terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Muita tralha

 

 Numa ocorrência, mais conhecida porque o policial jogou a espingarda no chão para tentar uma transição de armas, o que chamou minha atenção foi o excesso de equipamentos.

É natural um ganho de peso com os anos, mesmo você se mantendo em forma. Aí vão alguns quilos!

Agora some o colete balístico (raramente feito para as necessidades policiais) e o coturno (uma aberração para o uso policial).

Adicione um coldre de perna e uma bolsa presa na perna oposta para que a mobilidade e a velocidade diminuam e o esforço aumente. Justamente aquilo que o policial precisa para alcançar, superar o agressor e se defender.

Mas ainda não acabou! Não raro vejo colegas portando cantis e facas de combate.

O problema é que herdamos características das forças armadas que não são consistentes com a função policial. E isso precisa mudar!

Então, você deve se perguntar se precisa de TODOS os equipamentos durante o trabalho.

Será que o policial brasileiro não pode manter certas ferramentas na viatura? Ele não consegue ter uma garrafa d'água ou um Camelbak dentro do veículo? É preciso tanta tralha no trabalho policial urbano?

Uma coisa é certa: as polícias precisam repensar seus uniformes, viaturas, equipamentos, armas, procedimentos, sistemas de comunicação e filmagem individual com visão moderna, adequada, inteligente e eficaz.

E o policial precisa compreender que, embora tenha que lutar pra viver e trazer a paz, ele não vai marchar 40 km ou passar 30 dias num campo.

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sábado, 12 de dezembro de 2020

Tiro com uma mão

 

Com a expansão dos CFTV, tenho visto diversas reações de policiais em confrontos armados. E o que já se sabia de modo intuitivo tem ficado mais evidente.

Falo da reação usando só uma mão, o que contraria o modo ideal de empunhar a arma com a empunhadura dupla.

Pensando nisso, eu me fiz três perguntas: por que muitos policiais reagem apenas com uma mão? Por que não soltam os objetos que estão segurando numa das mãos, mesmo durante o perigo? E se nós realmente fazemos sempre aquilo que treinamos... se isso é uma verdade absoluta.

Penso que é verdade para os grupos de operações especiais, pois parte do trabalho deles é treinar. Eles treinam, planejam, passam o briefing, operam de forma coesa e fazem o debriefing. Ou seja, eles têm cinco momentos de aprendizagem.

Mas isso não é uma verdade para a maioria dos policiais. Nesse caso, é possível que o policial não tenha experimentado atirar com uma mão durante o curso de formação. E os que tiveram a sorte de executar algum exercício, o tenham feito de modo inconsistente.

Então, para responder a primeira pergunta é preciso saber que o instinto se sobrepõe à razão quando o risco de morte é imediato. Ele força o policial a reagir da forma que for possível no pouco tempo que resta: quando ele é pego de surpresa, está próximo do agressor e sem proteção.

A ideia é reagir, ainda que com alguma imperfeição, pois para ser rápido o instinto não pode se dar ao luxo de ser perfeito. Por isso, muitos não conseguem usar as miras ou erram alguns tiros.

Mesmo quando há opção, o instinto vai escolher a ação mais rápida e descartar o que foi treinado, conforme os critérios de tempo, distância, proteção e surpresa.

Isso explica porque o policial reage apenas com uma mão, ainda que atirar com as duas seja melhor e faça parte da formação e do treino.

E por que não largamos os objetos nas situações críticas? Uma das coisas que diferencia a espécie humana é a destreza manual, a habilidade pra segurar e manipular os objetos. E nós usamos muito essa habilidade: nos agarramos quando perdemos o equilíbrio, tentamos pegar algo que está caindo, quase num ato reflexo.

Isso reforça o aprendizado de que as mãos servem para segurar e não para largar as coisas. E como a mente sabe que não é preciso usar as duas mãos para atirar, se você reagir num tempo curto, não vai largar o que está segurando.

A sua mente também vai estar tão focada na reação que é possível que ela ignore o objeto que você está segurando.

Além disso, durante o estresse, há uma perda na habilidade motora e você vai experimentar um declínio na destreza manual, necessária pra realizar várias tarefas ao mesmo tempo, como largar o objeto enquanto saca a arma.

Outro motivo é a coordenação bimanual. Quando o nível de atenção é direcionado para a mão dominante há uma queda de desempenho na execução do movimento da mão oposta. E não podemos esquecer do reflexo intermembros.

