quarta-feira, 12 de junho de 2013

A arma que mata está com o criminoso. (Parte 3)

Essa é a terceira e mais longa parte do artigo "A arma que mata está com o criminoso." Por essa razão, pede-se que o leitor tenha paciência e tempo suficientes para a leitura do texto.

Um levantamento citado no recém-lançado Mapa da Violência 2013 - Mortes Matadas por Armas de Fogo1 (uma compilação sobre a mortalidade por armas de fogo entre os anos de 1980 e 2010) demonstra o seguinte:

"Segundo estimativas realizadas por Dreyfus e Nascimento4, na última década o país contava com um vasto arsenal de armas de fogo:
·         15,2 milhões em mãos privadas
·         6,8 registradas
·         8,5 não registradas
·         Dentre elas 3,8 milhões em mãos criminais"

Contudo, outra pesquisa realizada também por Dreyfus e Nascimento2 (2010) informa o seguinte sobre as armas no Brasil:
  • 14.408.226 de armas estão em circulação;
  • 3.688.506 são registradas;
  • 10.719.720 não registradas, das quais 1.219.873 foram destruídas ou entregues durante a companha do desarmamento;
  • Sobraram 9.499.847 de armas não registradas;
  • Dentre elas 5.256.079 estão nas mãos de criminosos. 
Para alcançarem esses números os pesquisadores da ONG Viva Rio utilizaram algumas informações, dentre elas, o banco de dados da Polícia Civil do Rio de Janeiro referente as armas registradas e as apreendidas. Feito um cruzamento entre essas categorias, os pesquisadores concluíram que das armas apreendidas, 25,6% eram registradas. Eles também consideraram que as armas apreendidas representavam o universo de TODAS as armas em circulação. Os cálculos realizados nesse estudo podem ser verificados na página 102 do relatório Small Arms in Brazil: Production, Trade, and Holding disponível no endereço http://www.smallarmssurvey.org/fileadmin/docs/C-Special-reports/SAS-SR11-Small-Arms-in-Brazil.pdf. Para produzirem essas estimativas, os pesquisadores informaram a ausência de estatísticas oficiais sobre armas de fogo não registradas.

Grosso modo, pode-se concluir que a política desarmamentista só conseguiu registrar apenas 25,6% das armas curtas dos cidadãos e manter 66% sem qualquer conhecimento e controle. Apesar de 25,6% das armas apreendidas possuírem registro, isso não significa que foram os proprietários legítimos os responsáveis pelos crimes cometidos com essas armas. Quer dizer, em algum momento da história de cada arma apreendida houve um registro formal da sua existência/propriedade. Isso implica afirmar que o arsenal nas mãos criminosas pode ultrapassar 5.256.079 de unidades. Isso sem contar as armas "importadas".

Ainda bem que o Mapa da Violência utilizou o termo "estimativas", pois o Serviço de Informação ao Cidadão da PF3 informou que atualmente existem cerca de 1.850.000 de armas com registro válido no Brasil. Se a estimativa não consegue informar o número correto de armas registradas, então é possível afirmar que os números carecem de credibilidade. Mas o pior é ESTIMAR TODO O UNIVERSO de armas registradas, não registradas e aquelas que estão nas mãos de criminosos com base em armas apreendidas. Em razão do desencontro dos dados estatísticos é possível até afirmar que o cenário não seja tão caótico como pode parecer no que diz respeito à quantidade de armas de fogo empregadas em ações violentas. Mas uma coisa é certa: a violência não possui relação simplesmente com a arma de fogo, mas principalmente com a mentalidade criminosa e a benevolência estatal com que são tratados os bandidos brasileiros.
Se isso não fosse o suficiente, o portal da Campanha Nacional do Desarmamento, na seção Perguntas e Respostas, diz:

"Desarmar a população não vai aumentar a insegurança nas ruas? Pelo contrário. A POPULAÇÃO FICARÁ AINDA MAIS SEGURA. Dados oficiais mostram que 80% DOS CRIMES ocorridos no Brasil são REALIZADOS COM ARMAS ADQUIRIDAS LEGALMENTE." (Grifo nosso). 

