que o agressor caia, pois é o único sinal aparente de que houve a incapacitação. E não importa quantos tiros sejam necessários para que isso ocorra, pois a segurança dos policiais está em primeiro lugar).

Logo após o tiroteio, os agentes do FBI receberam pistolas que substituíram os antigos revólveres que muitos ainda utilizavam na época (em nome de uma economia de verbas obtusa, os policiais eram obrigados a portar revólveres .357 Magnum, mas com munição .38 SPL). O treinamento de tiro na academia foi melhorado incorporando cenários mais realistas, além da inclusão do estudo a respeito dos efeitos mentais e fisiológicos do estresse durante confrontos armados. O confronto já foi tema de um filme (In the Line of Duty: The FBI Murders 1988) e de um documentário patrocinado pelo Discovery Channel (Os arquivos do FBI). Tudo isso se deve ao exaustivo estudo de caso conduzido pela polícia federal americana, até como forma de HONRAR OS POLICIAIS MORTOS E FERIDOS.

E aqui eu reservo minhas esperanças para tomar conhecimento de um estudo de caso sobre o Tiroteio de Pilão Arcado. Mas agora eu também preciso esperar o estudo sobre o Tiroteio de Codajás.

Infelizmente, quanto mais o tempo passa, mais as informações sobre confrontos envolvendo policiais brasileiros se perdem, e com elas a possibilidade de se aprender com as situações que ceifaram as vidas daqueles homens que deram suas últimas medidas de devoção ao trabalho policial.

sábado, 23 de outubro de 2010

Fazendo a coisa certa na hora certa!

Na manhã do dia 06/08 recebi uma chamada telefônica de um colega. Foi assim:

- Você soube o que aconteceu com o João?
- Não! O quê?
- Ele reagiu a um assalto e matou o cara!
- Agora?
- Não! Foi nesta madrugada!
- E ele tá bem?
- Tá tudo bem!

No mesmo dia o jornal local publicou a matéria intitulada “Ladrão é morto após tentar roubar delegado da PF”. O artigo informou o seguinte:

“Ao tentar roubar à mão armada um carro na madrugada de hoje (6), no bairro Fundinho, na região central de Uberlândia, o assaltante foi surpreendido de maneira letal. A vítima era um delegado da Polícia Federal de Uberlândia. O autor do assalto W.D.N., 36 anos, acabou morto a tiros. Ele sacou a arma contra o delegado, que atirou antes para se defender.

O delegado havia acabado de estacionar na rua e caminhava pela calçada quando foi abordado pelo assaltante. W.D.N. empunhava uma pistola calibre 380 prateada. Ele determinou que a vítima voltasse para o carro e entregasse as chaves e a carteira.

O delegado disse que pediu ao homem que se acalmasse e que entregaria tudo o que ele quisesse. A única carteira que possuía, no entanto, era a funcional, onde estava todo o dinheiro e demais documentos. Ele sacou a arma e identificou-se. Segundo o depoimento do delegado, antes que o autor atirasse, ele disparou para intimidar e dominar o assaltante.

Moradores do prédio em frente ao local do crime disseram para os policiais militares que o delegado tentou tranquilizar o autor, que demonstrava nervosismo. Mesmo depois de ser atingido, o assaltante tentou alcançar a arma no chão.

O delegado mandou que ele permanecesse imóvel e chutou a arma para fora do alcance de W.D.N. A vítima foi socorrida e levada ao Pronto-Socorro do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, mas não resistiu aos ferimentos.” (JORNAL CORREIO DE UBERLÂNDIA, 2010).

Após o confronto, uma breve investigação indicou que no dia 05/08 o criminoso W.D.N., também conhecido como Will Pitbull, e três comparsas haviam deixado a cidade de Uberaba/MG rumo a Uberlândia/MG. Quando chegaram ao destino, eles decidiram roubar um carro e cometer outros crimes. Como era necessário aterrorizar a pretensa vítima (e quem sabe matá-la), eles portavam, dentre outras armas, uma pistola .380 totalmente carregada com 17 cartuchos expansivos (EXPO). A arma estava pronta, ou seja, com “bala na agulha”.

Poucas horas antes do confronto, o policial (que em breve seria a vítima da quadrilha) havia combinado uma reunião com amigos num conhecido restaurante da cidade. Como era responsável por sua própria segurança, ele portava uma pistola calibre 9 mm pronta para o uso e totalmente carregada com munição expansiva. Mas não se engane com as diferenças entre calibres e munições, porque uma arma, por si só, não é capaz de vencer uma luta. E como a diferença entre viver e morrer é medida em segundos, você precisa saber que os vencedores nos combates armados são aqueles mais preparados para reagir.

Assim, o policial estacionou e desceu do seu carro. Enquanto falava ao celular, ainda próximo à porta do veículo, ele percebeu um homem se aproximando a pé pelo meio da rua. O policial continuou observando o homem, que passou por ele e seguiu adiante. Era óbvio que algo não estava certo, mas o colega não sabia o que exatamente estava errado. Então, ele deu a volta por trás do carro e quando estava perto do porta-malas viu aquele mesmo homem retornar em sua direção. No instante em que o homem se aproximou, ele sacou aquela pistola .380 e disse: “É um assalto! Entra no carro que eu tô armado!” O assaltante, que costumava assassinar suas vítimas em casos semelhantes, ordenou que o policial entrasse no carro e ficasse no banco do passageiro. Tão logo o criminoso anunciou o roubo, ele se aproximou da porta do motorista. O policial pediu calma, deu uns passos para trás (como se fosse atender à exigência do criminoso), e quando o assaltante vacilou, ele sacou a arma, se identificou e acertou logo os três disparos iniciais.

O primeiro projétil atingiu a clavícula direita do bandido e se fragmentou, provocando um grande orifício de entrada, porém com pouca penetração. Surpreso e assustado, o assaltante se virou (no sentido horário) e ficou completamente de frente para o policial, quando recebeu o segundo tiro que perfurou o tórax na altura do mamilo esquerdo. Contudo, estes disparos não foram suficientes para causar a incapacitação imediata do agressor. O policial, que usava o carro como barricada, percebeu que o criminoso se AFASTAVA (1) ainda resistindo à ordem para se entregar. Então, o colega deixou a barricada e REENQUADROU (2) o assaltante em sua linha de visada. O bandido continuou seu giro de arma em punho quando foi atingido pelo terceiro projétil na face lateral esquerda da caixa torácica (onde se localizam as costelas falsas). Mesmo atingido por três tiros, o assaltante saiu do alcance do policial (que errou os quatro disparos seguintes) e conseguiu correr alguns metros antes de se DEITAR (3) no chão. Ele não caiu, mas se deitou dizendo: “Já deu! Já deu! Já deu!” Deitado de costas, o assaltante ainda tateava o chão à procura da arma que havia caído, quando o policial se aproximou, chutou a arma e acionou o serviço de atendimento de urgência. Imaginando a presença de outros criminosos, o policial recuou até o muro de uma casa podendo observar toda a área. Ao ouvirem e perceberem a quantidade de tiros, os comparsas fugiram, a vizinhança surgiu nas janelas e a polícia (que rondava as imediações) chegou.

Então, volto a dizer que uma arma, por si só, não é capaz de vencer uma luta; que a diferença entre viver e morrer é medida em segundos; que os vencedores nos combates armados são aqueles mais preparados para reagir.

Neste incidente, o colega foi escolhido como vítima porque se comportou como uma vítima potencial ao permanecer próximo ao carro conversando pelo telefone durante a noite. E estar armado numa situação assim não significa garantia de segurança. Além disso, o que poucas pessoas percebem é que carros e motocicletas são verdadeiras armadilhas. Se você está dentro ou próximo do seu carro, certamente você está em perigo. Então, a solução é observar o lugar antes de parar, estacionar o carro e sair logo do local desconfiando da aproximação de qualquer pessoa.

Outro aspecto importante neste episódio é que por mais que os policiais realizem acompanhamentos de criminosos, vigilâncias ou perseguições, eles jamais consideram a possibilidade de estarem eles mesmos sendo seguidos ou vigiados. E foi exatamente o que ocorreu com o policial, quer dizer, as investigações demonstraram que ele foi seguido antes de ser abordado pelo criminoso.

Felizmente, o policial foi capaz de alterar rapidamente seu estado mental e comportamental de vítima indefesa para uma situação de sobrevivência. Foi quando a presa virou predador, quando a caça virou caçador! A partir daí, ele enganou o bandido e se afastou dele; usou a traseira do carro como barricada; sacou rápido; enquadrou o alvo; se identificou; atirou aproveitando 43% dos disparos (a média de aproveitamento nos tiroteios é de 17%); só deixou a barricada para reenquadrar o alvo; só parou de atirar quando o alvo desistiu, ao invés de utilizar técnicas antiquadas como o Double Tap (que ensina o policial a atirar duas vezes e ESPERAR para ver se algo acontece enquanto ele recebe uma chuva de balas do criminoso); afastou a arma do bandido; pediu auxílio médico e se protegeu contra outras possíveis ameaças.