Portanto, o que nós, instrutores, podemos fazer? Incorporar essa realidade nos treinos e cursos. O aluno deve atirar com as duas mãos, já que isso é básico. Mas sacar, apresentar e atirar usando apenas uma mão também é fundamental e uma realidade.

Finalmente, há uma fenômeno chamado "momentum operacional". Ele diz que é difícil parar um movimento após ter sido iniciado. Apesar de estar relacionado a alguns aspectos do trabalho policial, em especial ao movimento para o saque e o tiro, o conceito ainda pode ser aplicado no caso do tiro apenas com a mão dominante e ao fato das pessoas não conseguirem largar os objetos que carregam com a mão não dominante.

Portanto, o momentum operacional dificultaria a soltura de um objeto que já está sendo empunhado durante a reação armada.

Então, treinar a soltura de alguma coisa durante o saque da arma pode contrariar o conceito acima e se tornar uma medida inconsistente com as dinâmicas que a realidade tem nos mostrado.

Quem nunca errou?

Quem nunca cometeu uma falha durante o trabalho policial que levante a mão!

Algumas vezes fazemos aquilo que "prometemos" não fazer, ou ignoramos, intencionalmente, nossa intuição para seguir o caminho mais fácil e rápido.

Mas o grande vilão é quando o erro sem consequência se torna um hábito. O maior vilão, contudo, é o desastre esquecido. Até lembramos os nomes e a ocorrência, mas não a lição deixada.

Se missão dada é missão cumprida, lição deixada deveria ser lição aprendida.

Daí, esse hábito (rotina), e o mal que ele pode causar, desaparecem pouco a pouco.

Invisível aos próprios olhos, não conseguimos mais perceber esses erros. E um ditado afirma que "aquilo que não é visto não é lembrado".

E se não lembramos os nossos erros, dificilmente faremos algum esforço para corrigi-los.

Durante uma viagem, notei que o colega não usava o cinto de segurança. Contei o caso de um policial morto ao ser ejetado do carro e bater a cabeça, bem como o resultado da investigação. No final do relato, pedi ao meu passageiro que colocasse o cinto. Então ele olhou pra mim por um instante e ignorou o pedido.

Com a cegueira da rotina, nossos erros não são notados. Mas isso não significa que criminosos não estejam plenamente cientes deles.

E a oportunidade e a vontade fazem os ladrões e os assassinos de policiais.

Cheque de ambiente

 

Quantos cursos de tiro sugerem que o aluno olhe para trás após a série de tiros?

Certamente, você já participou de algum; girou a cabeça em direção aos ombros esquerdo e direito, e olhou para trás.

Mas olhar é diferente de VER, em especial se não há nada que chame a sua atenção. Então, no fim das contas, olhar para trás é uma parte imperfeita do exercício e mera estética de estande.

E não é raro perceber o atirador fazendo o "tático" e errando o básico. Isso pode ser mais uma falha de instrução do que um comportamento inadequado do colega. E isso vai continuar ocorrendo enquanto as coisas forem copiadas em vez de pensadas.

O mundo é tridimensional e o campo de tiro tem 360°. Olhar para trás, logo após o fim da série, força o atirador a ignorar o que pode estar próximo ou além do alvo, bem como suprimir a chance do perigo estar ao lado do policial.

Daí a dinâmica foca no alvo e naquilo que pode estar atrás do atirador, somente. E isso tem sido feito sempre após uma certa quantidade de tiros, como se o número de disparos fosse a chave para a checagem da retaguarda.

Só que essa decisão deve ser do policial, conforme sua percepção do alvo e a leitura do seu campo imediato de tiro, ou seja, aquilo que está no seu horizonte.

Então, a avaliação do ambiente 360° envolve o MOVIMENTO COMPLETO do atirador, no sentido de MUDANÇA DE POSIÇÃO, e não apenas um giro de cabeça.

Se olhar para trás tem aplicação limitada, é preciso executar essa tarefa num estande a toda hora? Penso que não, embora alguns amigos entendam que isso "quebre" a visão em túnel e sirva de lembrete sobre a chance de haver outros alvos.

Assim, o melhor momento para treinar a avaliação do ambiente é quando você está treinando sozinho. Isso permite que você se movimente, mude de posição pra VER tudo ao seu redor e considere barricadas próximas, sem colocar pessoas na linha de tiro.