Então, na visão governamental a maioria das mortes violentas causas por armas de fogo é o resultado do uso indevido de 3.688.506 armas registradas por cidadãos brasileiros. E apenas 20% das mortes são provocadas pelas 9.499.847 armas não registradas, das quais 5.256.079 estão nas mãos de criminosos. Fala sério! 
Contudo, o estudo elaborado pela ONG Viva Rio informa que das armas apreendidas pela polícia, APENAS 25,6% SÃO REGISTRADAS, ou seja, ADQUIRIDAS LEGALMENTE. 
O sumário do capítulo 2 do Small Arms Survey 20074 esclarece a questão das estatísticas sobre armas no mundo:

"Não existe nenhuma técnica científica que possa assegurar com certeza quantas armas existem em posse dos civis no mundo. Os dados do Small Arms Survey por país foram reunidos usando numerosas fontes e métodos. Sempre que possível, esses números são baseados em registros oficiais e em estimativas independentes usadas para uma melhor compreensão. As estatísticas oficiais sobre registros de armas são a fonte mais confiável de informações, mas contam apenas uma parte da história. Quando nem dados oficiais, nem independentes estão disponíveis, as estimativas são baseadas em análises estatísticas correlatas. A fontes mais confiáveis de informação são as mais utilizadas; os métodos menos confiáveis são introduzidos à medida que se torna necessário assegurar resultados mais completos." 

Infelizmente, o conceito do desarmamento paira sobre a ideia de que menos armas significam menos mortes. O Mapa da Violência 2013 informa o seguinte em relação a idade, sexo e raça/cor da vítimas:

"[...] ao analisar a evolução da mortalidade por armas de fogo no período de 1980 a 2010, o crescimento da mortalidade entre os jovens foi bem mais intenso que no resto da população. Se para todas as idades os números cresceram 346,5% ao longo do período, entre os jovens esse crescimento foi de 414,0%. Também os homicídios juvenis cresceram de forma mais acelerada: na população total foi de 502,8%, mas entre os jovens o aumento foi de 591,5%. Esse fenômeno pode ser melhor interpretado se dividirmos a população total em dois grandes grupos: os jovens – população na faixa de 15 a 29 anos de idade – e os não jovens, o resto da população (isto é, tanto aqueles com menos de 15 anos, quanto os com idade acima de 29 anos)." (p. 33). 
"Pode ser vista a enorme concentração de mortalidade nas idades jovens, com pico nos 21 anos de idade, quando os óbitos por AF (armas de fogo) atingem a impressionante marca de 56,4 mortes por 100 mil jovens nessa idade." (p. 34). 
"Outra característica que os registros do SIM permitem verificar é a raça/cor das vítimas. Vemos na tabela 6.4 que as taxas de homicídio da população preta - 19,7 óbitos para cada 100 mil pretos - são 88,4% maiores que as taxa brancas - 10,5 óbitos para cada 100 mil brancos. Isto é, morrem, proporcionalmente, 88,4% mais pretos que brancos. Já as taxas de óbitos por AF dos pardos são 156,3% maiores que a dos brancos." (p. 38). 

Porém, a legislação brasileira sobre armas de fogo informa que o interessado em adquirir, registrar ou portar uma arma deve ter, no mínimo, 25 anos de idade. Curiosamente, essa é a idade em que o Mapa da Violência 2013 informa a diminuição gradual na taxa de mortalidade por AF e idades simples. 

Um estudo do IBGE5 informou que dentre as pessoas ocupadas no Brasil em 2010, os amarelos e os brancos detiveram salários médios 37,6% e 26,9% ACIMA da média. Os pardos e negros receberam salários 29% e 31,3% ABAIXO da média nacional. Assim, pode-se deduzir que, em razão do alto custo para aquisição, registro e porte de armas de fogo legalizadas, a posse dessas armas seja maior entre os brancos do que entre os negros e pardos. Desse modo, DEVERIA SER VERIFICADA UMA TAXA DE HOMICÍDIOS MAIOR ENTRE ADULTOS, BRANCOS E COM RENDA ACIMA DA MÉDIA NACIONAL. MAS ESSA TAXA É MAIOR ENTRE OS JOVENS NEGROS E PARDOS, conforme comprova o Mapa da Violência 2013. Logo, não são as armas legalizadas que estão matando, mas aquelas não registradas, ilegais e nas mãos criminais. Exatamente as armas de fogo que o rigor da legislação não consegue identificar e controlar. 