Além disso, este sobrevivente foi mais um que finalmente percebeu a importância de um carregador adicional, desmistificando a lenda de que “se você não resolver uma situação com cinco tiros, não vai resolver com quinze!” Ele também aprendeu que a carteira de polícia não foi feita para guardar dinheiro, CNH, RG, CPF e outros badulaques.

No mais, fico feliz que o colega tenha feito a coisa certa na hora certa! E meu desejo é que ele tenha vida longa e próspera!

Clique na imagem e acesse a ilustração do caso.
(1) “A distância é um fator importante porque se o atirador não apontar a arma direito, mesmo que ele queira atirar no alvo, existe uma boa chance dele errar. Desse modo, quanto mais LONGE do atirador, maior a margem de erro. Assim, o problema aqui não é o tamanho da arma ou do calibre, mas o tamanho do alvo que você representa para o atirador.” (Humberto Wendling, artigo “O que eu faço quando alguém está atirando?”, 2010).

(1) “Na atividade policial ou no crime, a regra diz que para se fazer uma abordagem é preciso se aproximar do alvo. Mas quando a circunstância não é favorável e a pessoa não está mais realizando uma abordagem, e sim lutando pela própria vida, a reação natural é se AFASTAR do perigo.” (Humberto Wendling, monografia “A interferência do medo e do estresse nas habilidades policiais treinadas para o enfrentamento de situações com confronto armado”, 2007).

(1) “Então, a primeira questão é se o atirador está disparando especificamente em você ou se ele está atirando em outra pessoa e os projéteis estão indo noutra direção. Estes dois cenários são relevantes para a escolha da melhor estratégia de reação. De qualquer modo, os objetivos devem ser: SAIR DA LINHA DE TIRO; SAIR DA VISÃO DO ATIRADOR e SAIR DA ÁREA. (Humberto Wendling, artigo “O que eu faço quando alguém está atirando?”, 2010).

(2) “A terceira consideração é se o atirador está realmente querendo acertar você. Se ele está decidido em fazer isso, então ele vai rastrear você até colocá-lo dentro da fatia do bolo (REENQUADRAMENTO) e se aproximar o máximo para acertar o maior número de tiros.” (Humberto Wendling, artigo “O que eu faço quando alguém está atirando?”, 2010).

(3) “A menos que o sistema nervoso central seja atingido, não há qualquer motivo para um indivíduo ser incapacitado, mesmo por um ferimento fatal, até que a hemorragia seja suficiente para diminuir a pressão sanguínea e/ou o cérebro ser privado de oxigênio. Os efeitos da dor, que poderiam contribuir enormemente para a incapacitação, são normalmente atrasados como resultado de uma séria lesão, tal como um ferimento balístico. Quando o ser humano se depara com uma ameaça, seu corpo desenvolve o Reflexo de Luta ou Fuga. Como a dor é irrelevante para a sobrevivência, ela é normalmente suprimida por algum tempo. Portanto, para ser um fator decisivo na incapacitação, primeiro a dor deve ser percebida, e então deve causar um efeito emocional.” (FBI Academy Firearms Training Unit, artigo “Handgun wounding factors and effectiveness”, 1989).

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O silêncio vale ouro!

Em 02 de setembro de 2010, um jornal eletrônico publicou o artigo denominado “Polícias brasileiras usam diariamente munição proibida em guerras”. O subtítulo do mesmo artigo dizia que “Projéteis do tipo ‘ponta oca’ foram banidos em conflitos internacionais por serem considerados altamente letais e desumanos.”

Para fins didáticos, este texto contém os trechos mais importantes do artigo mencionado seguidos por alguns comentários numerados. Então, vamos lá!

“Policiais civis e militares brasileiros e agentes federais usam indiscriminadamente munições de ponta oca, cujo uso é proibido entre nações, pela Convenção de Haia de 1899. A norma regulamenta armas e munições que podem ser usadas por militares em conflitos armados, levando em conta o viés humanitário.” (Último Segundo, 2010).

Comentário nº 1: As polícias brasileiras não usam indiscriminadamente munições de ponta oca, pois se a legislação não proíbe tal munição, seu uso não pode ser considerado indiscriminado. Além disso, toda munição produzida pela única empresa existente no Brasil e vendida para as forças policiais é controlada pelo Exército Brasileiro. E cada cartucho possui um código serial marcado no estojo que viabiliza a localização da unidade policial que adquiriu aquele cartucho.

Comentário nº 2: A Convenção de Haia de 1899 também não proibiu o uso de munição expansiva, já que sua Declaração nº 3, de 29 de julho de 1899, que trata do uso de projéteis expansivos, informa que os países signatários concordam em se abster do uso de projéteis que expandem ou achatam facilmente no corpo humano, tais como os projéteis com camisas que não cobrem inteiramente seus núcleos ou cravados com incisões. A declaração informa, ainda, que o acordo só é válido para os países signatários em casos de guerra, mas pode cessar caso um deles se junte a outro país que não participa do acordo. Portanto, a abstenção ou recusa voluntária em usar munições expansivas pode ser interrompida mesmo nos conflitos bélicos.

“As munições de ponta oca, ‘hollow point’, são ‘projéteis de expansão’. O artefato expande o tecido atingido, fazendo um buraco ao atingir o corpo humano, causando maior impacto e neutralizando o alvo com maior eficiência. Essa munição diminui muito a chance de ricochetear ou atravessar um alvo e atingir outra pessoa. Junto com outros projéteis de expansão ainda mais letais, a ponta oca usada no Brasil integra um grupo de munições popularmente conhecidas como ‘dum dum’.( Último Segundo, 2010).

Comentário nº 3:
A expansão do tecido humano quando atingido por um projétil não é uma característica peculiar provocada pela munição ponta oca. Na verdade, qualquer objeto (faca, flecha, lança, dardo, agulha, prego, etc.) que pretenda perfurar um alvo precisa expandir o tecido humano até seu limite de ruptura. Este princípio se aplica tanto aos projéteis expansivos quanto aos ogivais. É óbvio, também, que todo objeto que pretenda perfurar o corpo humano deva “fazer um buraco”, caso contrário, não haverá uma perfuração. E perfurar o corpo humano sempre foi o objetivo principal de todas as armas ofensivas desenvolvidas pelo homem desde tempos remotos. Assim, o nome “expansivo” não se deve ao fato deste tipo de projétil expandir o tecido humano, pois qualquer objeto possui esta capacidade, mas porque é o próprio projétil que se expande ao entrar em contato com as partes líquidas do corpo. Além do mais qualquer projétil irá deformar no impacto com uma superfície suficientemente dura, como um osso, por exemplo.

Comentário nº 4: A neutralização ou incapacitação imediata do agressor não ocorre em função do impacto, mas em virtude do projétil ponta oca, já expandido, produzir um canal de ferida permanente mais largo que o produzido pelo projétil ogival. Assim, quanto mais largo e profundo for o ferimento, maior a chance de incapacitação em virtude da intensa e rápida hemorragia capaz de induzir à inconsciência do agressor. O objetivo não é matar, mas incapacitar imediatamente aquele indivíduo que representa uma ameaça real e imediata à vida do policial. Se a munição empregada pela força policial não for capaz de produzir este resultado, então o policial será exposto ao perigo de morte, adicionalmente à sua já perigosa função, simplesmente porque a munição empregada não cumpre com eficácia seu objetivo. A questão aqui é tão somente o diâmetro do ferimento. Esse diâmetro também pode ser ampliado se for aumentado o calibre do projétil. Por exemplo, as polícias brasileiras poderiam substituir as munições 9 x 19 mm e .40 S&W expansivas pela munição .45 ACP não expansiva. É como diz um amigo policial civil e atirador prático: “Enquanto se discute se a munição usada pelas polícias expande ou não, é certo que o .45, naturalmente mais larga, não encolhe!” Contudo, como a média de aproveitamento dos disparos (acertos no alvo) é de 17%, segundo estatíticas americanas, o policial precisa levar consigo o maior número de cartuchos possíveis para aumentar a chance de acerto antes que ele fique sem munição, o que é inviável para armas no calibre .45 ACP. Por isto as forças armadas de todo o mundo e a Polícia Federal brasileira ainda utilizam o calibre 9 x 19 mm.

Comentário nº 5: Todo projétil de arma de fogo é letal por natureza, e até mesmo as tecnologias menos letais, como os projéteis de borracha, podem matar sob certas circunstâncias. Por exemplo, é bem provável que um projétil de qualquer calibre, que atinja o cérebro provoque a morte. Mas isso não quer dizer que o policial deva utilizar qualquer calibre ou mesmo treinar para acertar a cabeça do agressor, pois é difícil que ele consiga mirar cuidadosamente na cabeça durante o estresse de um tiroteio. É por isso que o treinamento conduz o policial a disparar contra o centro de massa, ou seja, a parte central do corpo humano, independentemente do calibre ou do tipo de projétil.