Você também pode inserir alvos secundários em posições diferentes para ter algo pra procurar e prestar atenção. Dependendo da posição no estande, você ainda pode atirar neles e complementar seu treino.

Mas se você vai só girar a cabeça no treino, talvez seja mais proveitoso se concentrar na sua habilidade de tiro.

É muita firula para o meu gosto

 

"Quando você pressiona a tecla do gatilho de uma arma de fogo, pequenas células sensoriais nas pontas dos dedos dão início a um processo.

Impulsos elétricos percorrem o organismo e se comunicam com o Sistema Nervoso Central (SNC). Nesse momento, entra em ação a memória de longo prazo, que avalia se as posições dos dedos estão corretas e se a pressão do dedo indicador está na faixa de 3,14 pi.

Se tudo estiver certo, o policial fará o tiro. Caso contrário, um impulso de retorno seguirá do SNC até as mãos do atirador, forçando um reajuste da empunhadura. Esse impulso de retorno ou 'fart lighting' é baseado na produção de dois compostos químicos: C7H16 e NaNO3.

O pesquisador Darbolclimps Spergoglinfield, na defesa de sua Teoria Geral da Administração Aplicada, disse que "Todas essas questões, devidamente ponderadas, levantam dúvidas sobre se a expansão da atividade causa impacto indireto na reavaliação das diretrizes de desenvolvimento para o futuro."

Mas isso só ocorre em situações de calma. Durante um confronto, o perispírito inibe a exigência de uma pressão no gatilho de 3,14 pi para dar lugar a uma puxada de 200 Bar ou quase 3000 Psi.

Portanto, sistemas de treinos compostos, ambivalentes e duplicados permitem que o atirador experimente as duas formas de pressionar o gatilho de uma arma."

Trecho do meu novo livro 'Tiro Intergalático - Conectando tudo com
tudo para tornar o tiro algo difícil de entender .'

Espero que ninguém leia!

O texto é uma crítica a algumas mirabolâncias no ensino do tiro no Brasil.

Tem certeza que vai fazer isso?

Quantas molas uma pistola pode ter? Por exemplo, a Glock tem 10 molas:

Duas recuperadoras (formando um sistema), do percussor; da trava do percussor, da barra de transferência do extrator, do retém do carregador, do retém do cano, do retém do ferrolho, do gatilho e do carregador.

Com tantas peças sob tensão, alguém pode imaginar que elas precisam de uma ajuda em algum momento.

Mas por que essa ideia só se aplica à mola do carregador? Por que não damos aquela esticadinha nas outras? Afinal, elas também estão trabalhando.

Não parece razoável que projetistas desenvolvam "X" molas e apenas uma não suporte o trabalho para o qual foi feita.

A suposição de que a mola do carregador deve ser esticada pra funcionar melhor se baseia num mito, na incompreensão do projeto e da natureza dos materiais elásticos.

O mito diz que a mola de um carregador, que passa muito tempo comprimida, perde a capacidade de retornar ao estado natural após a compressão. Embora possa haver alguma acomodação, isso está dentro dos limites de funcionamento da mola.

Já vi mola enferrujada, quebrada, suja, mas nunca deixar de funcionar porque ficou comprimida muito tempo.

Além disso, existem dois tipos de deformações:

1) Deformação elástica - que ocorre quando o objeto volta a sua dimensão normal quando a tensão deixa de ser exercida.

2) Deformação plástica - que ocorre quando uma grande tensão é exercida sobre o objeto, causando uma deformação permanente e irreversível, em razão da tensão ter ultrapassado o limite elástico do material.

No caso da mola do carregador, é possível que, após essa esticadinha, não haja mais energia suficiente pra correta operação da peça.

Se o atirador acha que o carregador não está funcionando direito, sugiro que o desmonte e faça a limpeza. Se não resolver, o adequado é trocar o carregador.

Então eu convido os amigos @peritocriminalbarros, @professorjoaobosco e @luiz_gaspar_17 para trazerem a luz da ciência sobre as invencionices e antes que alguém resolva mexer na mola da grampola, na arruela da grapeta ou na rebimboca da parafuseta.

Colete balístico no treino policial (parte 1)


Certamente você já participou de uma aula de tiro aonde instrutores, alunos e policiais usavam coletes balísticos.

