sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Retrospectiva policial: preparando-se para 2010!

O ano de 2009 está acabando e é vital que cada policial faça uma retrospectiva sobre suas ações durante e fora do trabalho.

É importante considerar quantas vezes você se afastou, inocentemente ou não, dos elementos básicos da autodefesa na atividade policial e nas horas de folga. Quantas vezes você permitiu que desconhecidos se aproximassem sem serem notados com antecedência. Quantas vezes você esqueceu ou deixou sua arma em casa ou dentro do carro. Quantas vezes você não algemou o preso porque ele parecia inofensivo. Quantas vezes você trabalhou sozinho. Quantas vezes você deixou de adquirir um equipamento de qualidade porque achou que era caro ou não era importante. Quantas vezes você agiu por impulso sem antes realizar uma análise da ocorrência. Quantas vezes você foi rude com um colega e outras coisas mais.

Sem esta retrospectiva, talvez você possa voltar ao trabalho em 2010 e, dia após dia, cometer os mesmos erros que cometeu no ano anterior. Você pode negligenciar os componentes críticos da sua estratégia de prevenção contra as ameaças à sua vida. Você pode cometer os mesmos erros que outros cometeram desde que a luta pela justiça e pela paz teve início.

Por isso, talvez a falta da lembrança do passado tenha sido um dos ingredientes que conduziu à morte nossos amigos policiais que trabalharam em 2009 em Osasco/SP, Belém/PA, Feira de Santana/BA, Rio das Ostras/RJ, Belo Horizonte/MG, Ji-Paraná/RO, Rio Branco/AC, Recife/PE, Cariacica/ES, Samambaia/DF, Confresa/MT, Foz do Iguaçu/PR, Manaus/AM, Picos/PI, Murici/AL, Porto Alegre/RS, Anápolis/GO, Areia/PB, etc.

Sua experiência e a prática de vida de outros policiais são uma das melhores ferramentas de aprendizado que você pode utilizar, principalmente numa profissão na qual uma decisão incorreta pode matar alguém, inclusive você. Experiências, boas ou ruins, devem ser revistas com o propósito de encontrar aquilo que fez toda diferença para o sucesso da ação quanto para localizar as falhas que conduziram à infelicidade.

Você não precisa mudar (na essência as pessoas não mudam), mas você é capaz de melhorar. E se tudo que você fizer na atividade policial possuir este espírito, então você corre menos riscos. Se você avalia as situações de perigo ocorridas no passado tanto quanto aquilo que foi feito de certo ou errado e o que precisa ser melhorado, então você tem a confiança e a coragem para enfrentar uma ocorrência perigosa.

Portanto, pergunte a si mesmo o que faria em determinadas situações; conte com um ferimento como preço justo pela sobrevivência; treine; permaneça pronto; cuidado com a rotina; saiba quanto vale sua vida; saiba por que você quer viver; porte sua arma; limpe sua arma; estabeleça sua segurança como primeiro objetivo; trate bem o amigo da força policial e diga que se 2010 for o ano em que sua sorte será lançada, então você fará o que precisa ser feito para vencer.

Pense positivo, revise sua conduta e permaneça em alerta, porque ao longo do tempo seus pensamentos se tornam suas ações. Observe suas ações porque elas se tornam hábitos e experiências, boas ou desagradáveis.


quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Será que funciona?

A posse de uma arma de fogo impõe uma série de responsabilidades, e após uma divertida sessão de tiros, um treinamento ou mesmo o porte num coldre dissimulado vem àquilo que alguns ainda consideram o trabalho duro, a parte chata, o desnecessário.

Mas a limpeza do armamento é o mais básico e importante item para quem tem uma arma. Com o cuidado e uma limpeza regulares, uma arma de fogo pode durar muitos anos. E isto é especialmente importante se você confia sua vida neste instrumento e pretende se aposentar usando a mesma arma que utiliza hoje no trabalho.

Contudo, uma breve inspeção durante a manutenção das pistolas usadas por 50 policiais demonstrou que apenas oito delas estavam limpas. Fios de cabelo, poeira, fiapos de pano, terra, cinzas de cigarro, tecido morto e resíduos de pólvora foram alguns dos itens encontrados nas armas. O curioso é que esta displicência abrangeu desde os policiais antigos e experimentados até os mais novos. Com certeza não é culpa da inexperiência e nem culpa da formação básica recebida. E o pior é que todos estes policiais sabiam que suas armas estavam em péssimas condições de limpeza. Só para constar, das oito armas em boas condições, quatro estavam assim porque seus usuários só as utilizam durante as operações policiais. Então eu não sei o que é pior: deixar uma arma limpa em casa ou uma arma porca no coldre!

Há alguns anos, os policiais reclamavam da qualidade das poucas armas existentes, da falta de munição, da ausência de treinamento, etc. Doze anos atrás, o policial recebia um revólver .38 SPL, conhecido por “canela seca”; os cartuchos eram contados como se fossem pedras preciosas; e quem desejava treinar pagava pela munição recarregada e pelo aluguel do estande. Hoje, cada policial recebe uma arma (cuja qualidade é internacionalmente reconhecida), três carregadores, 400 cartuchos para treinamento anual, além de contar com excelentes instrutores de armamento e tiro formados pela academia de polícia e um programa de treinamento instituído por norma. E o que alguns policiais fazem? Esquecem o passado, deixam as armas sujas e continuam reclamando.

Então será que na hora da verdade sua arma vai funcionar? Será que cada vez que você apertar o gatilho, um projétil será lançado em direção ao alvo ou àquele que quer matar você? Você garante que sua arma, na condição que está agora, é capaz de salvar sua família? Das 50 pistolas analisadas, é possível garantir que quatro funcionariam, pois estavam limpas, alimentadas e no coldre do policial. As outras quatro, apesar de estarem limpas, não funcionariam no momento da necessidade porque seus usuários simplesmente não portam armas. Quanto às demais, não é possível garantir coisa alguma!

Portanto, a primeira coisa que você pode fazer para garantir que sua arma funcione é adquirir um kit para limpeza de armas (que custa cerca de R$ 20). Estes kits estão disponíveis em lojas de acessórios de armas de fogo ou de caça e pesca, e são projetados para tipos específicos de armas (pistolas, fuzis, espingardas). Normalmente cada kit possui três varetas metálicas (com cerdas de latão, nylon e tecido), óleo, solvente e uma flanela. Velhas escovas dentais e pedaços de pano complementam o material. Com este equipamento em mãos, você pode fazer o seguinte:

Passo nº 1 – Certifique-se de que a arma está descarregada.

Passo nº 2 – Desmonte a arma sobre uma mesa plana, limpa e desocupada de modo que possa observar todas as partes e trabalhar com cada item de cada vez. Se você esqueceu como desmontar sua arma, pergunte ao colega instrutor de tiro ou leia o manual de instruções. Após a desmontagem, você terá cinco componentes sobre a mesa (o cano, o ferrolho, o conjunto da mola recuperadora, a armação e o carregador).

Passo nº 3 – Dependendo do nível de sujeira (chumbo e pólvora) grudada no cano, passe um pouco de solvente no interior do mesmo usando um pedaço de tecido. Depois, passe outro pedaço de tecido limpo para retirar o excesso de solvente. Introduza a vareta no cano (a partir da câmara até a boca) e a movimente para frente e para trás no sentido da rotação das raias. Utilize primeiro a vareta de cerdas de latão e depois a de nylon. Continue a passar um tecido limpo até que o cano esteja limpo. Se só houver poeira, dispense o solvente e limpe o interior do cano apenas com a vareta de nylon. Limpe a rampa de alimentação e a câmara até que não haja impurezas. Não lubrifique o interior do cano após a limpeza. Não use escova com cerdas de aço.

Passo nº 4 – Limpe o ferrolho com a escova dental e um pedaço de pano levemente embebido em solvente até remover qualquer depósito de pólvora visível e resistente. Use a flanela para retirar as impressões digitais e qualquer vestígio de óleo/solvente que existir. Lubrifique apenas as partes indicadas no manual de instruções usando uma ligeira camada de óleo.

Passo nº 5 – Use a escova dental e um pedaço de pano levemente embebido em solvente para retirar resíduos de pólvora resistentes encontrados na armação. Na ausência destes resíduos, dispense o solvente e apenas escove a armação para retirar a poeira.

Passo nº 6 – Limpe os carregadores com a escova dental. Se for preciso limpá-los por dentro, desmonte-os observando a posição das peças. Utilize a escova ou a haste de cerda de nylon até remover todos os sinais de sujeira. Remonte os carregadores. Não use óleo ou sprays.
Passo nº 7 – Remonte a arma, evitando o excesso de óleo em qualquer componente. Não use grafite. Não use desengraxantes.

Passo nº 8 – Limpe o kit de limpeza de vez em quando.

Talvez você gaste 15 minutos, e por ser um procedimento tão simples e rápido não há desculpa para não colocá-lo em prática pelo menos uma vez por mês.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Por que evitar o perigo é a melhor estratégia?

“O Policial Civil L. foi encontrado morto em Sobradinho/DF com um tiro no coração. A vítima estava em serviço, sozinho, em uma viatura descaracterizada. Houve tentativa de reação por parte do policial, que estava com a arma na mão. Como ele estava em serviço, existe a hipótese de que tenha recebido um chamado de um informante e sido vítima de uma emboscada. L.C. era um policial antigo, experiente, atleta e fazia um excelente trabalho. Ele era um ótimo policial, investigador e linha de frente.” (Tribuna do Brasil, 09/10/2009).

“O Policial F. foi morto com sete tiros na madrugada desta quinta-feira. Segundo a polícia, ele teria reagido a um assalto, sendo assassinado com sua própria arma.” (Portal ORM, 08/10/2009). “Elas são garotas de programa e atraíram a vítima. Elas entraram em contato com os assaltantes e eles já estavam à espera do carro, mas não sabiam que ele era policial. As meninas são responsáveis por fazer a ‘casinha’ para atrair as vítimas até o canal, onde posteriormente são abordadas pelos assaltantes. Para disfarçar, as garotas fingem que são vítimas.” (Portal Gterra, 09/10/2009).

Logo após saber sobre os terríveis assassinatos desses policiais, o primeiro em Brasília/DF e o outro em Belém/PA, um colega disse transtornado: “Eles só morreram porque eram policiais!” Mas embora esta afirmativa seja verdadeira em muitos casos de homicídios de policiais, é preciso perceber outro elemento importante nas ocorrências.

Esse outro elemento se combina com a escolha profissional para formar a razão principal pela qual policiais acabam envolvidos em ocorrências perigosas e violentas. E então só é preciso uma fração de segundo para que você seja arrastado para uma situação além do seu controle. E o estrago que você vai sofrer como resultado da violência irá durar a vida toda, de um jeito ou de outro.

A violência é uma situação extrema, e as regras convencionais não se aplicam em situações desse tipo. As prioridades do cotidiano e os conceitos de civilidade que você possui não se aplicam. O importante é reconhecer quando você está se comportando de maneira arriscada para que saiba quando seu modo de vida não é suficiente para mantê-lo protegido. Para estar a salvo, você deve estabelecer uma prioridade maior em relação à sua conduta cotidiana: sua segurança.

Assim, ostentação, vaidade, despreocupação, orgulho, preguiça, falta de tempo, EXCESSO DE AUTOCONFIANÇA e BOEMIA parecem muito importantes até que você esteja diante do cano de uma arma.

Mas se você nunca se viu diante dos horrores da violência, as chances estão contra você reconhecer os sinais de perigo. E sem conhecer sinais óbvios, são boas as chances de que você continue agindo na sua forma habitual. Fazendo isso, você aumenta sua possibilidade de ser vitimado pelo crime e pela violência, pois não está efetivamente evitando o perigo.

Para muitas pessoas, inclusive policiais, a ideia do uso da força física é ao mesmo tempo terrível e repulsiva. Sabendo que muitos não desejam ou não querem usar a força física para se proteger, evitar o perigo se afastando de conflitos e de indivíduos perigosos (homens ou mulheres) é a razão principal para você utilizar o mecanismo da PREVENÇÃO. Estado de alerta, hábitos saudáveis, CONVÍVIO COM PESSOAS DISTINTAS EM AMBIENTES SELECIONADOS e TRABALHO EM DUPLA são estratégias muito mais compensadoras que o uso da força física ou letal. Lembre-se: sua primeira linha de defesa é a prevenção; depois a sua arma de fogo.

Para evitar ser vitimado, você deve ter certo grau de flexibilidade mental. Isso significa permitir a você mesmo fazer o que for necessário para vencer um combate, tanto quanto evitar o confronto violento sempre que possível.