Comentário nº 6: Dum Dum é uma cidade indiana que durante o século 19 abrigou a Real Artilharia Britânica quando a Índia ainda era uma colônia inglesa. Nessa base militar, o oficial Neville Sneyd Bertie-Clay iniciou os trabalhos para o desenvolvimento das primeiras munições expansivas do tipo Soft Point (quando a camisa cobre parte do projétil, contudo deixando a ponta de chumbo exposta para que deforme e adquira a forma de um cogumelo durante a penetração no corpo humano). O desenvolvimento desse tipo de munição ocorreu porque os cartuchos ingleses da época eram incapazes de incapacitar imediatamente os revoltosos indianos, principalmente a curtas distâncias. Portanto, Dum Dum não é um tipo de munição, mas o local onde um tipo de projétil expansivo foi desenvolvido.

“De acordo com o diretor do IML (Instituto Médico Legal) do Estado do Rio de Janeiro, Xxxxx Xxxxxxx, ‘a característica de um ferimento de bala oca [internamente] é semelhante à forma de um cogumelo, pois a munição retém todo o poder de energia do projétil dentro do corpo e dobra o seu poder de destruição, sendo mais letal que a munição em forma de ogiva, totalmente fechada’.” (Último Segundo, 2010).

Comentário nº 7: O estudo do FBI “Handgun Wounding Factors and Effectiveness” informa que frequentemente os médicos legistas não podem distinguir um ferimento causado por um projétil expansivo daquele provocado por um ogival, pois não há diferença física nas lesões. Um ferimento de “bala oca” não é semelhante à forma de um cogumelo, porque é o projétil que pode assumir essa configuração, não a lesão.

Comentário nº 8: Nenhuma munição, seja expansiva ou ogival, retém "energia cinética destrutiva", pois não a energia cinética que incapacita o agressor, mas sim a distância penetrada no alvo e a quantidade de tecido destruído pelo projétil. Portanto, um projétil não possui energia suficiente para nocautear uma pessoa porque sua massa é milhares de vezes menor que a massa de um ser humano. Por exemplo, a massa de um projétil .40 S&W (11,66 g) é 6.432 vezes menor que a massa de um homem de 75 kg. A quantidade de energia depositada no corpo humano por um projétil é equivalente a ser atingido por uma bola de beisebol, de acordo com o cirurgião americano Douglas Lindsey, em seu estudo denominado “The Idolatry of Velocity, or Lies, Damn Lies, and Ballistics” (1980, p. 1068-1069). Assim, um projétil não pode simplesmente nocautear um homem. Se houvesse energia suficiente para fazer isto, então uma energia equivalente seria aplicada contra o atirador, e ele também seria “nocauteado”. Essa informação é corroborada por uma das maiores autoridades sobre ferimentos balísticos, o Coronel do Corpo Médico do Exército Americano e médico especialista em balística terminal Martin L. Fackler.

“Não há restrição legal para o uso da munição por forças policiais – a Convenção de Haia (1899) se aplica somente aos exércitos. Mas a sua aplicação é cercada de polêmica entre os defensores e críticos dos Direitos Humanos.” (Último Segundo, 2010).

Comentário nº 9: A Convenção de Haia se aplica somente às forças armadas dos países signatários e o que se proíbe, dentre outras coisas, é o emprego de armas, projéteis ou materiais calculados para causar sofrimento desnecessário. Então é importante frisar que o objetivo da munição expansiva é somente incapacitar imediatamente o agressor, mas jamais provocar sofrimento desnecessário.

“No exterior, a munição ponta oca é usada largamente pelas polícias dos Estados Unidos. Já na Inglaterra, foi utilizada, em 2005, para matar o brasileiro Jean Charles de Menezes, confundido com um terrorista dentro de uma estação de metrô em Londres.” (Último Segundo, 2010).

Comentário nº 10: Na Inglaterra a munição expansiva só é proibida para uso civil, conforme indica a Seção 5 (1A) do Ato de 1968, o que implica afirmar que não há proibição legal para o uso dessa munição por parte da polícia inglesa. Além disso, os chefes de polícia podem escolher qualquer tipo de munição que seja apropriado às necessidades operacionais dos policiais. O fato de o senhor Jean Charles ter sido morto não tem nenhuma relação com a munição utilizada pela polícia, mas com o ponto de impacto dos projéteis (sete disparos na cabeça e um no ombro). Certamente, qualquer pessoa morreria se atingida sete vezes na cabeça por qualquer tipo de projétil de qualquer calibre.

“O uso no Brasil dessa munição não é proibida pela Lei Federal n° 10.826/2003 e pelo decreto presidencial n° 5.123/2004, responsáveis por regulamentar as armas e munições no País. Ainda segundo a legislação, o Exército é o responsável por autorizar as munições que são usadas na federação, e cada órgão policial solicita os artefatos de acordo com sua necessidade. Segundo o Coronel Achiles Filho, assessor da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados da corporação, ‘não existe proibição para o uso da munição ponta oca, somente restrição a calibres maiores para as polícias’.” (Último Segundo, 2010).

Comentário nº 11:
A legislação está correta, afinal quem sabe das suas necessidades e diz como a polícia tem que operar é a própria polícia.

“No entanto o texto original da Conferência afirma que ‘estão banidas [em guerras] as munições que se expandem no corpo humano, como as que possuem o seu interior oco’.” (Último Segundo, 2010).

Comentário nº 12: o texto original da Convenção de Haia (1899) não bane as munições que se expandem no corpo humano. A Declaração nº 3 afirma que os países contratantes concordam em se abster do uso de projéteis que expandem ou achatam facilmente no corpo humano. O texto original informa o seguinte: “The Contracting Parties agree to abstain from the use of bullets which expand or flatten easily in the human body, such as bullets with a hard envelope which does not entirely cover the core, or is pierced with incisions.”

Comentário nº 13: Em 1907 ocorreu a segunda conferência de Haia, cujo objetivo era modificar algumas partes e adicionar outras ao texto da primeira convenção de 1899, especialmente em relação à guerra naval. O texto da Convenção de Haia de 1907 informa que o direito dos beligerantes para adotar meios para ferir o inimigo não é ilimitado; que é especialmente proibido empregar veneno ou armas envenenadas; matar ou ferir à traição indivíduos pertencentes à nação ou exército hostil; matar ou ferir um inimigo que, tendo deposto suas armas ou que não tenha condições de se defender, tenha se rendido incondicionalmente; empregar armas, projéteis ou materiais calculados para causar sofrimento desnecessário.

Comentário nº 14: Mesmo com o advento da Convenção de Genebra (1864) e das Convenções de Haia (1899, 1907 e 1954) que tentaram diminuir a gravidade dos conflitos armados no mundo, a própria ONU relata o crescimento no número de mortos nesses conflitos, conforme o quadro 5.1. Por quê? Porque as convenções tentam evitar o sofrimento desnecessário supostamente provocado pelos projéteis expansivos, mas não são capazes de impedir o ferimento ou a morte dos combatentes com o uso das munições ogivais.

Human Development Report 2005 – Capítulo 5 – Violent Conflicts (http://hdr.undp.org/en/media/hdr05_po_chapter_51.pdf)

Comentário nº 15: Embora nenhuma munição seja capaz de incapacitar imediatamente o agressor sempre, certamente alguns tipos funcionam melhor que outros, e qualquer margem a favor do policial é desejável na autodefesa. É lógico que a falha em incapacitar pode variar de acordo com a gravidade do ferimento, lembrando que esta severidade é uma função do ponto de impacto, da profundidade da penetração e da quantidade de tecido destruído. Por isso, é seguro dizer que se um alvo for 100% destruído, então a incapacitação é certa. Se 50% do alvo for destruído, a incapacitação é menos provável. A incapacitação é ainda menos certa se 25% do alvo for destruído. Contudo, e voltando à realidade, a destruição provocada por um projétil de arma de fogo é bem menor que 1% do alvo, mas a comparação é inevitável. Assim, um projétil expansivo que destrua 0,07% do alvo (52 g de um homem com 75 kg) incapacitará com mais frequência do que aquele ogival que destrua 0,04% (30 g). De qualquer modo, esta diferença pode ser muito pequena, mas ela representa uma margem de vantagem que deve ser sempre favorável ao policial. Caso contrário, esta margem penderá para os criminosos que tentam matar policiais todos os dias.