O estudo Small Arms Survey 2007, no capítulo 7, Mapeando um país dividido: Violência por armas de fogo e urbanização no Brasil (p. 9) declara haver determinantes para os homicídios por AF no Brasil, ou seja, os fatores de risco. São eles: 
  • Densidade demográfica: "Em regra geral, quanto maior o número de habitantes por km2, mais alta a taxa de homicídios por arma de fogo em um dado município. O tamanho da população, que, em muitos casos, é um indicador importante, não é tão forte." (p.10);
  • Desigualdade: "a desigualdade é um fator importante para os homicídios por arma de fogo no Brasil". Nesse caso a desigualdade se refere à distribuição de renda;
  • A proporção jovem na população;
  • Jovens fora da escola e que não trabalham;
  • Famílias vulneráveis: "família uniparental chefiada por mulher, com filhos menores de 21 anos que não trabalham. Os resultados são inequívocos, e indicam uma estrutura familiar que provavelmente reproduz as condições de desigualdade, gerando crianças e jovens muito expostos à violência por arma de fogo." (p. 11);
  • Existência de armas de fogo no domicílio. 
Então, é possível que jovens que não estudam ou trabalham, que vivem em aglomerados ou bairros populosos, sob o "cuidado" de uma família desestruturada e de baixa renda tenham condições de adquirir armas de fogo registradas no mercado lícito? Ou essas são as características básicas dos criminosos juvenis que portam armas sem registro para cometerem crimes?

Para perceber que a concessão de portes de armas de fogo não possui relação com as taxas de homicídios, basta analisar a quantidade expedida de portes de armas pela PF entre os anos de 2007 e 2012 com a variação percentual do número de óbitos entre os anos de 2006 e 2010.

Região
Portes concedidos
(2007/2012)
Variação - nº de óbitos
(2006/2010)
Variação - taxa de óbito - 100 mil habitantes
(2006/2010)
Ordem segundo taxas e nº de homicídios por AF
(2006/2010)
Ordem segundo concessão de portes de armas
(2007/2012)
Norte
626
+61,40%
+53,3%
Nordeste
1.649
+34%
+30,23%
Centro-Oeste
3.022
+18,95%
+12,36%
Sul
5.335
+10,20%
+10,17%
Sudeste
21.433
-27,97%
-28,90%
Fontes: PF e Mapa da Violência 2010. 

Avaliando a tabela, fica claro que não existe relação entre o aumento de armas legalizadas e portadas pelos cidadãos com o aumento do número ou a taxa de homicídios por AF, pois é exatamente o contrário. Quer dizer, as regiões que mais emitiram autorizações para o porte de armas registradas são as mesmas que apresentam a menor quantidade de assassinatos. O caso mais evidente é o Estado de São Paulo, que emitiu 21.433 portes de armas e apresentou um declínio acentuado nas mortes por armas de fogo. No ano 2000, o Estado de São Paulo ocupava a sexta colocação no ordenamento segundo as taxas de óbitos, mas em 2010 caiu para a 24º posição. Isso representou um declínio de 67,5% nas mortes provocadas por armas de fogo no estado. Portanto, menos armas NÃO significam menos mortes.
 

O artigo Salvando Vidas6, publicado no Correio Braziliense em 03/01/2013, demonstra como os números podem ser manipulados para provar a tese desarmamentista. Parte do artigo informa:


"Como medir os efeitos do Estatuto e das medidas associadas a ele? Precisamos de um 'antes' e de um 'depois'. Tomando por base todos os anos do CID 10, vemos que morreram por PAF 26.481 brasileiros em 1996; 27.753 em 1997; 30.211 em 1988; 31.198 em 1999; 34.985 em 2000; 37.122 em 2001 e 37.979 em 2002, ano anterior ao Estatuto. As mortes por PAF aumentaram em mais de 2 mil por ano (2.072) até 2002, inclusive. Sem modificações como o Estatuto, que previsão poderia ser feita para os anos posteriores à Lei nº 10.826/2003, seguindo a progressão anterior? SERIAM, DE 2004 A 2010, SUCESSIVAMENTE: 42.123, 44.195, 46.267, 48.339, 50.411 E 54.555. Devido ao crescimento observado antes do Estatuto, mais de 200 mil brasileiros seriam mortos pelas armas de fogo." (Salvando Vidas, 2013). (Grifo nosso). 