Em resumo, toda vez que você sai de uma situação potencialmente violenta sem ser roubado, espancado ou assassinado, e sem usar a força física, já é uma vitória. E não importa como você evitou a situação.

Mas você está em perigo? A resposta é: DEPENDE. Risco é uma questão de graus. Seu risco aumenta ou diminui dependendo de sua atividade e comportamento.

Existem estilos de vida em que a violência é generalizada. Se você vive de certo modo ou ASSOCIADO A CERTOS TIPOS DE PESSOAS (como garotas de programa das periferias e informantes), seu grau de risco aumenta. Por exemplo, se você frequenta boates, botecos, áreas de prostituição, chega bêbado em casa, namora dentro do carro e se encontra sozinho com um informante numa estrada isolada, então sua chance de ser vitimado um dia é grande. Crime, violência e suas infelizes consequências são o resultado natural de modos particulares de pensamento e comportamento. Dessa maneira, não é uma questão de “se acontecer”, mas “quando”.

Enquanto pesquisadores tentam estabelecer razões sociais, fisiológicas e psicológicas para a criminalidade e a violência, está claro que pessoas violentas e delinquentes tendem a serem violentos. E isso é o que basta para você manter distância desses indivíduos!

Comportamento de risco consiste largamente em se envolver com pessoas ou situações perigosas. Essas situações conduzem você a estar próximo de pessoas predispostas a cometerem atos violentos. De um modo ou de outro, elas estão mais inclinadas a se tornarem violentas com as pessoas que conhecem ou que estão envolvidas com elas. Então, quanto menos você se envolve em certos tipos de comportamento, mais você reduz sua chance de ser selecionado como alvo de criminosos.

Se suas ações ou comportamento não o colocam em uma categoria de risco, então simplesmente seu bom senso pode reduzir a possibilidade de você se tornar uma vítima.

Contudo, se você está envolvido em uma conduta de alto risco, como policial sua arma pode até ajudá-lo em alguma coisa, mas não será suficiente para salvar você. Por quê? Porque é mais fácil fazer algo para evitar a violência do que se safar no meio de um confronto armado repentino e a curta distância.

Sua segurança SEMPRE deve estar em primeiro lugar!

domingo, 20 de setembro de 2009

Como você opera em ambientes com baixa luminosidade?

A qualidade da visão dos seres humanos muda pouco entre as pessoas com visão normal. No entanto, qualquer diferença para menos pode ser importante se algum suspeito possuir o mesmo treinamento e a mesma perspicácia que você. Por exemplo, se o suspeito possui uma acuidade visual de 20/20 (visão normal) e você uma de 20/29, então isto significa que seu oponente pode ver você a uma distância 14,5% maior do que você pode vê-lo. Esta diferença é considerável se você imaginar o pouco tempo disponível para reagir a uma agressão iminente, quando é desejável perceber a ameaça com antecedência.

Entretanto, o exemplo citado está fundamentado na Escala Optométrica de Snellen, que infelizmente só analisa a quantidade de visão, e não sua qualidade. Esse teste avalia sua capacidade de ver um objeto preto com extremidades regulares sobre um fundo branco, simulando uma condição de dia claro. E como fica o período noturno ou as situações com baixa luminosidade?

Bem, se você considerar que cerca de 80% de toda informação sensorial é percebida pelo sistema visual, então você deve compreender a importância da capacidade de enxergar bem em qualquer situação, principalmente quando há falta de uma iluminação consistente. Assim, o uso de uma boa lanterna é tão importante quanto à própria arma, porque se você não pode ver, também não pode se defender!

Já há certo avanço no treinamento policial brasileiro no qual se emprega algum tempo na utilização de uma ou outra técnica com lanterna em ambiente com baixa luminosidade. Técnicas com lanternas são importantes e precisam ser compreendidas, contudo, existe mais num ambiente mal iluminado do que simplesmente segurar uma lanterna.

O típico treinamento de tiro em ambiente mal iluminado consiste em aguardar o período noturno e alinhar os atiradores numa linha estática diante dos alvos. A seguir, os atiradores sacam as armas e as lanternas, e atiram nos alvos iluminados. Porém, a questão não é só aprender uma técnica de tiro nesta condição, mas saber como usar a lanterna e se comportar taticamente numa situação na qual o tiro só pode ser realizado depois de você encontrar um agressor potencial, o esconderijo onde ele pode estar e os objetos que ele pode usar para atacá-lo. Quer dizer, isso significa mais do simplesmente juntar a arma com uma lanterna para atirar no escuro.

Como nenhum policial é igual a outro e nenhuma técnica de uso de lanterna é a resposta definitiva para todas as situações com iluminação inconsistente, você precisar aprender e treinar diversas técnicas (Harries, Roger, FBI, Chapman, Ayoob, Marine Corps, Hargreave Lite-Touch, Keller, Neck Index, NYPD, Guisande e outras que surgirem) porque uma pode se adaptar melhor que outra à exigência da circunstância. Ao treinar técnicas variadas você também pode perceber qual delas se adapta melhor ao formato da sua mão e qual lanterna se acomoda melhor à técnica treinada.

Além disso, você precisa compreender de modo sucinto os aspectos fisiológicos e psicológicos que pode encontrar durante uma ação num ambiente mal iluminado. Mais uma vez, a compreensão desses fatores permite que você treine técnicas que funcionam em um ambiente particular e perceba suas limitações e vantagens. Estes são fatores que afetam qualquer pessoa que trabalha num local deste tipo.

Então, o que você precisa saber sobre o olho humano é que ele possui uma estrutura interna denominada retina. Ela recebe a luz que entra no olho e a transforma em estímulos elétricos, os quais são enviados ao cérebro por meio do nervo óptico. A retina possui dois tipos de células fotorreceptoras: os cones e os bastonetes. Os cones, no centro da retina, são responsáveis pela nitidez da imagem, pela riqueza de detalhes e pela distinção das cores. Mas na escuridão, os bastonetes, na periferia da retina, assumem o controle e permitem que você perceba tons de cinza, movimento e imagens com ângulos abrangentes, porém pouco detalhadas. Cones e bastonetes funcionam conjuntamente em todos os níveis de iluminação, mas cada um trabalha até seu limite possível. Infelizmente, os bastonetes não possuem uma resolução visual tão boa, mas são mais sensíveis à luz que os cones. Por isso, em ambientes com baixa luminosidade, sua visão passa a depender exclusivamente deles.

Nos bastonetes existe uma proteína chamada rodopsina, que é o elemento decisivo para a visão noturna. Quando a luz entra no olho humano e atinge a rodopsina, esta se decompõe em diversos compostos intermediários. Estes compostos produzem impulsos elétricos que são transmitidos ao cérebro e interpretados como luz. Finalmente, a rodopsina precisa se recompor para que o processo volte a ocorrer caso haja nova exposição à luz. Esta recomposição segue uma taxa constante e lenta. Então, quando você é exposto à luz intensa toda a rodopsina se decompõe, e ao apagar a luz e tentar ver novamente no escuro, você simplesmente não consegue. Como não há rodopsina, os bastonetes ficam inutilizados devido à fadiga química até que ocorra a recomposição da proteína entre 10 a 15 segundos.

Num teste empírico, coloquei um objeto sobre uma prateleira a um metro de distância. Depois que escureci totalmente o ambiente, direcionei o feixe de luz de uma lanterna convencional para olhos até sentir um desconforto. Desliguei a lanterna, e imediatamente cronometrei o tempo necessário para que, no escuro, eu pudesse perceber o contorno daquele objeto sobre a prateleira. Tempo: 19 segundos. Agora, imagine isso sendo feito com uma lanterna tática de 240 lúmens.

Assim, outro objetivo da lanterna é provocar essa fadiga química por meio do ofuscamento da visão para causar distrações (desatenção, descuido), perturbações (desordem, confusão) e cegueira momentânea. Como a adaptação completa da visão às mudanças de luminosidade é um processo gradual que começa a partir do pôr-do-sol e leva aproximadamente 30 minutos, qualquer exposição à luz intensa, mesmo por dois segundos, força o reinício de todo o processo de adaptação.

O inverso segue a mesma dinâmica, ou seja, se você passa imediatamente de um ambiente iluminado para outro escuro, você fica praticamente cego por alguns instantes até que ocorra a adaptação. Você ainda perde a capacidade para estimar distâncias e identificar objetos. Novamente, a lanterna impede que você fique completamente cego devido ao pouco tempo disponível para a adaptação em um ambiente mal iluminado durante uma operação policial; o que é outra vantagem tática.

Além disso, é importante saber que sua visão noturna se deteriora conforme você envelhece, e logo, a quantidade de luz que você precisa em um ambiente mal iluminado é maior com a idade. Isso significa que um criminoso mais jovem enxerga melhor que você nessa situação.

De qualquer forma, é possível afirmar que ninguém enxerga muito bem no escuro. Por isso, seu cérebro tentará preencher as lacunas deixadas por aquilo que seus olhos não conseguem ver. É quando você “enxerga” aquilo que não existe. Isto se torna mais difícil de gerenciar em situações estressantes típicas das operações policiais.

Uma forma de compensar os efeitos das condições de baixa luminosidade é manter a mente focada no objetivo e no seu comportamento durante a ação, mas deixando sua lanterna ligada o suficiente para você identificar o que está vendo antes de assumir o que é ou não uma ameaça letal. De novo, treinos com lanternas não precisam incluir, invariavelmente, o disparo da arma. Aqui, o que você precisa saber é como manobrar sua lanterna (para enxergar melhor) e sua arma (para estar preparado para uma eventualidade) numa situação de busca.

Mas nos treinamentos, os policiais raramente utilizam algum tempo para realizar a identificação do alvo. Eles falham na identificação de um alvo que não pode ser considerado uma ameaça daquele que pode ser. E então, os policiais sempre atiram!

Se você se movimenta, domina o local e identifica o suspeito, então sua lanterna se torna uma opção no uso progressivo da força por causar cegueira momentânea, confusão e receio no suspeito. Um benefício em relação à força letal.

Portanto, imagine que você pode dominar alguém por 10, 15 ou 19 segundos usando apenas a luz da sua lanterna tática, reduzindo a capacidade do indivíduo em vê-lo claramente e estabelecer qualquer tipo de tentativa de ataque ou fuga enquanto você se aproxima.

Temporariamente cego, o suspeito não pode identificar você, determinar se você está sozinho, procurar uma rota de fuga, localizar uma proteção ou uma arma. Então, existe alguma vantagem em colocar um suspeito em uma situação na qual ele precisa de algum tempo para restabelecer a acuidade visual? Claro que sim, e isso é uma vantagem tática diferente de simplesmente atirar com uma arma e uma lanterna.

Se você tem uma lanterna tática de qualidade e sabe como usá-la, você estará em vantagem toda vez que entrar num local mal iluminado. Você saberá o que fazer quando o corredor a ser observado vira para a esquerda ou para a direita; qual técnica deve ser utilizada para uma busca e qual deve ser usada durante o tiro; saberá como se comportar quando outro policial estiver junto com você de modo que o potencial das duas lanternas seja somado para aumentar a vantagem tática, ao invés de um policial iluminar diretamente o outro ou marcar sua silhueta iluminando suas costas; saberá aproveitar a escuridão de modo a ver sem ser visto; saberá quando a luz que entra pela porta ou a própria lanterna está criando uma iluminação indireta no local; saberá como se mover no local e que técnica usar nas várias situações de um mesmo ambiente com baixa luminosidade. Não é preciso dizer que para isso você precisa receber treinamento adequado, ter um equipamento de qualidade e ser confiante para aplicar as técnicas.

Uma das coisas mais importantes que você pode fazer para melhorar sua sobrevivência no trabalho policial é compreender como operar em um ambiente com baixa luminosidade. Você pode ter a lanterna, mas ainda precisa do conhecimento para controlar o ambiente. Você precisa desenvolver o conhecimento, a ferramenta, as técnicas e táticas comportamentais para dominar a escuridão ao invés de simplesmente atirar com uma arma numa mão e a lanterna na outra.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Por que você quer viver?

Não existe um policial sequer que não queira voltar para casa são e salvo depois de um dia de trabalho. E não importa se você é policial federal, rodoviário, civil ou militar; se é policial operacional ou administrador, investigador ou corregedor, aviador ou patrulheiro. A verdade é que todos querem vencer qualquer confronto de vida ou morte que possa surgir.