Então, uma questão é evidente: isso é necessário?

Se o treino envolve o equipamento que o policial utiliza na atividade operacional, o colete é uma obrigação.

Significa que ele está desenvolvendo a habilidade de operar e interagir com o material, além de avaliar possíveis adaptações e ajustes. Isso é importante num treino com armas longas, aonde são aplicados exercícios de troca de carregador, panes, transição, posições incomuns, etc.

Mas se o treino não exige o colete balístico, porque a habilidade executada não está vinculada ao equipamento, seu uso é desnecessário. Por exemplo, quando o policial está desenvolvendo a habilidade de tiro ou aprendendo algo novo.

É claro que o colete pode ser incluído depois, quando a habilidade aprendida será conectada ao uso de todos os equipamentos.

Assim, o uso do colete depende do treino, do objetivo e da forma como a habilidade está sendo formada.

O uso do colete inadequado ou mal ajustado pode ter um efeito contrário na segurança na linha de tiro. Como muitos dos coletes não são feitos para o porte da arma na cintura, não é raro o policial ter dificuldade para sacar a arma, ver o coldre e coldrear.

Numa situação assim, o aluno acaba inserindo o dedo no gatilho, apontando a arma para o próprio corpo e realizando movimentos atabalhoados na ânsia de seguir o "timing" do exercício.

Outro aspecto da relação colete e coldre é que muitos policiais pensam que podem se comportar como se estivessem à paisana.

Eles querem usar o colete com o mesmo coldre que usam quando estão à paisana e o mesmo posicionamento do dia a dia. Assim, não é raro ver policiais com porte frontal ou traseiro e coldres internos usando coletes também.

O colete exige o porte ostensivo com coldre lateral externo (com alguma distância para baixo ou para o lado), permitindo a primeira empunhadura livre e rápida, especialmente se a arma curta for a única arma de fogo do policial.

Por isso é arriscado treinar com o colete como se estivesse de folga ou com o equipamento inadequado.

 

A falta de sorte pode bater à porta de qualquer um de nós, sem distinção. O imprevisto também.

Ainda que possam ter o mesmo significado, uma diferença sutil é que no azar você planeja algo que pode não funcionar, por motivo além do seu controle. Já no imprevisto, você sequer planeja ou faz isso "mais ou menos".

Ora, se um policial porta uma arma, isso representa a previsibilidade do perigo e a necessidade de defesa.

Infelizmente, essa previsão parece ter curta duração em alguns momentos. Embora portem armas, pessoas acabam não se comportando conforme a previsibilidade do risco.

Vivemos numa pequena bolha, e ainda assim, podemos ser vítimas do azar. Mas outros podem ser vítimas do imprevisto também. E com 500.000 colegas, a pergunta é "quantos estão sob duplo perigo?"

Sair do lugar comum e entrar na pequena bolha é algo possível e necessário para a salvaguarda do policial. Ocorre que isso exige perseverança, pois é preciso nadar contra a correnteza do pensamento incorreto e do mau hábito. E isso significa que é mais fácil sair dessa pequena bolha do que entrar nela.

Destes 500.000 policiais brasileiros, quantos fizeram um curso após o curso de formação? Quantos leem livros ou se interessam por conhecimento extra? Quantos treinam a seco? Quantos investem no equipamento básico? Quantos acreditam que estão imunes ao azar porque são experientes?

Então alguém coloca a arma sem coldre na bermuda, prende o capacete no braço direito e entra no comércio segurando o telefone com a mão esquerda. Só que no local há um roubo em andamento. A vítima tenta sacar, mas não consegue, já que as mãos não estão livres. Daí ela tem sua arma tomada.

A sobrevivência foi um ato divino, sorte ou desinteresse do ladrão, ao menos dessa vez. Na próxima, tudo pode ser diferente para o bem ou mal do policial, pois a escolha, em parte, é dele.

Criminosos possuem mais direitos que todos

 

Ando com saudades dos anos 70 e 80.

Não julgo a tecnologia e o conforto do século XXI. Lembro da simplicidade das relações humanas e a percepção de que as coisas estavam no lugar, mesmo com alguma imperfeição.

E como policial defendo o trabalho dos colegas, aqui ou em qualquer lugar, e indico pontos que podem melhorar, guardada minha insignificância no contexto geral.