Agora, o artigo foi publicado em 2013, mesmo ano em que foi publicado o Mapa da Violência, aquele que contempla a análise das mortes ocorridas de 1980 a 2010. O MAPA DEMONSTRA A PROGRESSÃO DAS MORTES DE 2004 A 2010, SUCESSIVAMENTE: 37.113, 36.060, 37.360, 36.840, 38.658, 39.677 E 38.892. Então, perceba que o autor do artigo decidiu realizar uma “projeção” de mortes para majorar os números em benefício do Estatuto do Desarmamento. Ele decidiu NÃO UTILIZAR OS DADOS CONCRETOS que já estavam disponíveis e que também foram publicados no Mapa da Violência. Os dados compilados de 1996 a 2002 são exatamente os mesmos, curiosamente antes do estatuto. O autor ainda esqueceu-se de informar que a quantidade de mortes foi recorde em 2003, ano de lançamento do estatuto, com 39.325 óbitos. A adivinhação de possíveis mortes publicada no artigo (de 2004 a 2010) totalizou 338.373 óbitos. Já os dados verdadeiros somam 264.600. Uma pessoa ingênua poderia supor que a projeção (338.373) menos o número real (264.600) indicariam o "salvamento" de 73.773 vidas. Mas essa ideia só possui cabimento porque os dados verdadeiros foram MAJORADOS para que a comparação com a realidade demonstrasse algum efeito positivo da ação desarmamentista. Se o desarmamento fosse realmente eficaz haveria um declínio real no número de homicídios, ou seja, algo bem abaixo de 264.600 mortes.


Excluindo o ano de 2003, os 7 anos anteriores ao estatuto (1996 a 2002) somaram 225.729 mortes por armas de fogo. Já os 7 anos posteriores (2004 a 2010) totalizaram 264.600 óbitos. Ou seja, um aumento real de 17,22%. O artigo faz crer que o desarmamento seria responsável pelo salvamento de mais de 200.000 pessoas. Mas na verdade, a entrega de armas de fogo não salvou uma vida sequer, em números absolutos.
A questão da manipulação e interpretação dogmática dos dados e a deficiência estatística são tão preocupantes que o próprio Mapa da Violência informa que "Não se pode negar que as informações do sistema de óbitos ainda estão sujeitas a uma série de limitações e críticas." (p. 8). E segue:

"A primeira grande limitação, assumida pelo próprio SIM, é o sub-registro, devido à ocorrência de inúmeros sepultamentos sem o competente registro, determinando uma redução do número de óbitos declarados. Não só a quantidade, mas também as qualidades dos dados têm sofrido reparos: mortes sem assistência médica que impedem a correta indicação das causas e ou lesões, deficiência no preenchimento adequado da certidão, etc." (p. 8). 

Nesse sentido, é certo afirmar que o número de vítimas de armas de fogo ultrapasse consideravelmente aquele registrado pelo Estado. Isso é outro indicativo que campanhas desarmamentistas não são as estratégias eficazes para a redução dos níveis de violência e criminalidade. 

Além disso, todas as mortes registradas e contabilizadas no Mapa da Violência 2013 incluem “todos aqueles óbitos acidentais, por agressão intencional de terceiros (homicídios), autoprovocadas intencionalmente (suicídios) ou de intencionalidade desconhecida, cuja característica comum foi a morte causada por uma de fogo.” (p. 7).

É possível que as políticas de controle de armas possam reduzir o número de suicídios por armas de fogo, mas não se provou ainda que elas sejam capazes de reduzir o risco global de suicídio em qualquer país. Afinal, suicidas comprometidos com o autoextermínio serão bem sucedidos em qualquer circunstância (saltando de edifícios e pontes, saltando na frente de veículos, ingerindo medicamentos, substâncias venenosas ou drogas ilícitas, se enforcando, e assim por diante). A questão do suicida não é a arma, mas o empenho em se matar. Portanto, culpar a arma de fogo no caso de mortes autoprovocadas é outro erro de análise. Já os acidentes são o resultado da imprudência, negligência ou imperícia, e novamente eles possuem relação com o comportamento da pessoa e não com a arma de fogo em si. Até policiais e militares em todo o mundo, acostumados com o manejo de armas de fogo, se envolvem em acidentes de tiro. Então, resta o que realmente interessa: os homicídios. E para isso basta mostrar os números absolutos de mortes a partir de 1997 (ano de instituição do Sistema Nacional de Armas) e os números de mortes por 100 mil habitantes.

Ano
Nº de homicídios
(pop. total)
Comparação (ano anterior)
Nº de homicídios
(pop. jovem)
Comparação (ano anterior)
1997
24.445
*
13.680
*
1998
25.674
+ 1.229
14.643
+ 963
1999
26.902
+ 1.228
15.475
+ 832
2000
30.865
+ 3.963
18.252
+ 2.777
2001
33.401
+ 2.536
19.800
+ 1.548
2002
34.160
+ 759
20.567
+ 767
2003
36.115
+ 1.955
21.755
+ 1.188
2004
34.187
- 1.928
20.827
- 928
2005
33.419
- 768
20.336
- 491
2006
34.921
+ 1.502
20.939
+ 603
2007
34.147
- 774
20.546
- 393
2008
35.676
+ 1.529
21.475
+ 929
2009
36.624
+ 948
21.912
+ 437
2010
36.792
+ 168
21.843
- 72
Fonte: Mapa da Violência 2010.