Também é verdade que aqueles que já lutaram pela própria vida não tiveram tempo ao menos para piscar, e o que dizer então sobre a capacidade de reflexão. Mas como todo treinamento deve começar com o desenvolvimento de uma mente orientada para a vitória e para a superação de obstáculos, uma pergunta torna-se fundamental. E a resposta a esta questão jamais pode ser esquecida ao longo da sua jornada contra o crime e a violência.

Você já pensou sobre o que o motiva para continuar a salvo? O quê alimenta sua vontade de viver?

É da natureza do ser humano fugir ao menor sinal de perigo, e ainda assim você escolheu uma profissão na qual se sente compelido a correr em direção aos tiros, apartar brigas alheias em bares durante as madrugadas, abordar pessoas sem saber o que vai encontrar ou trabalhar em custódias sabendo que cada dia de trabalho será ao lado de criminosos profissionais. Apesar das estatísticas precárias, você sabe que pelo menos 490* colegas policiais serão mortos até a metade de cada ano e que você não vai ficar rico fazendo isso. Mas mesmo assim você volta para o trabalho todos os dias na esperança de ser o vencedor de cada conflito.

Nas aulas de sobrevivência policial da academia de polícia, os professores terminam a apresentação dizendo que “Hoje pode ser mais um dia normal na sua vida, ou pode ser o dia em que você será testado sobre tudo o que aprendeu.” Eles não querem que você apenas resista aos encontros mortais. Eles querem que você VENÇA (física, emocional, espiritual e legalmente)! De fato, os professores trabalham muito para conduzir e manter cada futuro policial neste estado mental de vencedor ao longo do curso. Já no primeiro minuto eles mostram uma fotografia dramática de um policial que não venceu e que foi morto em um encontro cruel e sem sentido com criminosos. E então eles prosseguem dizendo: “Prepare-se”.

Mas agora é hora de pensar seriamente no seu próprio motivo para vencer. Você precisa descobrir aquilo que vai lhe deixar mais alerta, mais forte, capaz e orientado para triunfar diante do perigo que ronda sua profissão. Ou seja, o que motiva você quando as coisas saem do controle?

Para o Agente M. A. L. a ideia de não poder presenciar a formatura dos filhos e a lembrança de que seu próprio pai não esteve presente em sua formatura no passado fizeram com que ele reagisse durante um assalto. Ele descarregou sua arma contra dois criminosos que tentavam roubar seu carro e enquanto recebia uma chuva de balas numa luta de vida ou morte. A distância entre eles era de aproximadamente 2,5 m. O policial atingiu três vezes um dos criminosos e conseguiu voltar para casa ileso. (Belo Horizonte/MG).

Já para o Agente G. A. M. estar no banco do motorista enquanto um assaltante armado, também dentro do carro e no assento de trás, apontava uma arma para sua filha de 12 anos era algo inconcebível. Foi esse pensamento combinado com a raiva que ele canalizou como motivação para disparar sua arma e acertar três dos cinco tiros no criminoso que morreu logo depois. No dia seguinte o policial pôde como ele mesmo disse “... beijar minha filha e educá-la para um país melhor, onde o bem vencerá o mal.” (São José do Rio Preto/SP).

Mesmo enquanto estava imóvel e caído dentro de um ônibus, com pouca chance de sobreviver ao tiro à queima roupa que recebeu na nuca depois de reagir a um assalto e matar um dos criminosos, o Delegado E. G. A. tirou forças da sua crença para dizer a si mesmo que sua hora não havia chegado e sair andando do hospital algum tempo após a ocorrência. (Rio de Janeiro/RJ).

Para outro Policial, vítima de sequestro-relâmpago, foi a ameaça de morte feita pelo delinquente que descobriu sua carteira funcional que despertou seu desejo de continuar vivo. Os dois assaltantes foram mortos, mas a última frase de um deles foi “Ele é polícia, vamos levar pra BR e matar”. Certamente ser encontrado morto e jogado num matagal ao longo de uma rodovia não estava no plano do policial. Ele conseguiu acertar todos os cinco tiros disponíveis em seu revólver snub. Talvez ele tenha jurado não morrer de modo tão deprimente. E ele não morreu! (Goiânia/GO).

O Policial G. S. B. F. utilizou sua habilidade de instrutor de tiro para desarmar um homem que apontava um revólver para ele num posto de gasolina. O policial concentrou sua força mental e física a ponto de ver o tambor da arma iniciando seu giro. Ele agarrou a arma, e depois de lutar com o indivíduo, conseguiu tirá-la dele. O policial venceu o confronto porque ele conscientemente treinou para vencer. (Brasília/DF).

E você, já pensou sobre o que o motiva a vencer? O que força você a seguir em frente? Isso é algo que você deve descobrir e treinar mentalmente, e é algo que pode mudar completamente sua carreira policial e sua vida.

A primeira vez que eu achei que ia morrer, eu fui motivado simplesmente pelo egoísmo e pelo orgulho. Eu tinha acabado de comprar uma Glock, a menina dos olhos de qualquer policial na época, e não podia deixar aquele assaltante tomá-la de mim. A arma era minha, e eu precisava ter certeza de que ninguém mais tocaria nela. Além disso, que explicação eu daria aos meus colegas se eu falhasse. Mas isso foi em 1998. Agora eu tenho uma família e são eles que me motivam a vencer, afinal não deve ser bom acordar sabendo que o pai que eles amam não existe mais.

Minha família também é a razão para eu melhorar meu estado de alerta, meus estudos, minha capacidade física, minha confiança e minhas habilidades. Eu preciso vencer os incidentes que encontrar para que a nossa vida siga seu rumo natural.

Então, pense bem sobre o que quer que motive você. Visualize mentalmente uma situação perigosa e hipotética. Lembre-se da sua motivação e treine para que isso faça você melhorar, lutar com todas as forças até o fim e seguir em frente não importando o que aconteça.

Vencer não significa apenas não ser morto, mas também significa vencer o resultado de cada incidente crítico tanto física quanto emocionalmente. Significa saber o que é importante e quem é importante na sua vida.

Se você tem alguma resposta para a frase “Por que você quer viver?”, me diga e comente com seus colegas o que motiva ou motivou sua vitória. Afinal, nesta atividade os policiais aprendem melhor uns com os outros.

*Fonte: Ministério da Justiça. Secretaria Nacional de Segurança Pública. Departamento de Pesquisa, Análise de Informação e Desenvolvimento de Pessoal em Segurança Pública. Pesquisa Perfil Organizacional das Polícias Civis e Militares. 2005. Não contém dados das PC dos Estados de SP, BA, PB, PI, RO e SC. Não contém dados das PM dos Estados de AM, DF, ES, PA, PB, PI e SP.


terça-feira, 9 de junho de 2009

A arma disparou, mas foi sem querer querendo!

Numa reserva de armamento, o policial encarregado vê uma submetralhadora HK MP5 sem o carregador e com o ferrolho aberto. O policial, presumindo que a arma está descarregada, libera a alavanca de manejo (Ei! Você examinou a câmara?), destrava a arma, pressiona o gatilho, e BANG!

Durante uma operação, outro policial entra na viatura, aponta um fuzil HK G36 para o assoalho. Para conferir se a arma está carregada, ele destrava a arma (Epa! Você tem certeza de que vai fazer isso aqui dentro?), aperta o gatilho, e POW!

Em outra reserva de armas, policiais chegam de uma atividade e decidem devolver as pistolas recém compradas pela organização policial. O encarregado recebe cada pistola, pergunta ao usuário se a arma está alimentada, retira o carregador, manobra o ferrolho, aponta para uma direção segura e aperta o gatilho. Como as armas são novas, uma pequena camada de óleo fica impregnada nas mãos do encarregado. Lá pela vigésima arma recebida e com os ferrolhos já escorregando pelas mãos, o policial continua sua rotina: recebe, pergunta, retira, manobra e aperta. BUMM! Um projétil fura uma bancada, uma mesa e se estilhaça no piso. Ops! Eu acho que o ferrolho não foi totalmente à retaguarda!

Num treinamento de tiro, o instrutor faz recomendações sobre a segurança e a conduta no estande. Um policial chega apressado e se une ao grupo para as instruções. Ao se lembrar de que a arma está carregada, ele manobra o ferrolho (Opa! O carregador continua na arma!), aponta para os pés do instrutor e pressiona o gatilho. BAM! Na iminência da lambança, o instrutor se afasta evitando ser atingido pelo projétil que perfura o piso.

BANG, POW, BUMM e BAM são onomatopeias que imitam o som de um disparo de arma de fogo. Infelizmente, os eventos narrados ocorreram de fato e representam algumas das situações que envolveram disparos acidentais. Portanto, um disparo acidental é um evento no qual uma arma de fogo é disparada num momento não esperado pelo usuário.

Com as armas atuais, o disparo acidental mais comum ocorre quando o gatilho é intencionalmente acionado com um propósito diferente de quando se está num tiroteio. E isto ocorre durante os acionamentos em seco, nas inspeções do armamento, nas demonstrações ou testes de funcionamento, mas quando um cartucho está, inadvertidamente, na câmara da arma. Em muitos casos, pode-se dizer que os disparos são acidentais. Mas em outros episódios, os tiros inesperados são pura imprudência. Ou seja, para saber se uma arma está carregada ou não, o policial simplesmente aperta o gatilho. É como se você quisesse testar o airbag batendo violentamente seu carro contra um poste.

Apesar da aparência de que disparos acidentais ocorrem somente com atiradores mal treinados, a existência de uma arma sem o carregador pode sugerir pelo aspecto que ela está descarregada, mesmo que tenha um cartucho na câmara. Esta sugestão perigosa também pode acontecer quando armas carregadas/alimentadas são deixadas displicentemente em qualquer lugar.

Um disparo acidental também pode ocorrer quando o policial coloca o dedo indicador sobre o gatilho antes de ter decido atirar. Com o dedo posicionado desta forma, muitas coisas podem fazer com que o dedo pressione o gatilho de modo não intencional. Por exemplo, se o policial coldrear a arma com o dedo no gatilho, um tiro acidental é bem provável; se ele tropeçar, cair ou se atracar com um suspeito, o instinto de contrair os músculos de uma mão para segurar o suspeito pode provocar um tiro acidental, uma vez que os músculos da mão que empunha a arma também serão contraídos (reflexo intermembros).

As regras básicas de segurança reconhecem estas possibilidades e existem para prevení-las. De todas as regras, o controle do cano e do dedo do gatilho são as mais importantes. Assim, sempre mantenha sua arma apontada para uma direção segura de modo que um disparo acidental não mate alguém (atenção aos ricochetes ou fragmentos de projéteis). Segundo, nunca coloque o dedo no gatilho a menos que você esteja atirando intencionalmente. Mesmo que você esteja diante de um suspeito e talvez precise atirar, manter o dedo fora do gatilho previne que a resposta motora involuntária causada por um susto, uma pancada, um solavanco ou desequilíbrio faça com que seu dedo se contraia disparando um tiro em alguém que já se rendeu – como infelizmente já ocorreu quando um policial bateu com a coronha da pistola no pescoço de um torcedor de futebol.

“Tal morte desnecessária pode deixar você emocionalmente perturbado, financeiramente empobrecido e fisicamente preso!”, é como resume Massad Ayoob, instrutor de tiro e autodefesa.

Portanto, não importa como você chama cada projétil que sai da sua arma sem querer (acidental, involuntário, negligente, imprudente, fortuito ou não intencional), pois o resultado disso pode ser mortal e transformar sua vida num inferno. Assim, aprenda a lidar e treine com as armas da sua organização policial, mesmo que você imagine que jamais precise usá-las. E nunca acredite em alguém que lhe diz que sua arma está descarregada.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Entre atirar ou morrer!

Em 19 de janeiro de 2009, quatro Policiais foram designados para cumprir mandados de prisão e de busca e apreensão na residência de traficantes de drogas numa cidade mineira.

Eram 6 h da manhã quando a equipe chegou ao local e se dividiu em duplas; dois Policiais entraram pela porta principal da casa e os outros dois seguiram por um corredor lateral até os fundos do lote, cercando o lugar. Um muro de concreto pré-moldado dividia a porta principal daquele corredor; por isso, tão logo as duplas se posicionaram para a entrada, elas ficaram definitivamente separadas.

De repente, a dupla que entrou pelo corredor foi surpreendida por dois indivíduos fisicamente poderosos, resistentes, ágeis, autoconfiantes, altamente inteligentes, capazes de tolerar a dor e com vontade de lutar até o fim. Se isso não bastasse, estes indivíduos carregavam uma herança genética herdada de seus ancestrais que atacavam touros, ursos, cavalos e outros cães em eventos medievais denominados Bull Baiting.