É triste, mas a verdade é que os que estão contra os policiais não são apenas aqueles que empunham armas e, contrariando a própria Convenção de Haia, nos matam utilizando meios limitados apenas pela imaginação; que nos eliminam à traição ou mesmo quando já nos rendemos ou não temos condições de defesa; que usam as mesmas munições expansivas que alguns acham que devem ser banidas; que nos torturam e queimam em fornos improvisados no alto dos morros; que deixam filhos órfãos e esposas viúvas!

Muitos acreditam que a Declaração Universal dos Direitos Humanos não vale para os policiais que defendem diariamente a propriedade, a justiça, a liberdade e a paz de pessoas desconhecidas. Contudo, uma coisa é certa: criminosos jamais tornarão o mundo melhor! Felizmente, todos os policiais do mundo sabem disso! E quem não sabe ou não tem nada bom para dizer deveria, pelo menos, ficar em silêncio!

“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.”

sábado, 4 de setembro de 2010

Entre o treinamento e o desespero!

Certamente você já ouviu o ditado: a propaganda é a alma do negócio! À primeira vista, a frase é simples, inocente e genial, como pode acreditar um estudante de publicidade que ainda acha que a maior invenção do mundo é o clipe para prender papel. Não discordo sobre a importância da publicidade e da propaganda nos empreendimentos comerciais e na vida pessoal. Mas o fato é que esta frase esconde uma questão intrigante: se a alma do negócio é a propaganda, qual a importância do produto em si? Sem a resposta correta para esta pergunta, cedo ou tarde, você vai comprar gato por lebre.

E uma das maiores propagandas que tenho notícia no meio policial diz respeito ao coldre de neoprene. A empresa Neoprene Brasil informa que o neoprene “é a combinação de uma fatia de borracha expandida sob alta pressão e temperatura, que quando vulcanizada é revestida com tecido dos dois lados ou de apenas um lado. Suas principais características são: flexibilidade, elasticidade, resistência e proteção térmica.”

Um bom coldre deve ser resistente, confortável, fácil de usar em qualquer circunstância e seguro. Embora os policiais acreditem que o coldre de neoprene proteja a arma contra a ferrugem (seu grande trunfo), isto não é verdade, pois nenhum coldre possui esta capacidade. De qualquer modo, o produto é vendido com ou sem presilha para cintos. Quanto ao último modelo, simplesmente me recuso a desperdiçar tempo precioso com considerações técnicas e táticas. Assim, se você possui um coldre desse tipo, considere a seguinte sugestão: jogue-o no lixo. Fazendo isso, você vai se livrar de metade do problema. Já a outra metade se revolverá quando você adquirir um produto de qualidade indiscutível.

Ops! Aqui tem outro problema! Num lugar onde as polícias se equivalem a indigentes em termos de equipamentos de uso pessoal e coletivo, adquirir algo de QUALIDADE INDISCUTÍVEL significa, invariavelmente, importar. A indigência não é uma falha dos policiais, mas do desconhecimento, do desinteresse, da inaptidão e da avareza dos responsáveis pelas aquisições de produtos destinados ao trabalho policial. A questão é que para preencher esta lacuna, os policiais acabam utilizando seus salários na aquisição dos equipamentos que precisam. E quando fazem isso, esbarram na pobreza do mercado nacional. Pessoalmente, não me importaria com a sobrevivência do mercado interno, desde que eu encontrasse os melhores equipamentos estrangeiros em cada esquina.

Então, eu penso numa bota Original Swat, Hi-tec Magnum ou Oakley, e alguém compra um calçado qualquer. Penso num colete tático Blackhawk, Eagle ou Leapers, e alguém me entrega um jaleco. Penso numa veste policial/militar 5.11, Gore-Tex Parka com camuflagens variadas, e alguém manda tingir uma gandola. Penso num bastão retrátil, e alguém compra uma tonfa de um metro. Penso numa arma Glock, Sig Sauer, CZ, Springfield, Heckler & Koch, Colt, Benelli ou Remington. Penso num sedan médio 2.0 ou superior adequadamente equipado para o trabalho policial, e alguém compra um camburão ou manda instalar um kit gás no carrinho 1.0 da polícia. Aí, penso num coldre Fobus, IMI, Blackhawk, Safariland, 5.11, Specter ou Uncle´s Mike, e alguém vende e faz propaganda de um produto de neoprene.

Mesmo assim, tentando melhorar o conforto, a própria segurança e a qualidade do trabalho que prestam ao país, a maioria dos policiais acaba adquirindo os produtos disponíveis nas parcas lojinhas de quinquilharias. Contudo, acreditando na propaganda boca a boca, o policial compra o tal coldre de neoprene. “Com ele, a arma não enferruja!”, “A arma fica firme na cintura!”, “Sempre que eu precisei, o coldre funcionou!”, “É muito confortável e nem parece que eu estou armado!”, “É ambidestro e compatível com várias armas curtas!”, “Quando eu treino o saque, o coldre nunca sai junto com a arma!”

Entretanto, caro colega, a diferença entre o treinamento e a vida real é o DESESPERO. E mesmo no treino, aqueles que usam coldres de neoprene acabam sacando, “sem querer”, suas armas e coldres ao mesmo tempo. Para piorar, na vida real, as coisas raramente ocorrem como você quer ou da forma como você treina.

Só para ilustrar esta real possibilidade, no Rio de Janeiro/RJ, um experiente policial federal reagiu durante um assalto. Ele sacou sua arma, mas o coldre de neoprene ficou preso nela. Mesmo assim, o policial conseguiu disparar UMA VEZ nos criminosos. Depois do primeiro disparo, a pistola falhou porque o coldre impediu o movimento do ferrolho (totalmente para trás ou para frente). Os criminosos revidaram e acertaram o policial, que só não foi assassinado porque os bandidos se deram por satisfeitos. Volto a lembrar: o desespero é a diferença entre o treino e a realidade.

Como policial, você provavelmente já experimentou aqueles sonhos recorrentes onde você está desarmado no meio de um tiroteio ou sua arma falha ou os projéteis caem no chão assim que saem do cano. E para transformar este sonho em realidade, basta você usar uma arma suja (ou de qualidade duvidosa) ou munição velha ou uma pochete “saque rápido” ou um coldre que não presta. Então, antes de gastar seu salário, verifique se o equipamento é o melhor possível e funciona na hora da AFLIÇÃO EXTREMA.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

O ofício do desalento

Após a última prova de tiro, os alunos, eufóricos e radiantes, se aglomeravam na expectativa de assistirem o vídeo produzido por um dos professores e que demonstrava uma pequena, mas importante fase do curso de formação policial, e porque não dizer, da vida de 600 futuros policiais.

Dias antes eu havia dito para alguns alunos que não existia um policial sequer que não tivesse passado por aquela academia e experimentado a ansiedade e a alegria que eles sentiriam em poucos instantes. Era tudo que meu coração podia dizer para aqueles novos e vibrantes colegas. E sobre as tristezas e os desânimos... Isso eu guardei só pra mim! Mas um amigo não mediu suas palavras ao me orientar no início da minha carreira. Ele disse: “Se o tiro for pra esquerda, corra pra direita! Se o tiro for pra direita, corra até o banco e saque o seu salário! Você não vai mudar o mundo! Ele sempre foi e sempre será assim!”

De qualquer forma, para ingresso na polícia, o candidato deve, conforme edital, possuir diploma de conclusão de curso superior. Se aprovado no concurso, ele executará investigações e operações policiais na prevenção e na repressão a ilícitos penais, bem como desempenhará outras atividades de interesse do Órgão. Mas antes disso, cada aspirante estuda, estuda, estuda e estuda. Treina, treina, treina e treina. Para muitos, são anos nesta rotina.

Então, há uma prova objetiva de conhecimentos gerais (língua portuguesa, informática, atualidades, raciocínio lógico, administração, microeconomia, contabilidade, direito e legislação especial). Segue-se uma prova discursiva. A avaliação psicológica identifica a capacidade de concentração e atenção, o raciocínio, o controle emocional, o relacionamento interpessoal, a capacidade de memória e as características de personalidade. Depois disso, é a vez do exame médico, que de tão criterioso possui norma própria. O exame de aptidão física inclui testes de barra fixa, impulsão horizontal, corrida e natação. Os policiais mais antigos precisaram, além disso, correr 100m, saltar sobre uma barra horizontal, subir 7m numa corda e saltar em distância. Logo é a vez da investigação social requisitar informações pessoais e certidões infindáveis.

Primeira etapa concluída, vem o curso de formação profissional, em regime de semi-internato e/ou internato, exigindo-se do aluno tempo integral com frequência obrigatória e dedicação exclusiva. Dedicação que o acompanhará pelo resto da vida “e, se necessário, com o sacrifício da própria vida”. É o que diz o Juramento do Policial.