Para algumas pessoas, a ocorrência que ilustra o texto sugeriu hesitação, falta de atenção, uso incorreto das tecnologias menos letais e outras coisas.

O fato foi em junho de 2020, mas o vídeo não foi exposto porque a defesa do indivíduo alegou que a polícia criaria uma imagem do cliente como se ele fosse um assassino frio. Daí a promotoria poderia pedir a pena de morte.

Mas depois de ter atirado nos dois policiais, o criminoso fez mais três tiros contra o sargento caído. O tiro que o matou atravessou o colete e atingiu o tórax.

Ele foi o primeiro policial morto em mais de duas décadas no condado de Tulsa (400 mil habitantes).

Então, o chefe de polícia abriu a coletiva de imprensa dizendo que criminosos "possuem mais direitos" que cidadãos e policiais, e que a sociedade "não deveria" ver um criminoso ser executado, "mas aqui estamos assistindo a execução dum policial. Que tipo de sociedade é essa?"

Infelizmente, os colegas americanos estão experimentando aquilo que conhecemos faz tempo.

Tenho a esperança que a ocorrência traga luz sobre o procedimento mais adequado para tratar algo semelhante no futuro.

Inicialmente, penso que a negativa em obedecer às ordens e qualquer indagação sem sentido sobre a ação policial representam um comportamento perigoso. O que o suspeito esconde? Porque não quer interagir?

Sair e voltar para o carro é sempre um outro grande risco. Ele pegou uma arma?
Com base nisso e na dificuldade de obter a cooperação do suspeito, a equipe pode reavaliar a situação e tratar como um "indivíduo barricado".

Daí, outros recursos podem ser usados: cerco, cães, gás lacrimogêneo, jato d'água, etc. Todas essas ações protegem o policial do contato físico com o suspeito que apresenta um comportamento perigoso. Por isso, todas essas tecnologias DEVEM estar disponível SEMPRE para todos os policiais que realizam o patrulhamento diário ou as investigações de crimes.

Muitas vezes o perigo não está só naquilo que você vê, mas no que você desconhece.

Munição no copinho

Mas o policial foi aprovado num concurso difícil! Ele passou no curso de formação! Fez curso de tiro e sabe atirar! O policial tem muitos anos de experiência! Ele é um especialista em segurança! É versado em técnicas de defesa pessoal!

Quando tudo vai bem, damos as costas para os problemas. Se o colega os aponta e pede uma solução (num briefing ou por escrito), logo é taxado de chato, complicado, reclamador e preguiçoso, ainda que tenha razão.

Líderes precisam resolver problemas com soluções adequadas, visando, sobretudo, a proteção do colega (e antes que seja tarde). O problema é encontrar líderes!

E vamos convivendo com os problemas na esperança que não tenham o potencial para destruir vidas. É como se morássemos perto de um vulcão "adormecido".

Então uma viatura trava a direção durante curvas e com alto giro do motor. Se não é novidade, porque o modelo ainda é usado?!

A tela do sistema de informação é instalada na frente do airbag do passageiro. Se ele for acionado, a tela pode ser arremessada contra a cabeça do policial. Ninguém percebeu antes?!

Oito anos após receber sua arma, o policial ganha a primeira cota de munição num copinho de água.

Daí o vulcão entra em erupção e o resultado é evidente. Mas isso é um ato da natureza.

No caso do homem, basta apontar o dedo para o policial vítima do problema (não solucionado) e dizer: "Ele fez um curso de formação! Sabia atirar e dirigir! Era experiente! Ninguém disse para ele fazer desse jeito! Era só me ligar!"

E finalmente: "Ele devia ter colocado no papel!"

Abordando à paisana


A notícia preliminar diz que um guarda civil abordou um homem que andava pela rua em traje civil.

Mas o homem era um policial. Se o guarda civil (GC) estivesse uniformizado e com outro colega numa viatura caracterizada, o evento teria outro fim.

O GC para o carro particular no meio da rua e abre a porta. Por alguma razão, o abordado faz meia volta e vai até o carro. Pouco tempo depois, ele saca a arma e dispara contra o motorista, que também atira. Ambos são atingidos num confronto que dura cerca de dois segundos.

O GC consegue sair do carro, mas só para cair no chão. O policial, atingido duas vezes no tórax, continua de pé e anda pelo local.