A agilidade desses indivíduos é considerada tão grande que eles são capazes de transpor muros e usar os dentes para escalar cercas de proteção. Quando estão nas ruas, eles devem usar focinheiras, enforcadores ou coleiras resistentes, sendo conduzidos com guias curtas e por pessoas com força física suficiente para contê-los no caso de ficarem violentos.

Local do incidente.Então, ao ver os cães da raça Pit Bull “voando” em sua direção, o Policial A pensou em voltar. Mas, ele percebeu que não teria tempo, e que se fizesse isso, o Policial B ficaria sozinho com os dois cães ferozes. Os Policiais iniciaram os disparos contra os cães agressores, e com os estampidos, o Pit Bull A fugiu, mas o Pit Bull B continuou sua investida até ser incapacitado e tombar a aproximadamente 1,5 m dos Policiais.

Quando caiu, o Pit Bull B ainda estava vivo apesar de ter sido atingido duas vezes no tórax e uma vez na cabeça, numa espécie de Mozambique Drill canino. O Policial A havia disparado oito tiros, enquanto o policial B quatro vezes. Portanto, dos 12 disparos somente três acertaram o alvo, gerando um percentual de aproveitamento de 25%. O Policial A percebeu que em dado momento o animal perdeu o controle motor das patas traseiras e tentou alcançar os Policiais usando as patas dianteiras, mas logo depois tombou e parou. Só então, a dupla prosseguiu até o quintal da residência onde rendeu alguns dos alvos da operação.

Um mês depois foi protocolada na Delegacia de Polícia uma requisição de instauração de Inquérito Policial para apurar possível ocorrência do crime de abuso de autoridade praticada pelos dois Policiais. A requisição foi baseada nas declarações prestadas por uma parenta dos traficantes presos e que era a proprietária dos cães agressores. Ela declarou que os Policiais, sem mandado de busca, chegaram portando armas de fogo de grosso calibre, fazendo vários disparos, inclusive matando um dos três cachorros, sendo morto um cão de pequeno porte. Se o requisitante estivesse do lado dos Policiais vivenciando tal experiência, talvez esta requisição jamais existisse.

Então, vejamos! Especialistas informam que a velocidade que um cão pode atingir depende da idade, do condicionamento físico, do gênero (macho ou fêmea), e também da motivação para correr. Cães desenvolvidos para rinhas não costumam defender seus territórios, mas atacam em função da herança genética. Portanto, não é preciso grande motivação para que um Pit Bull corra em sua direção, ainda mais se você estiver na casa dele. Desse modo, a velocidade que um Pit Bull pode atingir gira em torno de 40 a 48 km/h, isso dá cerca de 11 a 13 m/s.

Quando os Policiais perceberam a iminência do ataque, deu-se início à reação de sobrevivência (luta, fuga ou obediência), e devido às alterações fisiológicas e de comportamento cada um percebeu o tempo e a distância de modo particular. O Policial A estimou em aproximadamente 7 m a distância entre ele e os cães. Já o Policial B percebeu uma distância de 15 m. Uma análise no local do incidente revelou uma distância de quase 12 metros.

Imaginando que os cães estivessem correndo a uma velocidade de 12 m/s, e considerando uma distância de 20 metros, quanto tempo eles teriam para reagir até que os animais os alcançassem? Um segundo e sessenta e seis centésimos (1,66 s). Entretanto, um Policial comum com uma pistola, disparando o mais rápido possível, gasta 31 centésimos de segundo para disparar o primeiro tiro depois de ter percebido uma ameaça. Agora, diminua 0,31 s de 1,66 s, e você terá o tempo disponível para salvar sua vida se algum dia você vivenciar uma situação semelhante à enfrentada por estes dois Policiais, ou seja, 1,35 s. Bem otimista, não é mesmo?

Contudo, eles estavam a 15 m dos cães, de acordo com a percepção do Policial B. Assim, o Pit Bull sobrevivente correndo a 12 m/s cobriria estes 15 m em 1,25 s. Um segundo e vinte e cinco centésimos menos 0,31 s, dá 0,94 s. Agora, faça as contas para a distância de 12 m. Resultado: 0,69 s.

O Policial A atirou o mais rápido que pode com sua pistola (8 tiros), o Policial B, também com uma pistola, disparou tentando acertar (4 tiros), e apesar de nenhum deles saber quem acertou o cão, ambos sabem onde foram parar os tiros que erraram o animal (dentro da igreja vizinha dos fundos). Quem sabe, na sua próxima operação policial, você não leve aquela “velha” espingarda calibre 12!

Porém, há outro detalhe neste incidente: a perspectiva visual. Isto significa que um objeto distante parece ser menor do que um objeto mais próximo, mesmo que eles tenham o mesmo tamanho. Criadores de Pit Bulls informam que a altura da raça é de 51 cm (da cernelha ao solo, ou seja, da omoplata e as partes moles que a revestem até o chão), mas não ultrapassa os 58 cm. Então, os Policiais empunhando suas armas com os braços esticados perceberiam (na massa de mira e na posição de pé) a altura do Pit Bull B da seguinte forma: o animal a 15 m de distância pareceria ter 2,2* cm de altura; a 12 m de distância, o cachorro pareceria ter 2,7* cm de altura; a 10 m o cão teria 3,4* cm; e a 7 m ele teria 4,7* cm. Só para constar, outro Policial recomendou atirar de joelhos em situações assim!

Portanto, pense como seria atirar em algo tão pequeno se movendo rápido o suficiente para lhe alcançar em apenas um segundo. Agora, imagine o recuo da arma elevando cada vez mais o cano durante os tiros sequenciais enquanto você tenta mirar/atirar cada vez mais baixo porque o cão está se aproximando. Como seria se você simplesmente esperasse para ser atacado? Como seria ver essa fera saltando sobre você para morder com toda a força seu rosto, sua cabeça ou seu pescoço? Será que seu colega conseguiria se safar para ajudar você? Você conseguiria ajudar seu colega? Será que no meio dessa confusão, os Policiais não atirariam um no outro sem querer na tentativa de acertar o cachorro?

Infelizmente, no trabalho policial você precisa solucionar problemas violentos num piscar de olhos. Se você falhar, isso pode custar a sua vida; se você sobreviver, talvez custe sua paz de espírito, e se depender de algumas pessoas talvez custe algo mais. Portanto, aqueles que não estão presentes quando o pior acontece e não compreendem as dinâmicas e as dificuldades do trabalho policial jamais deveriam avaliar ou julgar as atitudes legítimas de autodefesa policial que ocorrem numa fração de segundo. E quando você deixar a delegacia para cumprir mandados na residência de alguém, vá preparado e sempre acredite naquela placa que diz “CÃO BRAVO”!

*Medidas aproximadas.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Uma escovadela aqui e um tiro ali!

As armas de fogo são objetos fascinantes. No mundo inteiro, os fabricantes de armas mantêm laboratórios de pesquisa nos quais engenheiros habilidosos aplicam conhecimentos de química, física, matemática, biologia, metalurgia, dentre outras áreas da ciência humana para desenvolver e fabricar seus produtos.

O resultado disso tudo, geralmente, é tão bom que não existe no mundo um exército ou organização policial que não use armas de fogo na defesa do seu território e na proteção da sociedade. Imagine você que até criminosos e terroristas fazem uso delas também!

Por isso, os fabricantes de armas sabem que quando seus clientes apertarem o gatilho, pessoas serão feridas ou mortas. E como não produzem armas para criminosos, essas empresas esperam que você sobreviva ao confronto de vida ou morte que venha a encontrar ao longo da carreira. Assim, essas fábricas projetam, produzem, testam, embalam e entregam a sua arma com certificado de garantia, manual e carregadores avulsos numa maleta acolchoada. E surpresa, as melhores marcas também entregam uma escovinha para limpeza do cano.

Mas, e daí? Bem, e daí que você recebe a arma, municia, põe na cintura e esquece! Quer dizer, sua arma fica no coldre por semanas a fio. “E daí?” E daí que com o passar dos dias sua arma vai sendo contaminada pela poeira e pelas fibras da sua roupa.

Dessa maneira, e com o tempo, essa sujeira pode impedir o funcionamento do armamento, porque ao entrarem na arma, os fiapos de roupa se acumulam na câmara do cano, e o ferrolho não consegue inserir correta ou completamente o cartucho nessa câmara, o que impede o disparo. Este tipo de incidente é chamado de “alimentação incompleta”, e apesar dessa pane ter um nome, infelizmente não tem solução imediata – a não ser que você limpe a arma.

Pode até ser que você consiga realizar alguns disparos, mas eu garanto que cedo ou tarde sua arma irá falhar, quer você acredite ou não. Então, reze para que não seja enquanto você tenta realizar o primeiro tiro.

Para ilustrar o problema, conto o caso de um Policial que realizou 274 tiros em 6 horas de treinamento. Ao longo do treino, esse Policial foi surpreendido sete vezes pelo mesmo tipo de pane, ou seja, alimentação incompleta. Intrigado com a ocorrência que acometeu um dos melhores atiradores da delegacia, pedi que ele desmontasse a pistola. Ao verificar o cano, percebi um grande acúmulo de sujeira e fibras têxteis. Incrivelmente, esse Policial havia treinado com a mesma arma 15 dias antes e sem qualquer problema. Portanto, este foi o tempo necessário para um instrumento sofisticado de autodefesa – desenvolvido para salvar a vida do Policial – se transformar numa peça inconfiável. Mas isso não foi por falha da arma, foi por culpa do Policial!
Alimentação incompleta.

Então, vale a pena relembrar que a Lei de Murphy é uma constante no trabalho policial. E com tantas variáveis que podem dar errado numa troca de tiros, você não pode criar mais uma oportunidade para o fracasso, se permitindo sair de casa sem ter feito algo tão simples e rápido como limpar sua arma. Você não precisa se sentir obrigado a limpar seu armamento todos os dias a ponto dessa tarefa se tornar um fardo, mas você deve se responsabilizar pela manutenção da arma que usa pelo menos quinzenalmente, dependendo do clima da cidade, da forma como porta sua arma e do uso que tenha feito dela.

Limpar sua arma tem outra vantagem: permite que você se mantenha atualizado com as peças e o funcionamento do único instrumento de trabalho que torna sua profissão distinta de todas as outras. E é sempre bom saber como essas coisas funcionam!

Se sua arma falhar devido à sujeira durante um treinamento, vá lá! Basta limpá-la e voltar ao treino. Mas, se isso ocorrer no início ou no meio de um confronto real, você pode dizer adeus!

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Quanto vale a sua vida? Pergunte a quem te ama!

Recentemente, um policial me perguntou qual é a melhor maneira para se portar uma arma de fogo quando se está à paisana: se na pochete ou a tiracolo.

Bem, isso depende de quanto dinheiro você está disposto a investir.

Se você possui um plano de assistência funerária, sua família não terá nenhuma despesa com seu enterro, pois você já pagou a despesa antecipadamente, que, diga-se de passagem, pode variar de R$ 1.450,00 (plano simples) a R$ 17.280,00 (plano luxuoso).

Porém, sem um plano funeral os custos ainda podem ser altos. Um funeral simples pode ser feito por apenas R$ 300,00. Mas, se seus familiares desejarem algo melhor pra você, os gastos podem chegar a R$ 7.480,00. Nos dois casos estão incluídos a remoção, a limpeza e tamponamento do seu corpo; o caixão, flores, véu, velas, castiçais e a coroa. O que muda é o tipo de material usado, podendo ser o mais simples ou o mais aprimorado e moderno.

Para realizar o velório numa capela de um cemitério, sua família precisa pagar uma taxa de R$ 50,00. Se você já possui um túmulo, “ótimo”! Entretanto, para comprar o jazigo, talvez alguém tenha que gastar R$ 600,00 por um jazigo simples ou R$ 1.500,00 por um duplo. A maioria das pessoas provavelmente escolhe comprar o jazigo simples.

O mármore ou granito que revestirá seu túmulo pode custar de R$ 1.700,00 a R$ 4.000,00, dependendo do tipo de material e o modelo da lápide. E ainda tem o padre e a missa de sétimo dia...

Então, serão utilizados ao menos R$ 2.650,00 no seu enterro, considerando R$ 300,00 pelo funeral simples, R$ 50,00 pela capela, R$ 600,00 pelo jazigo simples e R$ 1.700,00 pela lápide simples.