Durante mais de quatro meses, cada futuro policial estuda técnicas de abordagem, armamento e tiro (disciplina que utiliza mais de 1.000 tiros por aluno), atividade física policial, balística, bombas e explosivos, controle de produtos químicos, segurança privada, crimes cibernéticos, crimes violentos, criminalística, defesa pessoal, direção operacional, direitos humanos, ética e deontologia policial, gerenciamento de crises, identificação papiloscópica, incêndio florestal, inteligência policial, crime organizado, estudo da polícia, investigação policial, informática, lavagem de dinheiro, arquivologia, comunicação social, organização administrativa da polícia, defesa institucional, imigração, meio ambiente, repressão a entorpecentes, crimes fazendários, polícia judiciária, crimes previdenciários, pronto socorrismo, radiocomunicação, regime jurídico, regime disciplinar, segurança aeroportuária, segurança de dignitários, sistema nacional de armas, técnicas de domínio tático, entrevista e interrogatório, tráfico ilícito de armas e vigilância. Os mais antigos ainda estagiavam durante 5 dias na unidade de operações especiais. Semanalmente, todos cantam o Hino Nacional e o Hino da Polícia durante as solenidades de hasteamento das bandeiras. Todos cantam, todos vibram, todos os dias!

Depois do curso de formação e da escolha de lotação, que ocorre de acordo com a nota obtida durante o curso, os novos policiais são nomeados e tomam posse, deixando para trás familiares saudosos, porém orgulhosos. Cada um recebe um kit (uma pistola Glock 9mm; três carregadores; um par de algemas; a carteira funcional que garante livre porte de arma e franco acesso aos locais sob fiscalização da polícia, sendo assegurada, quando em serviço, prioridade em todos os tipos de transportes e comunicações, públicos ou privados, devendo as autoridades prestar-lhe todo o apoio ou auxílio necessários ao desempenho de suas funções; senhas de acesso aos sistemas, etc.). Eles são apresentados aos policiais mais antigos quando tomam conhecimento que possuem 4 horas semanais para a prática de atividade física e um programa institucional anual de capacitação em armamento e tiro com 400 tiros. Durante o trabalho, erros e acertos são cometidos, e experiências adquiridas. E com o tempo suas vidas se ajustam.

Aí, no dia 30 de junho, abri um e-mail institucional e li o conteúdo do Ofício nº XXX, de junho de 2010, emitido por um dos nossos parceiros na luta contra o crime e a violência. Imediatamente, lembrei da frase do meu amigo e de outras que já ouvi (“Você dá muito valor pra isso tudo!”, “Se eu você fosse, não estaria nem aí!”, “O negócio é prestar outro concurso!”, “A solução é esperar minha próxima encarnação!”).

O ofício dizia o seguinte: “Informo a V.Sª que o acesso dos membros dessa corporação às dependências da XXXXXXXX, portando arma de fogo, encontra-se disciplinado pelo art. 3º da Portaria N.000000000, de 12/2008, e Portaria n.00000, de 04/2005, cópia anexa. Assim, salvo na hipótese em que os policiais se encontrem em escolta de detentos ou testemunhas, na qual é permitido o acesso com arma de fogo aos prédios desta Seccional, o ingresso das pessoas autorizadas a portarem arma de fogo institucional nas instalações da XXXXXXXX será admitido, desde que a arma seja entregue, sob cautela, à Seção de Segurança, Vigilância e Transportes, localizada no edifício XXXXXXXX – Av. XXXXXXXX XXXX – X andar. Sendo assim, solicito que a presente orientação seja repassada para o conhecimento dos comandados dessa corporação. Certo da atenção de V.Sª, colho o ensejo para renovar protestos de estima e apreço.”

Agora eu pergunto: como manter o entusiasmo e acreditar que desempenhamos tarefas importantes para o país onde vivemos quando até nosso parceiro está contra nós? O que dizer aos 600 novos policiais federais cujos olhos ainda brilham? O que dizer aos 600.000 policiais civis e militares que ainda lutam? Aos 12.000 policiais federais que ainda tentam? Aos 13.000 policiais rodoviários federais que ainda acreditam? Aos 75.000 guardas civis que ainda vigiam? Aos 280.000 militares das Forças Armadas que ainda protegem? Aos milhares de agentes penitenciários que ainda procuram manter criminosos onde eles devem estar? E o que dizer àqueles que estão longe e ainda se orgulham de nós?

A verdade é que nenhum policial brasileiro vai a um órgão público por simples lazer. Todos estão lá porque estão trabalhando! Policiais portam armas porque criminosos portam armas, e esta é a segunda melhor forma de defesa contra eles (a primeira é a prevenção). E armas de fogo estão mais seguras nas mãos de policiais do que numa gaveta de uma seção de vigilância e transportes. Os cidadãos e nossos parceiros não devem temer nossas armas; eles devem se precaver contra as armas empunhadas por pessoas que não têm compromissos com a vida, a liberdade e a justiça!

Cada policial acredita que é “forte na linha avançada”. E ele o é, pois apesar das adversidades e do fogo amigo, ele reclama e insiste para que seu trabalho tenha as condições de excelência que ele deseja. Portanto, ninguém deve tornar o trabalho policial mais difícil e desalentador do que já é. Para isto, já existem aqueles que tramam na escuridão dos esconderijos. O que se espera, é que aqueles homens que têm o poder nas mãos usem este privilégio divino para melhorar a vida daqueles que lutam contra o crime e a violência todos os dias.

E se isso não ocorrer, talvez eu tenha que considerar a possibilidade do meu amigo ser um sábio! Mas na dúvida, em agosto teremos um treinamento de armamento e tiro em Uberlândia/MG.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Jamais devemos esquecer!

Percorrendo os corredores da Academia Nacional de Polícia, mais uma vez me deparei com a Galeria de Heróis. E apesar de algum tempo na polícia, ainda me restam 10 anos até a aposentadoria. Mas se eu tivesse que trabalhar mais 30 anos, isso só confirmaria que não há fardo maior do que suportar as dificuldades do trabalho ou a perda de um amigo policial. Então, no ano em que se comemora a formação de seiscentos novos policiais federais, é preciso lembrar aqueles que deram as últimas gotas de sangue em benefício do nosso país.

Hoje, estampam-se os nomes de alguns colegas nas paredes de memoriais, mas são incontáveis os policiais perdidos ao longo do tempo, e em alguns casos, muito antes de qualquer um de nós ter nascido. E é por causa de suas ações corajosas e desses memorais que o legado desses homens se perpetua na história e na memória daqueles que ficaram.

Nossos heróis possuem origens e histórias tão diversas quanto o próprio país que defenderam. Porém, todos juraram proteger o inocente contra a malícia; o fraco contra a intimidação; a paz contra a violência e a desordem, e, sobretudo, a liberdade de pessoas que sequer conheceram. Portanto, eles estarão sempre unidos pelo laço inabalável da honra, pois fizeram o que juraram fazer. E embora não haja discurso, cerimonial, continência e salva de tiros que possam aliviar essas perdas, é preciso sempre homenagear esses homens e aprender com os ensinamentos deixados por eles, mesmo após seus últimos suspiros.

É preciso estar alerta, vigilante. Vigília significa a privação voluntária do sono ou o estado de quem se conserva desperto durante a noite. Quer dizer, precisamos estar despertos para não esquecermos os heróis que perdemos e atentos para continuar com segurança o trabalho que poucos homens conseguem realizar, mas que criminosos insistem em destruir. E ainda que possamos ter medo, desânimo e desilusões, temos que rejeitar a covardia, pois ao contrário das outras profissões, aqueles que abraçam o trabalho policial sabem que um dia podem ter que lutar pela própria vida durante o cumprimento do dever.

Aqueles a quem devemos nossa lembrança escolheram essa profissão de bom grado, e é por isso que seu sacrifício final tem um significado tão importante. Eles trabalharam e se sacrificaram por um propósito maior do que eles: a humanidade.

Para aqueles que atenderam ao chamado íntimo para tornar nosso país seguro e melhor, é preciso reconhecer a importância de cada beijo do cônjuge, cada sorriso dos filhos, do abraço dos pais e das palavras dos amigos e heróis policiais que ainda vivem, pois sem o amor e a ajuda dessas pessoas nosso fardo seria ainda mais pesado.

Devemos assumir a responsabilidade por nossa segurança; tomar uma atitude contra o crime e a violência; fazer o que é certo; e sempre ajudar uns aos outros nos bons e maus momentos de nossas vidas para honrar aqueles eternizados em nossas galerias e memorais.

O Livro de João, Capítulo 15, Versículo 13 diz: “Ninguém tem amor maior do que este, de dar alguém a vida pelos seus amigos.” Portanto, jamais devemos esquecer essas palavras e nossos amigos policiais que se foram antes de nós.


segunda-feira, 22 de março de 2010

Aprenda com os policiais mais experientes!

Após 21 anos de serviço, uma das coisas mais importantes que fiz foi ouvir e observar os policiais mais antigos ou experientes, principalmente durante os seis anos em que trabalhei na Delegacia de Repressão a Entorpecentes da NO/NO/NO.