Ano
Nº de homicídios
(em 100 mil)
Comparação (ano anterior)
Nº de homicídios
(em 100 mil)
Comparação (ano anterior)
1997
15.3
*
30.5
*
1998
15.9
+
32.2
+
1999
16.4
+
33.6
+
2000
18.2
+
38.1
+
2001
19.4
+
40.7
+
2002
19.6
+
41.7
+
2003
20.4
+
43.5
+
2004
19.1
-
41.1
-
2005
18.1
-
39.0
-
2006
18.7
+
39.6
+
2007
18.0
-
39.1
-
2008
18.8
+
41.3
+
2009
19.3
+
42.4
+
2010
19.3
=
42.5
+
Fonte: Mapa da Violência 2010.

Portanto, a ideia de que menos armas de fogo representam menos assassinatos não se sustenta, principalmente quando se considera o aumento da população. A verdade é que, na média, a situação piorou. 

Intervalo
Média do nº de homicídios (pop. total)
Média do nº de homicídios (em 100 mil)
1997 – 2003
30.223
17.88
2004 - 2010
35.109
18.75

 O estudo trás outra informação:


“A evolução ao longo dessas décadas não foi homogênea. Entre 1990 e 2003 o crescimento foi relativamente sistemático e regular, com um ritmo muito acelerado: 7,3% ao ano. Depois do pico de 39,3 mil mortes em 2003, os números, num primeiro momento, caíram para aproximadamente 36 mil, mas depois de 2008 ficam oscilando em torno das 39 mil mortes anuais. O Estatuto e a Campanha do Desarmamento, que iniciam em 2004, pareceriam ser fatores de peso na explicação dessa mudança.” (p. 10). 

Ora, se o argumento de que “O volume desse arsenal guarda correspondência com a mortalidade que origina.”, ou seja, menos armas menos mortes, então era preciso perceber uma redução do número de mortes. Obviamente, essa redução não ocorre como o próprio estudo afirma:

“Os dados indicam que essas políticas, se conseguiram sofrear a tendência do crescimento acelerado da mortalidade por armas de fogo imperante no país, não tiveram suficiente efetividade ou força para reverter o processo e fazer os números regredirem, como deverá ser analisado ao longo do estudo.” (p. 12). 

A conclusão de que menos armas em circulação, principalmente as legalizadas, é fator preponderante para a redução das mortes por armas de fogo pode ser desconstruída com base nos dados apresentados pelo Small Arms Survey 2007 e as estatísticas de homicídios por AF da Organização das Nações Unidas (ONU) de 20118. O cruzamento dos dados demonstra que os países com maior quantidade de armas são os que apresentam os menores índices de homicídios por AF. Os maiores níveis de mortes são apresentados nos países com menores quantidades de armas (Colômbia, BRASIL, África do Sul e Filipinas).


País
Armas por 100 mil habitantes
(2007)
Homicídios por AF por 100 habitantes (ONU)
Estados Unidos
90
3.2 (2010)
Iêmen
61
-
Finlândia
56
0.4 (2009)
Suíça
46
0.8 (2004)
Iraque
39
-
Sérvia
38
0.5 (2009)
França
32
0.1 (2007)
Canadá
31
0.5 (2009)
Suécia
31
0.4 (2004)
Áustria
31
0.2 (2006)
Alemanha
30
0.2 (2010)
Arábia Saudita
26
0.3 (2008)
Grécia
23
0.3 (2006)
Angola
21
-
Tailândia
16
5.0 (2006)
Austrália
15
0.1 (2009)
México
15
10 (2010)
África do Sul
13
17.0 (2007)
Turquia
13
0.8 (2006)
Argentina
13
3.0 (2008)
Itália
12
0.7 (2006)
Paquistão
12
-
Venezuela
11
39.0 (2009)
Espanha
11
0.2 (2009)
Rússia
9
-
Brasil
9
18.1 (2008)
Colômbia
7
27.1 (2010)
Israel
7
0.1 (2007)
Ucrânia
6
0.2 (2009)
Inglaterra
6
0.1 (2007)
Irã
5
-
Filipinas
5
8.9 (2003)
Índia
4
0.3 (2009)
China
3
-
Nigéria
1
-
                                   Fontes: Small Arms Survey 2007 e Onu.