Agora, do mesmo modo que seus familiares podem escolher entre um funeral simples ou aprimorado, você também pode escolher um coldre molambento, uma pochete “saque rápido” ou pode comprar um coldre importado de polímero por R$ 99,00 e um porta-carregador duplo também por R$ 99,00. No total, isso vai lhe custar R$ 198,00, quer dizer, bem mais barato que seu enterro. E não adianta comparar com o seu salário, pois ainda assim é mais barato!

Armas não combinam com pochetes ou bolsas a tiracolo. E o motivo é simples: se você for pego de surpresa, o que você acha que o assaltante vai tomar de você primeiro? Ele vai tomar sua bolsa, sua pochete, e depois as outras coisas. Então, num piscar de olhos você vai perder a única ferramenta capaz de te dar alguma chance para salvar sua vida.

E o pior, se o criminoso for um assassino nato, e se ele perceber que sua pochete ou bolsa está mais pesada do que o normal, talvez ele a abra. Se ele fizer isso, talvez atire em você simplesmente porque encontrou sua arma, mesmo que você já esteja rezando e implorando por sua vida.

Arma de fogo deve ser portada num coldre de qualidade e na cintura. O investimento parece caro, cerca de R$ 200,00, para um bom coldre de polímero. Contudo, ainda é mais barato que sua arma, muito mais barato que seu funeral, e sem comparação com a falta que você vai fazer para sua família.

Mas o que você precisa fazer para portar uma arma no coldre sem que pareça estar armado? Comprar camisas mais largas ainda, experimentá-las no vestiário da loja com a arma no coldre e na cintura. Simples assim!

Lembre-se, você não está num desfile de moda. Você está na polícia!

domingo, 5 de abril de 2009

Sua rotina pode ser mortal!

Imagine que você participou de um treinamento de autodefesa policial que incluiu estatísticas sobre policiais mortos, histórias terríveis sobre violência, e talvez um ou dois assassinatos gravados por circuitos de TV.

Você terminou o curso impressionado com o potencial de ser a próxima vítima do crime e da violência mesmo sendo um policial. Então, você fica alerta, consciente, observa as redondezas, sendo mais cauteloso sobre pessoas que considera potencialmente suspeitas. Mas, quantos dias você acha que isso vai durar?

Com o tempo, a ausência de consequências perigosas reais faz você relaxar. E apesar de você estar interessado na sua segurança e possuir o conhecimento do que deve ser feito, você não consegue agir adequadamente. Suas habilidades de sobrevivência, seu estado de alerta logo começam a desaparecer. Por quê?

Porque o cérebro está orientado para automatizar comportamentos repetitivos, pois é a maneira como os seres vivos trabalham. Muito do comportamento humano diário é automatizado, e isso acontece sem você perceber.

Psicólogos estimam que mais de 90% desse comportamento humano diário ocorre sem consciência ou pensamento deliberado. Atividades repetitivas tornam-se ações automáticas para liberar sua atenção para coisas que são novas, desconhecidas ou ameaçadoras. Se não fosse dessa maneira sua mente ficaria sobrecarregada e seria sobrepujada com a mais simples das tarefas.

Assim, pessoas expostas periodicamente a lugares altos reduzem seu medo de altura. Pessoas com dificuldade de falar em público sentem-se mais confiantes em frente desse público depois de exposições habituais. Do mesmo modo, pessoas que são rotineiramente expostas a situações potencialmente perigosas tornam-se menos cuidadosas em tais situações. Isso se chama habituação.

É bem verdade que o hábito ou a rotina facilita e põe ordem no seu trabalho e na sua vida, pois é sua experiência acumulada ao longo do tempo trabalhando para você de modo automático. Contudo, exposições habituais a determinadas ocorrências, mesmo que perigosas, entediam seu mecanismo de autodefesa. Então, a rotina trabalha contra você quando se é exposto muitas vezes a situações potencialmente arriscadas onde nada acontece, e depois de uns 10 anos, ela mata um número considerável de policiais.

De acordo com os relatórios anuais do FBI sobre policiais mortos e agredidos, o tempo médio de serviço dos policiais mortos nos Estados Unidos é de 10 anos, e a média de idade desses policiais é de 36 anos. Nem um “novinho”, nem um “antigão”, mas alguém no meio da carreira, se você considerar que um policial brasileiro precisa ter 20 anos de serviço estritamente policial para se aposentar.

“Nada é rotina!”, “Evite a rotina!” e “Os maiores inimigos do policial são: a rotina e o excesso de confiança!” são algumas das frases que nós, instrutores, repetimos desde que começamos a falar sobre sobrevivência policial. Mas, você já deve estar cansado de ouvir isso!

A realidade é que barreiras policiais, buscas e apreensões, prisões, entrega de intimações, entrevistas e interrogatórios, condução de presos e outras ocorrências onde nada acontece são, de fato, rotina. Você pode chamá-las do que quiser como “baixo risco”, “alto risco”, mas o nome não altera as mudanças inconscientes que ocorrem dentro da sua mente quando você realiza tarefas sem consequências centenas de vezes ao longo dos anos.

O fato é que palavras ou frases não protegem nem matam policiais. Mas, o que você precisa perceber é que atividades diárias realizadas repetidas vezes, ano após ano, tornam o risco inerente cada vez mais invisível, e quando isso acontece você tende a fazer uma de duas coisas: se torna complacente com os perigos dessas atividades ou aumenta sua exposição ao risco para satisfazer sua necessidade natural de emoção. As duas coisas caminham lado a lado e se complementam. Não é por acaso que a complacência e o comportamento de risco estão diretamente ligados a um grande número de policiais mortos não só por criminosos, mas também por acidentes.

Você também precisa entender que enquanto abordagens de modo geral tendem a ser a atividade mais comum, qualquer coisa pode se tornar rotina se feita muitas e muitas vezes sem que algo ocorra para estimular sua percepção de que qualquer operação é um evento desconhecido cheio de riscos e imprevistos.

Talvez você não acredite, mas o perigo, o risco e a incerteza são alguns componentes que tornam o trabalho policial atraente para muitos policiais ou pelo menos para os policiais natos. Por isso, eles têm não só certa tolerância ao perigo, mas uma verdadeira necessidade dele. Não é incomum esse tipo de policial se sentir desestimulado e “sem rumo” ao ser designado para atividades administrativas ou consideradas sem importância.

É fato que alguns policiais ajustam seu comportamento para manter a exposição ao risco no nível que precisam. Eu chamaria isso de regulador fatal.

Deste modo, se a rotina torna o risco existente na atividade policial invisível, você irá inevitavelmente assumir riscos adicionais. E isso acontece quando você não espera o reforço, avança um sinal vermelho sem diminuir a velocidade, entrega sozinho uma intimação, vai só ao encontro com um informante, algema o preso para frente ou não algema, dorme dentro da viatura, confia na denúncia anônima, etc. Mas a verdade é simples: quanto maior o risco assumido, maior a chance de você morrer.

Não estou dizendo que policiais querem ser mortos, mas eles procuram estar presentes em uma variedade de situações arriscadas ou não se sentem policiais. Afinal de contas, eles correm em direção ao perigo, e não ao lado da multidão em pânico.

O mesmo tende a ocorrer com a complacência. Nada melhora suas habilidades de sobrevivência quanto ter um criminoso tentando ferí-lo ou matá-lo. O problema com este tipo de “motivação” é que você se arrisca a ser ferido gravemente ou morto no mundo real. E essa não é uma espécie de motivação que faça qualquer sentido.

Portanto, é hora das organizações policiais introduzirem gradualmente treinamentos que previnam a complacência e o comportamento de risco independentemente do tempo de serviço dos policiais. Pois é tarefa de cada policial se preparar para estar no auge da capacidade de sobrevivência, não importando as vezes que você já atendeu o mesmo tipo de ocorrência, na mesma cidade, no mesmo bairro, no mesmo comércio, procurando pelo mesmo bandido de sempre, no mesmo beco, nestes últimos 10 anos.


Quer levar um tiro?

Depois de um dia de trabalho, um policial encerrou sua atividade, tirou o uniforme e voltou para casa. Enquanto dirigia seu carro, ele percebeu uma barreira policial logo à frente. Como profissional experiente, o policial reduziu a velocidade, baixou os vidros, desligou o farol – mantendo apenas o farolete – e tentou localizar algum colega para saber se seguia ou não seu caminho. Ele fez isso porque queria facilitar o trabalho dos colegas. Ele viu um policial ocupado, e então continuou dirigindo devagar. De repente, uma policial mandou que ele parasse enquanto gritava: “Num está vendo que é uma abordagem? Quer levar um tiro?”. Pronto! O policial parou o carro, se identificou e a confusão se instalou.

Parece fantasia, mas isso aconteceu realmente, e numa cidade do interior. E apesar de você, como policial, estar “acostumado” com o crime e a violência, nunca há espaço para entender e aceitar a brutalidade e o despreparo com os quais alguns colegas lhe abordam.

A narrativa releva três graves e tristes fatos em relação aos incontáveis desentendimentos entre colegas policiais.

O primeiro fato é que muitos policiais desconhecem a importância do seu trabalho para a sociedade. Assim, é preciso aprender e reconhecer que para se perpetuar a paz deve-se combater a violência, e não promovê-la desnecessariamente. Pouquíssimos homens são capazes de negar a necessidade de se combater os assassinos, os torturadores, os assaltantes, os ladrões, os estupradores, os traficantes, os contrabandistas, os falsificadores, os golpistas, os corruptos, etc. No mundo inteiro, o preço por esta democracia e pela civilização é pago por cada policial engajado neste confronto de vida ou morte. Assim, cada policial deve entender que seu dever fundamental é servir à sociedade; resguardar vidas e propriedades; proteger o inocente contra a artimanha; o fraco contra a intimidação; a tranquilidade contra a violência e a desordem; respeitando os direitos de todo cidadão em benefício da liberdade, da justiça e da paz. Portanto, no dever policial não há lugar para se combater outro policial.

O segundo fato é que sempre que um policial avança um sinal vermelho, faz um retorno proibido, dirige em alta velocidade, xinga, grita, saca uma arma ou pergunta se você quer levar um tiro – tudo isso sem necessidade – ele envia uma clara mensagem de que está despreparado para exercer bem e de modo confiante sua tarefa de proteger e ajudar o cidadão. Além do mais, perguntar para qualquer pessoa insuspeita se ela quer levar um tiro, demonstra o quanto é perigoso para alguém – e para outros policiais também – ser abordado nestas barreiras. Significa que o policial que faz uma pergunta desta natureza não sabe em que circunstância está autorizado a usar a força letal. Muitas pessoas não param nas blitze porque são surdas, não enxergaram o comando para parar, estão com medo, etc. Algumas vezes, estas operações são tão descoordenadas que um policial manda o motorista seguir, e outro manda o mesmo motorista parar.

E o terceiro fato, mas não menos importante, é que enquanto alguns policiais brigam entre si, todos perdem a capacidade de perceber quem é o verdadeiro inimigo. Você sabe que seu dever como policial é perigoso. As responsabilidades que acompanham sua tarefa são muitas: prisão e interrogatório de criminosos, investigação de situações e pessoas suspeitas (arrombamentos e roubos em andamento), atendimento às ocorrências de distúrbios (discussões entre familiares, brigas em bares, pessoas armadas e disparos em vias públicas), operações de inteligência (infiltração em ambientes hostis, vigilância e ações veladas), perseguições automotivas, barreiras policiais, trato com indivíduos mentalmente perturbados e custódia de prisioneiros, para citar algumas. Se isso não bastasse, muitos policiais tornam-se vítimas de emboscadas criminosas simplesmente por causa de suas escolhas profissionais. Pense nisto: enquanto policiais brigam, criminosos cavam túneis e fogem. Amanhã, eles estarão livres para matar alguém que você ama.

Portanto, o trabalho contra o crime e a apreensão em relação à sua segurança não podem eliminar sua habilidade de se adaptar às circunstâncias e sua capacidade para ser um profissional firme, porém cordial com o cidadão que precisa confiar em você. Ainda mais se este cidadão for um colega de trabalho que algum dia pode salvar sua vida.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Carregar e ficar pronto! Sua sobrevivência depende de três coisas!

Um policial à paisana caminha em direção a uma casa lotérica. Ele porta uma pistola que está carregada e pronta. Enquanto anda, o policial confere as contas que precisa pagar; ele entra na casa lotérica, e então alguém aponta uma arma para ele e anuncia o assalto.

Enquanto isso, outro policial sai do supermercado empurrando o carrinho de compras. Ele também porta uma pistola que está carregada, mas não pronta. Durante o trajeto até seu carro, este policial observa o ambiente à sua volta. A poucos metros do veículo, ele percebe a aproximação de dois suspeitos. Então, o policial precisa tomar uma decisão e agir.