O termo ANTIGO é relativo, pois pode significar alguns anos a mais de serviço ou a experiência prévia trazida de outra força policial. Mas mesmo assim esses policiais sabem das coisas.

Então, o segredo é ouvir os policiais experientes, acreditar nas histórias que contam e colocar seus ensinamentos em prática na sua própria vida. “Quando você estiver chegando, tire o cinto de segurança!”; “Eu só atiro quanto tenho certeza!”; “Se puder beber, comer e descansar; beba, coma e descanse. Você não sabe quando poderá fazer isso de novo!”; “Policial não trabalha sozinho!”; “Calma! Ele vai continuar traficando, então a gente prende ele depois!”; “Algeme pra trás!”; “Fale pouco e ouça muito!”; “Não vá fazer m... hein!” e “Polícia não foi feita pra ajudar ninguém, mas no mínimo para atrapalhar!” são algumas frases que ouvi destes policiais.

Portanto, o que eu aprendi a partir disso abrange desde técnicas de sobrevivência até regras de comportamento que talvez tenham salvo minha vida em ocasiões que eu sequer percebi.

Não acredite em ninguém

Provavelmente, uma das coisas mais importantes que aprendi nesses anos é que as pessoas mentem. E não importa se são avós, pais, filhos, esposas, maridos, irmãs, irmãos, vizinhos, amigos, trabalhadores, desempregados, ateus, crentes, testemunhas ou mesmo suspeitos, pois todos eles mentem. Apesar de não mentirem sempre, com certeza todos eles mentem quando você conversa com eles.

Criminosos sempre mentem. Sempre. E eles vão lhe encarar direto nos olhos, transparecendo seriedade e inocência, e você será tentado a acreditar neles. Não acredite, porque eles estão mentindo.

Observe as mãos

Se um suspeito for lhe atacar, ele vai usar as mãos. Então, algeme qualquer um que transmita a impressão de que vai dar mais trabalho, mesmo que ele não goste disso. “Minha segurança em primeiro lugar, depois o sentimento alheio!” foi o que ouvi de alguém. Certa vez um preso me disse que eu não precisava algemá-lo porque ele iria se comportar. Bem, eu o algemei e disse que aquilo era para a segurança dos policiais e não pra dele. Ele não gostou nada, mas o fato é que eu ainda estou vivo, e aproveitando cada dia de sol. Lembre-se, quem diz como o trabalho policial deve ser feito é você e não o preso.

“As mãos matam!”. Foi o que disse um professor de tiro da Academia Nacional de Polícia. Então, observe as mãos constantemente já que você estará correndo risco até que consiga controlar as mãos do criminoso. Além disso, nenhuma academia de polícia ensina como algemar presos pela frente; e se o mundo inteiro algema criminosos para trás, você deve fazer o mesmo.

Sempre trave sua algema. Se ela não dispõe de um sistema de trava, então você deve descartá-la. Por quê? Porque todo delinquente é mentiroso, chato e folgado. Por isso, se sua algema não estiver travada, ele vai reclamar que ela está apertando até que você o algeme para frente. O problema é que algemado para frente, o bandido pode fugir, lutar contra você ou sacar sua arma.

Se você estiver entrevistando um suspeito e ele olhar para um lado, depois para o outro, e então sobre os seus ombros, provavelmente ele está procurando um lugar para onde correr. Algeme-o antes que ele fortaleça esta ideia e tome uma decisão.

Não adquira o hábito de colocar suas próprias mãos nos bolsos ou cruzar os braços na frente de um suspeito. Isso pode transmitir a impressão de que você é relaxado ou negligente. Além disso, você pode precisar dessas mãos para se defender. Então, é preciso que elas estejam disponíveis logo.

Faça uma busca pessoal. Faça outra busca pessoal

Em 28/05/2009 um policial civil foi assassinado e três foram feridos durante a condução de um preso. O preso foi detido pela Polícia Militar por estar embriagado e perturbando a ordem.

O suspeito foi levado à delegacia da Polícia Civil de Confresa/MT e colocado numa cela. Ao ser retirado do local, ele tirou um canivete da cueca e golpeou os policiais.

O investigador O.S. foi atingido no ombro e morreu em seguida; a escrivã A.G. recebeu dois golpes, um na cabeça e outro quase no pescoço; o policial M.M. foi gravemente ferido no abdômen e a investigadora M.S. também foi ferida.

O preso só foi contido quando a policial R.M.M. atirou na perna dele. Ao que tudo indica, as buscas pessoais realizadas pelas polícias foram mal conduzidas ou não foram feitas.

Portanto, se outro policial lhe entregar um preso, faça uma nova busca pessoal antes de assumir a custódia, mesmo que você tenha acabado de ver aquele policial fazer isso.

Faça uma busca pessoal em qualquer pessoa que esteja perto o suficiente para manter contato físico numa situação que pode se tornar crítica ou se você tiver a menor suspeita sobre algo.

Se você não se sente à vontade em “apalpar” alguém, você ainda pode realizar uma busca pessoal minuciosa. Assim, leve o suspeito até um cômodo reservado (cela, quarto, etc.) e mande que ele retire toda a roupa, mas uma peça de cada vez que deve ser entregue na sua mão. Reviste cada peça de roupa. Ordene que o suspeito, ainda nu, se agache de frente e de costas. Mande que ele levante os braços e depois as solas dos pés. Ordene que ele esfregue os cabelos com as mãos, depois abra a boca e ponha a língua para fora.

Dê uma geral em qualquer pessoa que entre na viatura, mesmo que seja aquele informante que já ajudou a polícia centenas de vezes. Afinal, informantes também são criminosos. Faça o mesmo ao colocar ou retirar um preso da cela. Reviste os bancos e o cubículo da viatura antes e depois de colocar um custodiado dentro do carro. É quando você pode achar drogas, lâminas, anotações, celulares, armas, etc.

Armas e equipamentos

Sua arma deve estar pronta, envolvida por um coldre de qualidade ou por suas mãos, e de mais ninguém. Dedo fora do gatilho. Já falei sobre isso em outros artigos.

Leve um carregador sobressalente. Se puder leve dois carregadores reservas. Conheço um policial que disparou 15 tiros contra dois assaltantes armados. Num piscar de olhos o policial ficou sem munição, mas por sorte os criminosos também ficaram sem munição. Você provavelmente deve conhecer casos semelhantes. Então, aprenda com as experiências dos outros.

Só atire quando tiver certeza de que é para salvar sua vida ou a de outra pessoa. Armas foram feitas para incapacitar pessoas, e muitas vezes até isso é difícil. Tiros não param aviões, automóveis ou motocicletas a não ser que você acerte o condutor – o que normalmente não é uma ideia razoável. Tiros também não abrem portas, sendo provável que o projétil atravesse a porta e acerte um inocente. Já vi esse tipo de ocorrência duas vezes!

Tenha sempre à mão um canivete tático dobrável e um alicate multifuncional. Certa vez, durante uma operação de DRE, aquela velha camionete D-20 de cor azul teve o cabo do acelerador quebrado numa estrada entre os municípios de “São Ninguém” e “Lugar Algum”. Mas foi o alicate multifuncional e um pedaço de arame de um antigão que nos tirou dali. Ele olhou para mim sorrindo e disse: “É pra isso que eu carrego estas coisas!”

Em algumas situações você pode levar alternativas menos letais, como um spray de pimenta, um bastão retrátil. Um bastão é o melhor substituto para a coronha de uma arma e para as mãos. Imagine que você precise quebrar o vidro de um carro para socorrer alguém. Sem esta ferramenta, talvez você se sinta forçado a quebrar a janela usando objetos que não foram desenvolvidos para tal fim.

Isso me lembra uma orientação muito importante: proteja suas mãos. Como são elas que vão salvar sua vida, você não deve fazer com elas aquilo que deve ser feito com uma ferramenta. Não ponha as mãos nos bolsos de um suspeito porque você pode ser ferido por lâminas ou agulhas.

Compre uma caixa de luvas de látex para procedimentos (luvas cirúrgicas). A caixa com 100 unidades custa cerca de R$ 15, o que é pouco pela proteção oferecida contra a imundice e o mau cheiro que normalmente são encontrados nas casas de pessoas investigadas. Recentemente, recebi um e-mail de um colega (que ganha R$ 7.500,00 por mês) dizendo que não iria comprar um kit de limpeza de arma (que custava R$ 20,00) porque isso era tarefa da União. Espero que ele compre pelo menos a caixa de luvas que custa 25% menos!

Cuidado com objetos que parecem inofensivos

Pessoas desesperadas podem atacá-lo com qualquer objeto à mão, especialmente na cozinha, no gabinete ou no cartório. Portanto, tenha cuidado com canetas, grampeadores, ferramentas, tesouras, facas, garrafas, etc. Lembre-se, observe as mãos e as algeme se suspeitar de algo.