Colômbia, Brasil e África do Sul possuem políticas desarmamentistas e existem outros países com restrições severas as armas de fogo, tais como a Venezuela. Porém, o que se observa é uma mortandade elevada justamente nos países com políticas desarmamentistas, polícias despreparadas e desmotivadas, sistema de investigação obsoleto, sistema prisional falido, condescendência para com os criminosos, apatia legislativa, incompetência e ideologia estatal, dogmatismo de entidades de direitos humanos, etc.

O relatório da ONU denominado Violence, Crime and Illegal Arms Trafficking in Colômbia7 elaborado pelas Nações Unidas em 2006 apresenta algumas curiosidades que merecem  menção:

“Embora seja possível estabelecer uma correlação entre as armas curtas e as armas portáteis com o homicídio intencional (a violência exercida nos contextos de delinquência ou conflito armado), não é possível estabelecer que as armas de fogo, legais ou ilegais, aumentem ou promovam a violência.” (p. 9). 
[...] a percentagem de armas de fogo envolvidas em infrações comuns, tais como roubos e assaltos, não é tão elevado como seria de se esperar. Em uma amostra de 89.278 infrações, apenas 26% delas (23.478) foram cometidas com armas de fogo. Os crimes em que as armas de fogo são mais utilizadas são os conflitos por terras (96%) e o roubo de veículos (40%). (p. 14). 
“Armas de fogo também não contribuem significativamente para o suicídio. Dos 1.786 suicídios ocorridos na Colômibia durante o ano de 2005, apenas 23% foram cometidos com armas de fogo. A taxa total de suicídio para esse foi de 3.8 por 100 mil. A taxa de suicídios com armas de fogo foi de 0.9. De uma perspectiva internacional, as taxas de suicídio são baixas na Colômbia. Na América do Norte, a taxa é de 5.5 e na Europa Ocidental, 1.7. A forma mais comum de suicídio na Colômbia em 2005 foi o enforcamento para os homens, e o envenenamento para as mulheres.” (p. 14).
“Os diferentes estudos e projetos de pesquisa que analisam a relação entre as armas de fogo e a violência são caracterizados pelo seu alto teor político, ideológico e emocional, independentemente do país em que são levados a efeito. Isso não é surpreendente, já que as armas de fogo não apenas involvem interesses econômicos importantes e desempenham um papel crucial no equilíbrio de poder, mas porque também representam o instrumento que causa a maioria das mortes e, consequentemente, o maior pesar entre os seres humanos. Contudo, como apontado no Small Arms Survey, é importante ter em mente que apesar das armas serem usadas em atos violentos, isso necessariamente não significa que elas são a causa de tais atos, ou que elas contribuem para o aumento da violência.” (p. 15). 
“A baixa participação das armas de fogo nos crimes de lesão corporal (3%), suicídios (23%) e crimes comuns (26%), bem como sua participação acentuada em homicídios (70%) e massacres (90%), indicam que as armas de fogo na Colômbia não são utilizadas indiscriminadamente pela população e que uso está restrito a situações muito específicas para o exercício “profissional” da violência.” (p. 16). 

Mas a verdade é simples. É mais fácil para um governo esconder ou manipular a verdade que "gastar" um tostão que seja para implantar políticas sérias de segurança pública para proteger o eleitor inteligente. Para o eleitor burro basta uma propaganda falaciosa e um bolsa "qualquer coisa". É mais fácil combater você que combater o bandido!

Na quarta e última parte desse artigo você saberá por que é grotesco comparar crimes urbanos violentos com situações de guerra.

Fonte 1: Mapa da Violência 2013
Fonte 2: Small Arms in Brazil: Producion, Trade, and Holdings, 2010
Fonte 3: E-mail nº 001/2012-SIC/DIREX/DG/DPF
Fonte 4: Small Arms Survey 2007
Fonte 5: http://www.fecomercio.com.br/blog/2012/08/10/ibge-confirma-diferencas-significativas-na-renda-media-das-familias-conforme-autodeclaracao-de-raca/
Fonte 6: http://blog.justica.gov.br/inicio/estatuto-do-desarmamento-salvou-quase-2-mil-vidas-por-ano-diz-artigo/
Fonte 7: United Nations, Office on Drugs and Crime, Crime and Illegal Arms Trafficking in Colombia, 2006
Fonte 8: United Nations, Office on Drugs and Crime, Homicides by Firearms, 2012