Agora a pergunta: qual destes policiais está real e completamente pronto para o confronto? A resposta: nenhum. Mas, por quê?

Porque muito da capacidade para se estar a salvo depende de três fatores básicos. Estes três elementos formam um triângulo de autodefesa sustentável. Contudo, basta retirar um dos elementos para que o triângulo se desfaça. Os princípios da autodefesa são o estado de alerta, o preparo mental e a prontidão para reagir rápido e de modo eficaz. Então, uma análise superficial dos eventos mencionados mostra que embora os policiais possuíssem planos de autodefesa, ambos eram falhos, pois faltava um dos elementos. O primeiro policial estava pronto, porém desatento. O segundo estava alerta, mas incapaz de ser rápido o suficiente.

O estado de alerta é provavelmente o atributo mais importante que alguém pode possuir, pois é a capacidade de observar as pessoas e as situações visando à antecipação ao perigo que está à espreita. E quanto mais cedo você detecta e reconhece um problema em potencial, mais opções você tem para decidir como resolvê-lo. Apesar disso, algumas pessoas relatam que criminosos costumam surgir do nada. Mas a verdade é que as vítimas potenciais estão tão desatentas que são incapazes de perceber a presença e a aproximação dos suspeitos. Em outras ocasiões, a falta de atenção conduz você para situações perigosas. E até que você perceba o que está acontecendo, já não há muita esperança. É como se você estivesse caminhando e olhando para os pés, e quando olhasse para frente se deparasse com os becos de uma favela. Então, quão rápido você percebe o que está realmente ocorrendo? Como já disse em outro artigo, quanto mais atento você estiver, menor a sua chance de ser pego de surpresa.

O preparo mental surge da necessidade de não se cometer erros nas situações mais importantes e decisivas. Situações que fazem a diferença entre viver ou morrer. Como o nome já diz, o preparo mental é um treinamento prévio baseado na imaginação. Funciona, grosso modo, da seguinte maneira: um colega lhe conta uma história sobre outro policial que foi assassinado durante um assalto num cruzamento qualquer. E o que você faz? Você vivencia mentalmente esta história como se você fosse a vítima, mas analisando a ocorrência e reagindo de modo que sobreviva ao confronto. É como se você se perguntasse: “O que eu faria de diferente se fosse comigo?” Com este tipo de treinamento, sua mente diz ao corpo o que fazer. Mas, sem esta preparação antecipada, seu corpo hesitará – até mesmo para escapar. Na confusão, descrença e incerteza de uma agressão, você precisa forçar seu corpo para reagir a tempo. E é aí que entra o preparo mental, pois ele diminui o tempo de paralisia.

Você já pensou se seu modo de vida atual e o cuidado com a própria segurança permitem perceber a aproximação do suspeito? Será que sua mente está realmente preparada para ordenar que você saque sua arma daquele coldre barato que está debaixo da camisa, e então carregue e fique pronto antes de receber o primeiro tiro? Quando você imagina um confronto, você normalmente perde ou sobrevive?

Enquanto algumas pessoas escolhem não utilizar a força física como meio de autodefesa, outras não têm tanta delicadeza. Mas, cada uma das escolhas carrega responsabilidades e é preciso pensar e decidir sobre isso antes, e não no momento do confronto.

O terceiro elemento é frequentemente difícil de definir. Significa quão pronto você está para fazer o que tem que ser feito nos poucos segundos que lhe restam. É a capacidade para reagir rápido e de modo eficaz, sendo o esforço, a reação de último momento. Se a situação chegar a esse ponto, você está autorizado a fazer o que for necessário para impedir a ação criminosa.

Como policial, você deve saber quando usar ou não a força, pois mesmo a violência possui diferentes níveis. Sua reação não tem relação com uma disputa insignificante, mas tem relação em não ser ferido ou morto em função da violência. E se a reação é de último momento, então você deve carregar sua arma e ficar pronto – com “bala na agulha” – antes de sair de casa. Quando uma situação chega ao extremo e é hora de usar a força, você deve estar pronto, pois do contrário, o despreparo tomará de você aqueles segundos que você não pode se dar ao luxo de perder.

Alguns policiais acreditam tanto nas técnicas de “tiro israelense” – nas quais se saca a pistola enquanto a mesma é alimentada – que acabam apostando a própria vida na crença de que o tempo gasto para estar realmente pronto é muito curto. Contudo, este tempo não significa simplesmente aquilo que se gasta para carregar uma arma e ficar pronto. Tempo também inclui o período que levará para que sua reação tenha algum efeito, porque mesmo a força letal leva tempo para se manifestar. Assim, você consegue fazer o que precisa ser feito, já?

Não se esqueça que se você falhar em qualquer dos três elementos do triângulo, a chance é de que a pessoa caída no chão seja você.


domingo, 15 de março de 2009

Por que policiais portam armas?

No ano de 2007, durante um treinamento realizado na academia de polícia, eu e outro policial saímos do hotel onde estávamos hospedados e caminhamos até um restaurante. Durante o trajeto percebi, apesar da escuridão, que esse policial não portava uma arma de fogo. Assim, para confirmar minha observação, perguntei ao policial se ele estava armado. Ele me respondeu que não!

Parece incrível, mas muitos policiais acreditam que na atividade policial o porte de arma é algo opcional. Talvez esses policiais não queiram ou sequer pensem em ferir outro ser humano. Talvez eles acreditem que não integram uma força policial simplesmente porque trabalham em setores administrativos ou investigam crimes pela Internet, por exemplo. Talvez ainda, eles não queiram assumir a responsabilidade pela própria segurança e carregar o fardo das consequências de suas ações de autodefesa.

Infelizmente, esses policiais estão mais predispostos à complacência se comparados aos demais colegas de trabalho. Isso significa que esses policiais, que possivelmente nunca se envolveram em incidentes críticos no trabalho ou fora dele, se acostumaram com a segurança com a qual viveram até hoje, e por isso tendem a acreditar que jamais estarão envolvidos em ocorrências violentas. Acreditar que nada ruim vai acontecer e que sempre se estará a salvo, é o primeiro erro em qualquer estratégia de autodefesa, seja ela armada ou não. E para qualquer policial, o segundo erro é não portar uma arma de fogo. É como costumo dizer: é melhor ter uma arma e não precisar usá-la, do que precisar e não ter uma.

Certamente você conhece algum policial que não porta uma arma de fogo. Alguns argumentam que todo policial deveria ser capaz de escolher se porta ou não uma arma, ou seja, que isso é uma escolha pessoal. Afinal, se um policial desarmado morrer porque não está portando uma arma, o problema é dele.

A questão é que este argumento está errado.

Se alguém permite que um policial se coloque em perigo por não estar armado, outro policial pode ter que arriscar a própria vida para salvar a dele. Isso quer dizer que outros policiais podem morrer porque uma pessoa não quis portar a sua arma. E esta não é uma escolha que se possa fazer.

Surpreendentemente, este tipo de pensamento é encontrado entre alguns jovens alunos das academias de polícia, e também entre policiais mais antigos quando são enviados para os cursos de capacitação. A simples idéia de ter que ingressar em ambientes hostis para realizar prisões de criminosos perigosos preocupa qualquer policial. Muitos aproveitam ao máximo os treinamentos que recebem e se envolvem nestas operações de corpo e alma, mas alguns ainda argumentam que não está escrito no termo de posse ou no contracheque que eles devem entrar em ambientes designados “somente” para os grupos de ações táticas especiais.

Então, por que portar uma arma?

Policiais treinam e portam armas de fogo porque juraram salvar vidas, mas para que estas vidas inocentes sejam poupadas, algumas vezes o policial precisa empregar a força letal como única maneira de fazer uma pessoa violenta parar de cometer um ato abominável. E para isso, o policial precisa estar vivo também.

O objetivo é somente parar, e todo policial gostaria de ser capaz de parar um criminoso sem a possibilidade de matá-lo, no entanto, ainda não existe uma pistola Star Trek Phaser – que pode vaporizar o inimigo ou apenas deixá-lo inconsciente. Obviamente há uma variedade de instrumentos menos letais disponíveis para as situações nas quais é possível seu emprego, mas até agora o único meio concreto para um policial parar imediatamente um criminoso violento é a arma de fogo.

A arma de fogo é apenas uma ferramenta usada para fazer o criminoso parar. A arma nada mais é do que uma “broca sem fio lançada a distância com a ajuda de um produto químico”. Essas “brocas” vêm em diferentes calibres – pessoalmente eu gosto do 9 mm e do .45 ACP, mas todos atingem o mesmo objetivo. Este objetivo é criar um canal de ferida permanente por onde o sangue possa escoar para diminuir o fluxo sanguíneo, o que provocará a inconsciência e a incapacitação. No entanto, algumas vezes a vida do criminoso também escoa, porque sob certas circunstâncias parar requer a morte, mesmo que seja uma morte deliberada por um tiro na cabeça, se esta for a única opção para o policial. Em resumo, antes ele do que eu, um colega policial ou uma vítima inocente.

Desse modo, se um policial não está mentalmente preparado para atirar, ele não deve portar uma arma. E se ele não carrega uma arma, ele não pode ser e agir como um policial. A incapacidade de portar uma arma e ser responsável pela própria segurança, não torna este policial um profissional ruim – não há vergonha nisto. No entanto, eu sugiro outras carreiras no serviço público.

Disparar uma arma é antes de tudo um treinamento mental. Algum tipo de habilidade motora também é necessário, porém a perfeição requer um estado mental adequado. Parte deste estado mental significa certificar-se de que você é capaz de atirar em outro ser humano sob condições legais e morais apropriadas.

Portanto, é necessário um equilíbrio delicado entre a autoconfiança na capacidade de usar a força letal, se for preciso, e o desejo desenfreado de querer usar esta força. Este equilíbrio deve alcançar os novos alunos das academias de polícia quando treinados no uso da força letal, pois a polícia precisa de profissionais capazes de atirar sem hesitação, mas que preferem que isso nunca aconteça, tanto quando deve atingir aquelas pessoas que querem matar e vivem para ver este dia chegar. É preciso se livrar deste tipo de pessoa também.

Se um policial não quer exercitar sua mente e suas habilidades físicas para compreender e aplicar, quando preciso, o conceito do uso da força letal, ele não está realmente armado, mesmo que ele porte uma arma de fogo. E se ele não porta uma arma, ele simplesmente não serve para o trabalho policial.


quarta-feira, 4 de março de 2009

Faça algo antes que sua vida esteja em perigo!

Se alguém observar a atividade policial, verá que é um trabalho para poucas pessoas. Pense sobre isto: um homem entra em uma loja, saca uma arma, anuncia um assalto (que dá errado), faz reféns e diz que antes de morrer, vai matar o primeiro que aparecer. Um policial recebe esta chamada pelo rádio. E o que ele faz? Ele atende a ocorrência e se dirige às pressas para chegar ao local. Ele corre para chegar lá!

Não é difícil imaginar as pessoas empurrando umas as outras, procurando uma proteção e fugindo aterrorizadas. Em situações assim, essas pessoas têm a ideia certa, mas o policial não dispõe desse luxo. E apesar do medo e do estresse, ele corre contra a multidão em pânico, para chegar o mais próximo daquele que tentará matá-lo.

Desde o primeiro dia, o policial é informado de que o trabalho dele é ir onde está o problema. Quase tudo o que se aprende está relacionado com o perigo. Infelizmente, outra parte importante do treinamento carece do realismo necessário para fazer com que o policial compreenda, por exemplo, a estranha natureza dos confrontos armados. Mas isso é outro assunto!

De qualquer maneira, embora o policial aprenda maneiras de se aproximar do perigo, nunca lhe é ensinado um modo de fugir.

Mas, por que o policial corre para chegar lá, apesar do medo? Esse assunto é amplo e complexo, no entanto, o treinamento constante em técnicas coerentes com a realidade e o conhecimento sobre como o medo afeta o corpo e a mente podem ajudar você a se tornar mais rápido, mais forte e orientado para um objetivo. Assim, considere as seguintes sugestões antes que sua vida esteja em perigo:

Permaneça atualizado, o melhor possível, nas técnicas policiais e treine regularmente. Nunca perca a oportunidade de participar de treinamentos (táticas defensivas, de sobrevivência, armamento e tiro). Se a corporação não pode custear seu aprimoramento, você deve considerar pagar por isso.

Leia artigos, compre livros e não seja tão orgulhoso a ponto de não fazer perguntas e aprender com os policiais mais antigos, experientes e capacitados.