Luzes

Compre uma lanterna de qualidade. Ser capaz de ver bem é tão importante quanto estar armado. Jamais compre estas lanterninhas xing ling que são vendidas nas feirinhas de importados. Compre logo uma lanterna Surefire, Streamlight, Fenix, Blackhawk, Inova, Ultrafire ou Pelican para situações táticas. Tenha sempre uma Mini Maglite 2AA ou Police para buscas diversas (o que economiza a bateria e a vida útil da lanterna tática) e uma lanterna de bolso 1AAA afixada no chaveiro do seu carro para as emergências.

Isso pode parecer um exagero, mas infelizmente tudo que depende da energia elétrica cedo ou tarde falha ou apaga.

Cuidado ao dirigir a viatura ou perseguir alguém a pé

Não dirija como um doido e ziguezagueando pelas ruas, mesmo numa situação de emergência. As pessoas demoram a ouvir as sirenes, a entender o que está acontecendo e o que devem fazer. Com uma viatura é muito fácil você chegar num cruzamento antes que os outros motoristas percebam. E se você se envolver num acidente, sua missão acaba aqui porque você não poderá ajudar ninguém se estiver incapacitado. Portanto, mantenha-se na faixa da esquerda, pois é isto que manda o código de trânsito e é o que os outros motoristas esperam que você faça.

Se você estiver perseguindo um criminoso a pé e notar que seus colegas sumiram, pare – eles terão dificuldade para encontrá-lo caso você precise de ajuda. Se você estiver perseguindo um criminoso e de repente ele sumir, pare – talvez ele tenha preparado uma emboscada.

Portanto, não banque o herói. Haverá outra chance para você prendê-lo algum dia ou ele será morto por um desafeto. De qualquer modo, você vence.

Entrevistando suspeitos

A primeira coisa que você deve fazer ao entrevistar algum suspeito é evitar perguntas idiotas. Isso parece óbvio, mas mesmo assim cito algumas perguntas que já foram feitas. Prepare-se! “O que você comeu hoje?”, “Você está armado?”, “Onde está a droga?”, “Este documento é falso?”, “Você vai fugir?”, “Esta arma é sua?”, “Por que você não diz a verdade?”.

O segundo aspecto numa entrevista é deixar que o suspeito fale. Quanto mais ele fala, mais mentiras ele conta. Ouça o que ele diz, tome nota e confira as informações. Se forem falsas, simplesmente diga ao suspeito que ele está mentido e que você sabe disso.

Quando você tiver alguém sob sua custódia, jamais comente assuntos relacionados à investigação. Não diga como você chegou até ele, nem revele qualquer informação que possa ser utilizada por ele para aperfeiçoar suas técnicas criminosas. E jamais conte o que ele fez de errado para que você conseguisse pegá-lo. Isto dificulta o trabalho da polícia depois. Recentemente, um preso reclamou que a polícia havia entrado muito cedo em sua casa. O policial respondeu que na verdade a polícia estava no local às 05h30, mas que ela só poderia entrar no local a partir das 06h. O policial ainda disse que era costume aguardar alguns minutos pra que todos os relógios marcassem este último horário. Em outra ocasião, um policial disse ao preso que tinha sido muito fácil prendê-lo porque ele foi desatento e não percebeu que estava sendo seguido. Infelizmente, alguns policiais querem mostrar que são bons profissionais, e acabam revelando informações que não deveriam.

Dê atenção ao instinto

Sempre use o bom senso. Sempre. E se você sentir que há algo errado, simplesmente acredite que há algo errado. Mantenha este foco mental até ter certeza se está tudo bem.

Sempre confie na sua intuição. Sempre. É o acúmulo das experiências que fazem sentido para você e que está trabalhando de modo subconsciente para mantê-lo a salvo. Isso me leva ao item “Não acreditem em ninguém”.

Abra seus olhos

Saiba que não existem presos “tranquilos” ou “gente boa”. As unidades prisionais espalhadas pelo país estão repletas de ladrões, assaltantes, homicidas, latrocidas, estelionatários, falsários, sequestradores, torturadores, estupradores, traficantes, etc. E nenhum deles é “gente boa” ou “tranquilo”. Se você ainda tem alguma dúvida, basta perguntar às vítimas!

Dos direitos dos presos

O artigo 42 da Lei 7.210/84 diz o seguinte: “Aplica-se ao preso provisório e ao submetido à medida de segurança, no que couber, o disposto nesta Seção.” A expressão NO QUE COUBER implica dizer que o preso não tem direito a tomar cafezinho, comer pão de queijo, fumar um cigarrinho, perambular pela delegacia como se fosse um funcionário ou ficar abraçadinho com a namorada.

Sugestões

Há dezenas de dicas que você pode acrescentar neste texto para torná-lo melhor. Faça isso e depois leia o artigo de vez em quando.

E não se esqueça de preparar uma BOROCA. Mas se você não sabe o que é isso, pergunte aos colegas mais antigos ou experientes.

*Este artigo é também uma homenagem aos colegas com quem tive a oportunidade de aprender.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

O que eu faço quando alguém está atirando?

A resposta para esta pergunta é: depende.

Depende de onde você está, com quem você está, quem está atirando, quais opções você tem, e da sua habilidade.

De qualquer modo, os resultados mais comuns quando alguém está atirando em você são:

1) Você morre;
2) Você vai para o hospital;
3) Você foge;
4) Você atira de volta e o agressor foge;
5) Você atira com tanta concentração na tarefa e tão bem que o agressor é ferido ou morto;
6) Outra pessoa aparece e também atira, resultando num dos itens acima.

E as pessoas que querem matar alguém normalmente não param até que:

1) Tenham sucesso;
2) Acreditem que foram bem sucedidas;
3) O perigo aparece e elas têm que parar.

Então, a primeira questão é se o atirador está disparando especificamente em você ou se ele está atirando em outra pessoa e os projéteis estão indo noutra direção. Estes dois cenários são relevantes para a escolha da melhor estratégia de reação. De qualquer modo, seus objetivos devem ser:

1) Sair da linha de tiro;
2) Sair da visão do atirador;
3) Sair da área.

Enquanto estes objetivos também se apliquem para quando alguém está tentando matá-lo, devido à gravidade da situação, você provavelmente precisará fazer algo mais para se salvar. Mas quando o atirador está disparando noutra pessoa, provavelmente ele vai estar muito ocupado para se preocupar com você. De qualquer forma, as estratégias mencionadas são padrões de comportamento muito eficazes.

Agora observe a ilustração ao lado. Imagine que as setas que formam o V representam a fatia de um bolo e que o atirador está na ponta mais estreita (o vértice). Assim, quanto mais distante do atirador, mais larga é a fatia, e do ponto de vista dele, menor é o alvo (perspectiva). Do modo contrário, quanto mais perto do atirador, mais estreita é a fatia, e maior o alvo.

A distância é um fator importante porque se o atirador não apontar a arma direito, mesmo que ele queira atirar no alvo, existe uma boa chance dele errar. Desse modo, quanto mais longe do atirador, maior a margem de erro. Assim, o problema aqui não é o tamanho da arma ou do calibre, mas o tamanho do alvo que você representa para o criminoso. Voltando à ilustração, se você se distancia do atirador, isto significa que seu corpo preenche apenas ¼ da fatia (representada pela figura oval de linha pontilhada), e não um inteiro (se você estiver próximo demais). Quer dizer, quanto mais você se afasta do atirador, mesmo dentro da fatia, menor a chance de você ser atingido.

Mas não interessa só se você está perto ou longe, porque o que importa também é que você ainda está dentro da fatia, e os projéteis lá dentro só vão parar quando atingirem alguma coisa ou alguém. E enquanto correr pode ajudar, o que você precisa fazer é sair da fatia.

Por isso é importante saber se o criminoso está atirando noutra pessoa. Se ele está disparando contra você, há uma grande chance de que ele se mova para colocar você dentro da fatia de novo.

Então, a segunda questão que vai determinar sua conduta é: você está dentro ou fora da fatia? Você está em uma área ampla e aberta ou num local onde existe uma cobertura (quando você não pode ser visto) ou um abrigo (quando os projéteis não podem lhe atingir)? Aqui também há uma diferença.

Se você está num local fechado com um atirador, SAIA JÁ! Infelizmente, muitas pessoas se abaixam ou tentam se esconder atrás de mesas e portas. Se for preciso jogar uma cadeira na janela para criar uma saída, faça isso! Correr para outro ambiente pode lhe fornecer tempo para criar outra rota de fuga também.

Outra coisa que você precisa fazer quando estiver saindo de um tiroteio em um ambiente fechado é NÃO PARAR. Quando mais longe você estiver, menor a chance de ser atingido por um tiro.