No livro Sobrevivência Policial, trato isso como ERRO DE IDENTIDADE, quando policiais à paisana são confundidos e acabam vítimas da própria polícia.

Contudo, não sabemos o que levou nosso colega GC a agir, nem o que passou pela mente do colega policial na hora em que decidiu atirar.

Infelizmente, para os dois só restam nossas orações. Mas qualquer evento sempre deixa seu legado para os demais policiais. Daí, não é uma análise do que eles poderiam ter feito, mas o que NÓS podemos fazer.

Aprendemos a não trabalhar sozinhos. Se o princípio serve para o trabalho, que já é perigoso, se aplica ainda mais para a folga, quando o risco é maior.

Incutimos em nossas mentes que somos caçadores, predadores, cães pastores, guerreiros e combatentes. Isso não significa que devemos entrar numa guerra com grande chance de perder. Ou melhor, o ímpeto para vencer a batalha pode fazer você perder a guerra.

Abordar alguém enquanto se está dentro da viatura não é adequado, pois as amarras que limitam o movimento e a visualização da ocorrência ainda estão atuando.

Além disso, é preciso uma avaliação apurada antes de uma interferência. Criminosos agem em grupo. Assim é pouco provável que um homem sozinho, andando na rua, cuidando da vida e dos pensamentos, se encaixe num comportamento suspeito.

Se há dúvida, a sugestão é que você pare o carro e observe o "suspeito". Siga-o de longe, como numa vigilância. Se a suspeita for GRANDE, ligue 190.

Obs.: tudo muda quando você percebe que vai ser abordado por suspeitos. Por isso, policiais à paisana devem usar distintivos durante o trabalho para não serem confundidos, caso abordem um colega de folga ou sejam abordados por policiais uniformizados.

Perfil de lesão


Creio que essas invenções estão em ordem cronológica:

Mãos e pés; pau e pedra; machado e lança; funda; arco e flecha; arco composto; catapulta, balista e trebuchet; besta de repetição; arco longo; pólvora; canhão e canhão de mão; arcabuz e mosquete (mecha, roda, pederneira, percussão externa, Minie Ball); fuzil (Lefaucheaux, Needle-gun, ferrolho de dupla ação); e as que conhecemos hoje.

Como toda arma tem um objetivo, muitos pesquisadores trabalharam em busca da neutralização do oponente.

Os estudos de Emil Kocher, John Pershing, Neville Sneyd, John Thompson e Louis LaGarde, Julian Hatcher (RSP), Frank Chamberlin, o Relative Incapacitation Index, Martin Fackler (Wound Profile), o experimento de Suneson e Hansson, um tal teste de Strasbourg, Marshall e Sanow (Stopping Power) e FBI (Wound Ballistic Workshop).

Neste último caso, o FBI concluiu que o fator isolado mais importante para a incapacitação do agressor é a PENETRAÇÃO. Logo, a expansão do projétil é um bônus.

Esses pesquisadores concluíram, nos últimos 150 anos, que a energia cinética, o choque hidrostático, o momentum, o choque neurogênico, o stopping power e a cavidade temporária (nas armas curtas) não incapacitam.

Guardada a devida proporção, até um antigo ditado romano já dizia: Um talho é só um corte, uma estocada é a morte.

Eis que surge o documento "Análise comparativa de munições", uma avaliação entre as munições 9 mm Luger +P+ JHP 115 grains e a .40 S&W JHP 180 grains.

O teste avaliou a velocidade, a penetração e a cavidade temporária.

A .40 S&W penetrou 4,65% a mais que a 9mm Luger. A cavidade temporária da .40 S&W foi 13,75% maior que a concorrente.

Concluiu-se que a .40 S&W é a mais indicada para o uso policial, pois além da penetração, produziu maior cavidade TEMPORÁRIA. Daí, o estudo avaliou que a transferência de energia é fator fundamental na incapacitação do agressor.

Toda pesquisa é importante. Mas concluir um estudo com base em conceitos abandonados há décadas demonstra que algo está errado.
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Penso que nosso curso de pós-graduação em balística terá que abrir novas turmas @jcunhaneto12, @paulobedraninstrutor, @peritocriminalbarros, @docmaniglia, @professorjoaobosco, @luiz_gaspar_17.

Inocente à primeira vista?

Na frente da loja de um posto de gasolina há um banco aonde estão sentados uma criança, que acompanha o trabalho da mãe, e seu tio.