Avalie as informações relacionadas ao seu trabalho e pesquise por conta própria. Quanto mais você aprende, melhor exerce a sua atividade.

Observe o que você está fazendo na área da autodefesa e pergunte a si mesmo se o seu treinamento está coerente com a realidade. Seu treinamento deve simular situações reais, pois a experiência “real” constrói e aumenta a confiança, reduzindo a “novidade” do trabalho diário.

Compreenda as motivações para o fenômeno de luta ou fuga. O medo não é um tipo de neurose que precisa ser eliminada. É uma importante emoção utilizada pela natureza para informar a você que sua vida está em perigo e que é hora de tomar uma atitude. Para ajudá-lo a agir, o medo produz uma mudança química que lhe dá uma margem de sobrevivência, compelindo-o a instintivamente fazer uma de três coisas para salvar sua vida: lutar, fugir ou obedecer.

Luta – Quando se está lutando pela própria vida, a natureza não espera que você siga regras; ela programou o homem para aniquilar a ameaça da maneira que ele puder. Diante de uma ameaça a vida, muitas pessoas encontram força e ferocidade que jamais imaginam ter. Entretanto, você pode lutar e até usar a força letal com o propósito de se defender, mas deve reagir com controle da situação e de si mesmo com o objetivo de cessar agressão. Isso não é uma tarefa fácil quando alguém está tentando matá-lo.

Fuga – Toda criança sabe como fugir do quarto quando ouve aquele barulho estranho que faz o coração disparar. Ela vai de encontro a tudo que há à sua frente, não importando os possíveis ferimentos, e não para até chegar ao quarto dos pais. Isso não foi ensinado, mas aprendido instintivamente. Mas, a fuga nem sempre é uma opção, pois você fez um juramento e recebe seu salário para ir até onde está o perigo (a retirada em busca de proteção não é considerada como fuga).

Obediência – Quando não se pode lutar ou fugir, mais uma vez a natureza vem em socorro com um terceiro modo de sobrevivência. Por exemplo, nos Estados Unidos, quando um urso cinzento ataca alguém, enfrentá-lo não é uma opção, nem fugir, uma vez que o urso é mais rápido. Assim, os guardas florestais orientam os visitantes dos parques ecológicos a ficarem imóveis e se fingirem de mortos, para que o urso fique entediado e procure uma presa viva. A menos que você trabalhe com ursos cinzentos, como policial, a obediência raramente é uma boa opção.

Avalie as situações de risco ocorridas no passado tanto quanto o que você fez de certo ou errado e o que precisa ser melhorado. Rever suas ações é uma ferramenta poderosa para o aprendizado, dando a você a confiança para enfrentar outro incidente crítico.

Entenda que mesmo que outro policial tenha feito algo que funcionou, ainda podem existir opções que funcionariam melhor. O melhor colega é aquele com quem você pode discutir os incidentes vivenciados, mesmo que para isso você tenha que demonstrar sua fraqueza.

Entenda e aceite a possibilidade de que você tenha que usar a força letal. É importante considerar o que seria disparar sua arma contra o corpo de uma pessoa e vê-la desabar sem vida como resultado daquilo que você fez.

Conheça as tendências do crime e dos criminosos na cidade onde vive. Quanto mais sintonizado com aquilo que acontece a sua volta, menor sua chance ser pego de surpresa.

Faça um esforço para permanecer em alerta. Isso também reduz a possibilidade de você ser pego de surpresa. Quando você está com “a cabeça no mundo da lua” e é empurrado de repente para uma situação arriscada, existe uma grande chance de que você, assustado e incapaz de entender o que está acontecendo, “congele”. O estado de alerta mantém você concentrado no trabalho, mesmo durante os períodos de tédio.

Confie na sua intuição porque é o acúmulo de conhecimentos a partir de sua experiência de vida e que está trabalhando para você de modo inconsciente.

Acredite na missão. Se você não acreditar na missão para a qual foi indicado, ou se os riscos ultrapassam os benefícios para você ou para a sociedade, então você será complacente e hesitará durante o confronto, e aquele que acha que nada vai acontecer ou hesita nessa circunstância, normalmente perde a vida.

Mantenha-se em forma. Um bom preparo físico melhora sua autoestima e o ajuda nas situações onde a força física prolongará sua resistência para continuar lutando.

Desenvolva um forte desejo de sobreviver em qualquer tipo de situação. Existem relatos sobre policiais e criminosos que foram gravemente feridos e apesar de tudo continuaram a lutar. Essas pessoas tinham um intenso desejo de sobreviver e foi o que fizeram, embora em muitos casos tenham sido atingidas várias vezes. Passe seu tempo livre dizendo a si mesmo que sobreviverá não importa quão ferido esteja, e que não desistirá até que tenha vencido o confronto.

Pratique o treinamento mental. Esse treinamento é uma atividade que não exige esforço físico. Você pode desenvolvê-lo enquanto dirige a viatura ou está em casa. Basta imaginar uma briga num bar ou um roubo em andamento, e como você responderia a essas ocorrências. Visualize um caso real, coloque-se no lugar do policial que atendeu a ocorrência e imagine sua reação visando sua sobrevivência.

Como a mente não consegue facilmente diferenciar a fantasia da realidade, o treinamento mental é uma ferramenta eficaz, sempre disponível e com a qual você pode “vivenciar” situações perigosas sem se expor aos riscos de um confronto real.

Lembre-se, a vida de uma pessoa é considerada o bem mais precioso. Muitas das leis e condutas morais estão fundamentadas na autoproteção e na preservação do ser humano contra graves ferimentos e a morte. No entanto, em uma situação de legítima defesa, você pode ter que ferir ou mesmo matar outro ser humano (o agressor).

Por fim, saiba que no combate não há lugar para considerações pessoais ou religiosas. É preciso concentração na tarefa e nada mais. Se isso não for feito, você estará em perigo.

domingo, 1 de março de 2009

Um ferimento nem sempre significa a morte!

Como já se sabe, a atividade policial é perigosa por natureza. E como a Lei de Murphy é frequentemente uma companheira do trabalho policial, você precisa se preparar para as eventualidades, inclusive a de ser ferido num tiroteio. Então, se algum dia você for ferido, as seguintes dicas podem ajudar:

Termine o confronto! Isso parece óbvio, mas muitos policiais param de lutar simplesmente porque acham que foram feridos. Ser atingido é sempre uma possibilidade, mas essa não é a hora para você desistir. Confirme se o criminoso não é mais uma ameaça. Se ele fugiu, fique onde está. Se ele caiu, observe-o (com sua arma apontada para ele). Se ele ainda se move e representa um ameaça, continue atirando – faça na medida do necessário até que a ameaça seja interrompida.

Fique alerta! Criminosos comumente atacam em bando, por isso fique atento à presença de comparsas. Verifique sua arma – sane as panes e faça a recarga por precaução. Em situações de estresse, ocorre a diminuição da irrigação sanguínea originando a hipoxia retiniana (deficiência de oxigênio nos tecidos orgânicos), o que leva ao encurtamento do campo visual de fora para dentro (perda da visão periférica). Isso é Visão em Túnel. Olhe à sua volta, escaneando o ambiente, para compensar a diminuição do seu campo visual.

Proteja-se! Vá para uma posição barricada se você não fez isso antes. Não coldreie sua arma, apenas proteja-se. Posições protegidas funcionam como um grande colete balístico capaz de oferecer proteção para todo o corpo.

Peça ajuda! Respire fundo algumas vezes, chame pelo rádio HT ou telefone celular de modo simples e direto. Diga seu posto, nome, o local onde está e que foi ferido. Esqueça os códigos e os protocolos de comunicação (código Q, por exemplo), apenas forneça informações vitais de maneira clara. Não perca tempo falando com pessoas que não podem ajudar, ligue somente para o serviço de atendimento de urgência. Confirme se o atendente entendeu as informações. A ajuda já está a caminho, então esqueça o HT e volte sua atenção para a ocorrência.

Avalie seu estado! Se você estiver usando um colete balístico, os impactos nele provocam muita dor, mas são apenas hematomas. Sem o colete, os ferimentos são mais sérios – ache-os rápido. Ferimentos nos músculos podem não doer tanto e, às vezes, não sangram muito devido à vasoconstrição provocada pelo estresse. Se o ferimento doer demais, provavelmente algum osso foi quebrado – mas se calcificarão. Ferimentos na cabeça sangram em abundância, mas se você está consciente o suficiente para notar o sangramento, então o ferimento talvez não seja uma ameaça imediata. Contudo, o impacto grave de um projétil na cabeça deixará você inconsciente.

Faça os primeiros socorros você mesmo! À medida que você se acalma, o sangramento tende a aumentar, assim pressione o ferimento o máximo que puder. Utilize suas mãos, sua camisa ou um lenço – improvise. Você tem aproximadamente cinco litros de sangue no seu corpo. Você pode perder cerca de 20% disso e ainda permanecer consciente. Isso dá quase um litro de sangue, então derrame o conteúdo de uma embalagem Tetra Pak para você ter uma idéia do tamanho da poça que isso representa. Portanto, se você não sangrou esse tanto, você ainda está bem. Caso contrário adicione mais compressas ao ferimento e comprima bem.

Realize a respiração tática ou de combate! Inspire lenta e profundamente pelo nariz, e expire lenta e profundamente pela boca. Isso vai oxigenar seu cérebro e dificultar o desmaio. Continue alerta! Peça ajuda novamente, e forneça dados complementares sobre sua localização.

Acredite que o socorro está chegando e não desista! Quando um policial é ferido, todos os outros policiais correm até o local do incidente. Primeiro para prestar auxílio ao colega baleado, e segundo para iniciar a perseguição. As unidades de resgate provavelmente estarão no local em poucos minutos. Por isso, enquanto aguarda, lembre-se que se você ainda estiver vivo quando o resgate chegar, suas chances de sobrevivência são de aproximadamente 90%. Mantenha a respiração tática para “normalizar” os batimentos cardíacos e o nível de estresse. Para manter suas esperanças e seu moral elevado, converse pelo rádio com outro colega.

Compreendendo essas dicas e as revendo periodicamente, você pode lutar contra o medo e o estresse aumentando sua probabilidade de sobreviver à situação de conflito na qual você foi ferido.

Este é um procedimento que você deve treinar por conta própria, porque até agora nenhum treinamento de tiro inclui instruções para quando se leva um tiro ou se perde um confronto, e infelizmente muitos policiais tendem a pensar que isso nunca vai acontecer. Mas isso acontece e muito! Por isso, treine com sua arma, estude ou faça um curso de primeiros socorros porque isso pode e irá ajudá-lo um dia.


terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Policiais mortos não protegem ninguém.

Em fevereiro de 1999, quatro policiais do Departamento de Polícia de Nova Iorque (NYPD) estavam procurando por um suspeito de estupro. Era noite e quando eles encontraram Amadou Diallo, que se encaixava na descrição do homem que procuravam, os policiais desceram da viatura e pediram para que ele ficasse parado. Quando o suspeito começou a correr para entrar num prédio, os policiais iniciaram a aproximação rapidamente. Assim que o suspeito alcançou a entrada de um edifício de apartamentos, o nível de estresse aumentou e os policiais começaram a gritar: “Pare! Polícia!”

Mas Amadou Diallo, de 22 anos, imigrante africano e vendedor ambulante, recusou-se a atender aos comandos. E quando ele chegou à principal escadaria do prédio, os policiais o viram dar meia volta e colocar a mão direita no bolso da calça – sob intenso medo, os policiais pensaram que seriam baleados.

Como qualquer policial que tenha enfrentado situação semelhante sabe, a hesitação pode ser um erro fatal. Para um suspeito que ignora os comandos, força uma perseguição a pé, escapa para dentro de um prédio e repentinamente dá meia volta e leva a mão até o bolso como se fosse pegar uma arma, só existe uma resposta para aqueles policiais que desejam sobreviver. Dessa forma, Amadou Diallo acabou morto em função dos disparos efetuados pelos policiais.

Amadou Diallo deu início à reação de sobrevivência dos policiais quando fugiu durante a tentativa deles em abordá-lo, e assim começou a perseguição (Talvez ele fosse o estuprador!). O estresse se intensificou quando Amadou se recusou a obedecer às ordens policiais. Ele entrou em um prédio ignorando as ordens legais para parar. Ele correu para a escadaria e continuou não obedecendo às ordens para parar (Talvez ele tivesse uma arma!). O estresse se elevou ainda mais quando o suspeito se virou de repente para os policiais, colocou a mão no bolso e agarrou alguma coisa (O que ele tinha?). Sua mão tirou algo do bolso. Era um objeto escuro. Alguém gritou: “Arma!” (Isso já foi visto antes, o suspeito não coopera e a polícia usa a força. Ele tenta matar o policial para não ser preso).