Mas se você está num local aberto e um tiroteio começa, ENTRE EM ALGUM LUGAR, mas não pare para ver o que está acontecendo. Entre no prédio e ganhe distância da entrada. Fazendo isso, você sai da linha de tiro, da visão do atirador e está coberto e abrigado.

Se você está um local aberto e muito amplo onde não existe cobertura ou abrigo, CORRA! Aumente ao máximo a distância entre você e o atirador. Lembre-se sobre o que foi dito a respeito da distância. Se no meio do caminho, você encontrar algo que possa protegê-lo, continue correndo, e coloque o objeto entre você e o atirador para que sua fuga fique protegida.

Talvez o mais importante seja saber o que não fazer. Portanto, quando alguém estiver atirando não fique parado de pé para ver o que está ocorrendo. O som típico dos tiros já diz que alguma coisa complicou. Ficar parado de pé faz você um alvo estacionário que pode ser visto pelo atirador.

A terceira consideração é se o criminoso está realmente querendo matar você. Se ele está decidido em fazer isso, então ele vai rastrear você até colocá-lo dentro da fatia do bolo e se aproximar o máximo para acertar o maior número de tiros. E é aqui que os seis resultados mais comuns de quando alguém está atirando em você ocorrem.

Se você for atingido uma vez, mas socorrido com qualidade e rapidez, sua chance de sobrevivência é muita grande. Mas se você ficar parado suas chances diminuem à medida que você leva mais tiros à queima-roupa.

O quarto aspecto se refere às pessoas que estão com você. Ser capaz de proteger a própria família é um item importante na decisão de ter e usar uma arma de fogo.

Desse modo, você precisa reconhecer que sua tarefa se assemelha ao trabalho de segurança de dignitário, no qual a primeira prioridade é conduzir a pessoa para longe do perigo ao invés de ficar parado trocando tiros com os agressores. Ou seja, você leva a pessoa para a primeira entrada disponível, para dentro do carro ou do edifício, mas sempre para longe do perigo.

Contudo, se você sente que tem de atirar também, a primeira coisa que precisa fazer é se mover para uma posição diferente. Fazendo isso, você vai forçar o atirador a mover a fatia do bolo para reenquadrá-lo. Por quê? Porque o criminoso perceberá que a resistência (e o perigo) vem da sua parte e não da sua família. Assim, sua família ficará fora da área de ação do criminoso e poderá se salvar.

Porém, se o criminoso estiver atirando em você de propósito e você estiver sozinho... é para esta situação que serve seu treinamento de tiro de combate, de autodefesa, em ambiente confinado, tático, defensivo, etc. Não importa o nome que se dê para isso, pois você ainda precisa se afastar dele, sair da fatia e não parar de atirar até que o perigo desapareça. Aí você vai ficar surpreso com a rapidez com que o criminoso irá fugir quando você estiver atirando nele.


quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Pelo menos faça a sua parte!

Quem determina o destino? Talvez esta seja a mais antiga indagação de todo ser humano!

Muitas pessoas acreditam que o destino é imutável porque é controlado por uma força maior. Uns chamam esta força de Energia, alguns chamam de Natureza, e outros avocam Deus. “Ele é um predestinado!”, “Ninguém morre antes da hora!” e “Morreu porque sua hora chegou!” são expressões que exemplificam esta crença.

Outros indivíduos creem que o homem vive como pode até que seu destino se mostre e o guie nos momentos decisivos da sua existência. E eles dizem: “Meu anjo da guarda é forte!”

E alguns ainda entendem que o destino nada mais é do que o resultado das escolhas e do comportamento de cada pessoa, não obstante a presença divina. Estes afirmam: “Ele fez por merecer o melhor!” e “Morreu porque quis!”

Apesar da diversidade de crenças e das frases feitas, só uma coisa é realmente certa: ninguém conhece verdadeiramente o próprio destino; ninguém sabe previamente o resultado final de uma escolha, seja ela boa ou ruim.

Mas imagine que todas as vítimas do crime e da violência pudessem, horas antes de serem atacadas, visualizar o futuro por um breve momento. Quantas pessoas se salvariam? Agora pense quantos policiais seriam salvos se eles pudessem conhecer o futuro. Se isto fosse possível, com certeza cada um de nós teria um, dois ou, quem sabe, dez amigos policiais ao nosso lado novamente.

Assim, o detetive da Polícia Civil de Minas Gerais A.B.A.S (32 anos) não perseguiria o suspeito que o emboscaria numa rua escura e o mataria com um tiro na cabeça em 23 de janeiro de 2003 na cidade de Belo Horizonte/MG.

Se soubessem que um dos presos, levado para a 25ª DP do Engenho Novo, conseguiria se livrar da algema descartável, desarmar, atirar e matar um dos colegas, os policiais do 3º BPMRJ teriam contido o criminoso com uma algema convencional e mantido a segurança do armamento durante todo o tempo em que preenchessem o boletim de ocorrência em 07 de agosto de 2008.

Em 28 de maio de 2008, o policial civil do Estado de São Paulo C.P.S. (57 anos) não teria ido sozinho ao Morro do Kibom para entregar uma intimação se soubesse que a pessoa que assinaria o documento aguardaria que ele virasse de costas para esfaqueá-lo, tomar-lhe a arma, abrir fogo, e depois arrastar seu corpo por cerca de 100 metros até a viatura na tentativa de incendiá-la junto com seus restos mortais.

Os instrutores da Academia de Polícia do Barro Branco não realizariam a instrução de tiro do dia 20 de janeiro de 2004 se soubessem que um disparo acidental ceifaria a vida do soldado PMSP 2ª classe F.G. (23 anos).

Os policiais federais F.L.F (42 anos) e J.G.R não permaneceriam horas à fio dentro de uma viatura descaracteriza durante uma campana se soubessem que quatro criminosos armariam uma emboscada que mataria F.L.F com um tiro no tórax, em 13 de dezembro de 1989, na cidade de Campo Grande/MS.

E com certeza, na manhã do dia 17 de janeiro de 2010, o soldado D.A.W. e o 3º sargento W.A.C. (41 anos), ambos da Polícia Militar do Rio de Janeiro, não estacionariam a viatura na região central da cidade e ficariam dentro dela se tivessem a convicção de que em 30 minutos, três ou quatro criminosos se aproximariam num carro preto, sairiam do veículo e disparariam ininterruptamente contra os dois, provocando ferimentos no primeiro e a morte imediata do segundo.

Não há dúvida de que o treinamento e o trabalho policial seriam mais fáceis e seguros se existisse esta tal vidência. Afinal, bastaria treinar continuamente e à exaustão cada aluno predestinado ao confronto com criminosos ou alocar estes policiais em outras atividades. Mas isso é pura ficção, e a realidade é tão dura quanto o chão no qual tombaram estes heróis.

Por isso, você precisa considerar sua crença, seja ela qual for, e se perguntar se ela encoraja ou não sua capacidade para se defender; se ela impõe a aceitação incondicional de que tudo na vida é obra de um destino inflexível ou se o estimula a aceitar total responsabilidade por sua segurança pessoal.

Por que isto é importante? Porque alguém que acredita que seu destino é controlado por uma força externa tende a relaxar e não ser bem sucedido em uma situação de sobrevivência se comparado a um indivíduo inclinado a confiar em sua própria capacidade para decidir e tomar uma atitude. Aquele que se considera no controle das coisas boas e ruins que experimenta tem mais chance de superar situações difíceis do que aquele que acredita que as coisas ocorrem por acaso. Este último se entrega facilmente às adversidades, pois seu destino não lhe pertence, não importando o que ele faça para estar a salvo.

Logo, cada policial deve assumir total responsabilidade por sua própria segurança fazendo aquilo que lhe cabe. Ou seja, pelo menos não cometendo os mesmos erros que têm levado as vidas de milhares de policiais em todo o mundo.

No centro deste tema estão o estado de alerta e o comportamento preventivo. O comportamento preventivo começa quando você simplesmente acredita que pode ser o alvo algum dia. O estado de alerta ocorre quando você presta atenção nas pessoas e nos acontecimentos à sua volta.

Mas sabendo que não é possível permanecer 100% alerta 100% do tempo, você pode avaliar quais os momentos da sua vida requerem um nível maior de atenção. Sem dúvida, estar dentro de uma viatura num local perigoso exige um nível de alerta maior do que se você estivesse num supermercado. Ficar na viatura é confortável, mas perigoso. Fora dela é ruim, porém mais seguro. Fora da viatura, você vê o que ocorre na redondeza e pode reagir mais rápido do que se estivesse confinado dentro do veículo.

Com isto em mente, pode-se dizer que a morte não tem hora ou data marcada, a menos que você vacile e faça seu próprio agendamento. Deus deseja o seu bem, contudo certas tarefas são da sua responsabilidade. E ficar vivo é uma delas!