De repente um homem, fora do juízo normal, se senta ao lado da criança e a abraça, deixando a família imóvel diante da agressão.

Então o homem tenta tomar a criança do tio, e um cabo de guerra tem início. A mãe é avisada e, de pronto, socorre e trás o filho pra si. Daí o agressor passa a discutir com o tio da criança.

As pessoas ficam olhando, com exceção de um motociclista que faz menção de intervir, até que o agressor se volta contra ele.

Um senhor percebe a confusão e caminha em direção ao agressor, que logo o escolhe como vítima. O senhor tenta se afastar, mas sua arma cai no chão. Ele percebe o problema e tenta chutar a arma para longe do agressor, mas é tarde.

O indivíduo pega a arma e dispara todos os tiros contra o senhor. Pode-se analisar muitas coisas nessa triste ocorrência, e muito já foi dito nas redes sociais.

Mas a reflexão é: vidas seriam poupadas se as pessoas fossem firmes? Vítimas seriam reconfortadas se as testemunhas fossem caridosas com elas?

Acredito que SIM. O problema é que o medo tem sido reforçado nas pessoas, que evitam pensar, falar e agir, inclusive na defesa do inocente injustamente atacado.

E o único que foi firme, também foi vítima do azar. Ele não se aproximou com a arma em punho. Mas foi lá para ajudar.

E o senhor tinha razão, pois nenhuma arma era necessária na situação. Era preciso pulso firme, e nossos pais, hoje idosos, têm isso de sobra.

Não me refiro a fazer justiça por conta própria (se alguém entendeu isso, não entendeu nada).

Agora imagine que a criança é alguém que você ama. O agressor se senta ao lado dela, a abraça (toca nela) e tenta levá-la. Você se levanta, coloca a criança assustada atrás de você para protegê-la, mas o agressor continua puxando.

Será que um bom e certeiro golpe não cessaria a agressão imediatamente?

"Mas ele era só uma pessoa fora de si!" Mas isso não o impediu de reconhecer, pegar e descarregar uma arma de fogo contra um inocente, impediu?!

My bag is full and down

Um amigo por quem também tenho admiração, @paulobedraninstrutor, escreveu um texto denominado "Fábrica de mestres".

Como concordo com ele e tenho a impressão que o tiro tem se tornado quase uma ciência intergalática, compartilho meu comentário (com alguns acréscimos).

Um certo filme de operações especiais no Brasil, apesar de excelente, deixou um efeito colateral: a ideia de que ou você é de operações especiais ou não é nada. Convencional foi o nome dado.

Não vejo problema na questão das OpEsp. Contudo, não podemos deixar de lado aqueles que estão no patrulhamento atendendo as ocorrências diárias ou nas investigações à paisana tentando solucionar crimes e encontrar suspeitos. É preciso um olhar na direção deles também, já que são os mais vitimados.

Mas ainda vivemos sob esse efeito, inclusive nas linhas de tiro, onde instrutores e colegas comparecem como se fossem pra guerra. Tudo é tático! O curioso que andam de calça jeans, tênis e camiseta nos dias normais.

E esse deve ser o "uniforme", pois é assim que se enfrenta o perigo na realidade nacional. Quando ministro certas aulas, meu uniforme é o tênis, a calça jeans e a camiseta. Assim falo a linguagem do meu colega.

Ao mesmo tempo vivemos a indústria do IAT, reinventando a roda, descobrindo a galinha dos ovos de ouro, "redescobrindo" novidades das décadas de 50, 60, 70, 80, 90.

Agora percebo a divisão entre o tradicional, o intermediário e o avançado com se fossem coisas apartadas. Só que no tiro, as decisões e as ocorrências continuam as mesmas.

Como tenho a concordância de outro grande amigo, @agrelli.boi, o policial precisa saber 6 coisas:

1) Atirar.
2) Sanar panes.
3) Recarregar.
4) Buscar proteção.
5) Aplicar um torniquete.
6) E o mais importante, DECIDIR a hora de fazer isso tudo.

E para o item 6, nós só precisamos duma boa e sincera conversa. Nada mirabolante...

Também acho que estou ficando velho, já que outro amigo só me chama de rabugento.

Parafrasendo um grande policial (@aguia.28), no seu divertido inglês: My bag is full and down!"