O suspeito realizou todos os movimentos corporais e deu todas as dicas que sugeriam que ele tentaria reagir. Um policial percebeu isso, e tentando proteger o colega e a si mesmo, gritou que o homem tinha uma arma. Esse policial, mais vulnerável e próximo da ameaça, disparou 16 tiros em menos de quatro segundos à medida que se afastava de Amadou Diallo caminhando de costas escada abaixo, o que é extremamente difícil durante situações de estresse. O policial caiu e se machucou. O outro policial que estava ao lado deste primeiro, e que ouviu o aviso sobre a arma, também disparou 16 vezes. Os policiais que estavam atrás desses dois viram que um deles caiu de costas. Eles também dispararam para salvar os colegas. Até aqui, nenhum dos policiais podia ouvir bem. Em função da exclusão auditiva e a quantidade de tiros disparados, eles não podiam distinguir entre os tiros disparados por eles daqueles disparados pelo suspeito. Os três policiais ao verem o colega cair na escada pensaram que ele tinha sido atingido. Alguns projéteis estavam passando por eles confirmando que eles estavam sob ameaça mortal. Até aqui o suspeito não tinha sido incapacitado porque nenhum tiro atingira qualquer parte vital. Os policiais pensaram: “Os tiros o estão atingindo?” O caos se instalou e os policiais tinham que salvar uns aos outros e não serem mortos durante o confronto. Finalmente Amadou Diallo caiu e o tiroteio parou. Tudo isso em quatro segundos.

Os dois policiais mais próximos à ameaça dispararam 16 tiros cada um – a capacidade da pistola usada pela polícia de Nova Iorque –, esvaziando suas armas. Os outros dois policiais, mais afastados, não dispararam mais que seis tiros. O confronto ocorreu à noite. E a escuridão, combinada com a visão em túnel, reduziu drasticamente a capacidade de enxergar bem. O suspeito subiu alguns degraus e se colocou em um ponto de maior vantagem em relação aos quatro policiais. Os degraus de alvenaria possibilitaram que os projéteis ricocheteassem em direção aos atiradores.

Mas o pior pesadelo para esses quatro policiais se tornou realidade quando eles descobriram que Amadou estava desarmado.

Policiais costumam dizer que matar alguém durante o cumprimento do dever é o evento mais estressante que pode ocorrer durante a carreira policial. Mas quando esses policiais descobrem que a pessoa que eles mataram está desarmada e que a percepção da ameaça foi um erro de julgamento, a angústia se torna insuportável.

Infelizmente, a polícia de Nova Iorque ainda estava realizando testes para determinar uma mudança de munição quando a morte de Amadou Diallo ocorreu. Na época do tiroteio, os policiais usavam munição com projétil encamisado total ogival (ETOG) que tende a ricochetear com mais freqüência que o projétil expansivo ponta oca (EXPO). Talvez, os policiais envolvidos na ocorrência tenham confundido os projéteis de suas próprias armas que estavam ricocheteando ao atingirem a escadaria e as paredes com possíveis disparos efetuados pelo fugitivo.

Após uma completa apuração do caso e um pouco de percepção sobre o que ocorre em um confronto dinâmico e violento, não é difícil imaginar como o tiroteio ocorreu. Os efeitos da reação de sobrevivência, as considerações sobre o ambiente da ocorrência (escadaria, corredor estreito, pouca iluminação, ou seja, locais onde o tempo de exposição do policial deve ser o menor possível, devido à desvantagem tática), a percepção dos policiais baseada no comportamento do suspeito, a proximidade da ameaça e o tempo mínimo para reagir, o fato de um policial ter caído e se ferido dando a impressão de ter sido baleado e o desempenho da munição (falha em incapacitar imediatamente o agressor e ricochetes), tudo se combinou para esse desastre.

Enquanto 41 tiros parecem excessivos, na verdade não são. Havia quatro policiais atirando, mas somente 19 projéteis acertaram Amadou Diallo – um percentual de acerto de 46% –, e apenas um foi fatal. A maioria dos disparos atingiu as pernas e os braços de Amadou Diallo. Isso demonstra um cenário mais próximo da realidade do que aqueles mostrados pela TV. Infelizmente muitas pessoas são educadas pelos tiroteios e confrontos violentos dos filmes mostrados na televisão. Na TV o criminoso é sempre incapacitado com apenas um tiro, voa para trás e fica impossibilitado de continuar a luta.

Os policiais que confrontaram Amadou Diallo pararam outros possíveis suspeitos antes de tentarem interrogá-lo. A diferença é que eles não encontraram resistência por parte dos outros suspeitos. Uma pessoa ponderada colabora com a polícia quando parada e entrevistada, mesmo que a ordem não faça sentido imediatamente.

Descobriu-se mais tarde que Amadou Diallo havia pedido asilo nos Estados Unidos, mas mentiu ao preencher o requerimento no Serviço de Imigração e Naturalização e, apesar de sua permanência legal no país, seu visto para trabalho expiraria em abril de 1999. Talvez ele estivesse com medo de ser deportado pelos policiais que o abordaram; talvez achasse que seria assaltado, uma vez que os policiais estavam à paisana e saíram de uma viatura descaracterizada; mas se ele ficasse parado e respondesse as perguntas dos policiais o incidente terminaria pacificamente. Qualquer atitude diferente da cooperação aumentará a suspeita e o medo no policial, causando a escalada da força. Pessoas agressivas frequentemente não seguem as ordens policiais. Aqueles com armas ou objetos roubados correm ou atiram contra o policial, percebendo que estão prestes a serem presos. A abordagem a uma pessoa calma e cooperativa tende a gerar certa tranquilidade no policial. Mas quando se confronta uma pessoa resistente, extremamente nervosa ou agressiva, é normal que o nível de alerta do policial aumente. E é isso que ajuda o policial a sobreviver.

A segurança das pessoas e dos policiais é mais importante que a segurança dos criminosos. O agressor toma a decisão de resistir ou cooperar. Os policiais envolvidos no caso Amadou Diallo pensaram que estavam na iminência de serem baleados por um suspeito armado. Evidentemente, demonstrou-se que Amadou estava desarmado. Contudo, a percepção dos policiais era a de que ele tinha uma arma. Se um policial pensa ter visto uma arma e grita que o suspeito está armado, todos os policiais envolvidos irão naturalmente pensar que, de fato, existe uma arma.

No mês de março do mesmo ano os quatro policiais foram acusados pelo homicídio e poderiam ser condenados a uma pena de 25 anos, mas em fevereiro de 2000 todos eles foram absolvidos. Eles não receberam qualquer punição do Departamento de Polícia de Nova Iorque, pois agiram da forma como foram treinados.


Eu vou atirar na perna dele!

Discute-se bastante no meio policial sobre o uso da força letal na autodefesa, mas uma ideia surge quase universalmente. É o conceito chamado Síndrome do Tiro na Perna. Essa síndrome é expressa pelas opiniões do tipo: “Eu não vou atirar para matar, mas vou mirar na perna do bandido!”. “Precisava matar com três tiros no peito? Por que não atiraram na perna?”*.

Eu acredito que tais pensamentos tenham origem na boa índole das pessoas que possuem armas de fogo para a defesa pessoal, contudo jamais imaginaram com seria um tiroteio real com um criminoso violento, nem o que elas fariam se tivessem que atirar em alguém. Essas boas pessoas não saem por aí roubando, sequestrando ou matando as outras, elas nem mesmo pensam ou querem fazer algo parecido. Outra origem é a crença equivocada daquelas pessoas que sequer estão presentes quando a violência ocorre, mas que não deixam de emitir um “parecer” baseado em considerações pessoais baseadas em filmes de ação, e não nas circunstâncias que envolvem o horror de um confronto armado real.

Assim, o que acontece é que aquele criminoso que momentos antes apontava uma arma engatilhada para uma pessoa honesta, agora que está morto é transformado – num passe de mágica – em vítima por aqueles que acreditam que o policial deveria ter atirado na perna. Os papéis se invertem: o bandido vira mocinho, e o policial vira executor.

Existem muitas razões para o porquê desse “conceito” não ser plausível no campo da autodefesa. Algumas dessas razões são jurídicas, algumas são táticas e outras são morais.

Uma arma de fogo é um instrumento letal por natureza. Diferente de uma bomba de efeito moral, um spray de pimenta, uma tonfa ou um taser, não existe um modo “menos letal” de usar uma arma de fogo contra outro ser humano. A lei não faz distinção entre um tiro na cabeça ou um tiro no peito de uma pessoa. Se a ação do suspeito colocar você sob risco de grave ferimento físico ou morte, o uso da sua arma para repelir essa agressão e preservar sua vida é um motivo legalmente justificável (apesar de ser ainda um homicídio).

Além disso, o projétil não pode ser trazido de volta uma vez que tenha deixado o cano da arma, e o que ele faz ao penetrar o corpo de uma pessoa não pode ser determinado pelo policial. Existem grandes vasos sanguíneos nas pernas, nos quadris e nos ombros de um ser humano, que uma vez atingidos podem matar alguém tão rapidamente quanto um tiro no coração.

Além do mais, manusear taticamente uma arma sob condições de estresse extremo é muito difícil, pois não há tempo para sequer raciocinar, muito menos para mirar. Pergunte a si mesmo: é possível determinar perfeitamente se você está ou não amparado pelo instituto da legítima defesa, e fazer pontaria com precisão durante uma situação de vida ou morte que não leva poucos segundos para começar e terminar?

Informações sobre confrontos armados indicam que um policial acerta um em cada seis tiros disparados contra o alvo. Isso produz cerca de 17% de aproveitamento, e se já parece ruim, espere até você analisar outro dado que demonstra que aproximadamente 50% dos tiroteios ocorrem em distâncias de até 1,70 m entre o policial e o suspeito. Outros 20% ocorrem em distâncias entre 2 e 3,40 metros. Agora, um homem com uma faca – e com o caminho livre – é capaz de correr 5 m em apenas 1.28 segundo. Assim, não importa quantos disparos sejam feitos, você vai errar a maioria deles, mesmo à queima roupa. Então, quão realista seria se muitas das pessoas que tiveram a sorte de acertar o criminoso em ação tivessem que calmamente mirar e disparar contra uma das menores partes do corpo? E se essa área ainda tivesse grande chance de estar em movimento?

A prática nas academias de polícia ensina os alunos a realizarem dois tiros no centro do alvo a 7 metros de distância e em 2 segundos. Só para constar, um homem é capaz de percorrer 8 metros com uma faca para atacar um policial em 1.79 segundo. Então, quanto tempo sobraria para a visada perfeita na perna, no braço ou no ombro? Nenhum.

De qualquer maneira, a prática nas academias envolve dois conceitos. O primeiro deles refere-se ao centro de massa, significando apontar a arma para que o projétil vá de encontro à área mais ampla do alvo (o tronco) e, obviamente em cujo local as chances de acerto são maiores. O segundo conceito diz respeito à possibilidade de se atingir órgãos internos localizados nesta área e que permitam uma maciça perda de sangue, levando à inconsciência e à incapacitação.

A intenção de incapacitar, em nada tem haver com atirar para matar ou mirar para ferir, pois ambas são irrelevantes, pois sua ação de autodefesa está centralizada na percepção de ameaça grave e na capacidade do criminoso matar ou tentar matar você. Se a simples presença da sua arma detiver a intenção do delinquente, o trabalho está feito! Se apenas um tiro no centro de massa persuadir o atacante a desistir, está ótimo! Contudo, se forem precisos 10 tiros pelo corpo para impedir que um criminoso mate você, então...!

Eu não estou defendendo o uso da força letal como forma de punição para criminosos. O que eu estou dizendo, é que você é uma pessoa sensata, com um inalienável direito à vida e à liberdade e que não se envolve em questões alheias, ou seja, você vive pacificamente. E então, alguém o ataca, tenta feri-lo ou matá-lo sem nenhuma razão a não ser com o interesse de tomar aquilo que é seu. Você não está tentando matá-lo, apenas tentando fazê-lo parar. E isso não é errado, é certo! Você tem o direito de fazer o que for necessário para estar a salvo, voltar para casa e para sua família. Mas se você esperar até conseguir a pontaria perfeita e “não letal”, talvez seja tarde demais para você!

*Pergunta feita por um parente de J.F.S., morto por policiais da ROTA paulista, conforme artigo publicado na FENAPEF em 12/06/2008 denominado “Rota mata rapaz que roubou R$ 11”.